Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (2023): início ideal para a Fase 5 do MCU

Com um Jonathan Majors avassalador, o novo grande vilão da Marvel faz sua entrada triunfal em um filme que prepara o terreno para grandes acontecimentos, sem perder de vista a importância de personagens "pequenos" como o Homem-Formiga.

Depois de uma Fase 4 confusa, os fãs da Marvel vinham começando a se questionar se realmente havia algum plano sólido para o futuro da franquia, seja nos cinemas ou na televisão. Repleta de narrativas que à primeira vista não tinham conexão, a história da Marvel pós-Saga do Infinito era de turbulência, sem que houvesse uma linha evidente a ser seguida ou um rumo claro para o que veio após o marco que foi “Vingadores: Ultimato” na cultura pop. Pois agora a Casa das Ideias parece ter se encontrado em “Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania“.

A terceira aventura de Scott Lang (Paul Rudd) sob o manto de Homem-Formiga é não apenas a melhor até agora, como também marca o pontapé inicial da Fase 5 do universo Marvel e realmente o coloca nos trilhos da Saga do Multiverso, jornada que promete ser ainda mais complexa que a anterior. O filme é também a estreia de Jonathan Majors como o grande vilão Kang, o Conquistador, nos cinemas, e, se ele já parecia ameaçador sob a faceta serena d’Aquele Que Permanece na série “Loki“, agora o papel exige uma variante violenta e psicopata.

A parte principal da história ocorre em um lugar conhecido dos fãs, o Reino Quântico. Já ouvimos a respeito dele nos longas anteriores por ele ser objeto de estudo da primeira pessoa a ocupar o manto do herói, Hank Pym (Michael Douglas), e também por ser uma ferramenta essencial para os Vingadores derrotarem Thanos. Apenas agora as regras que regem esse reino de dimensões subatômicas começam a ficar claras, já que ele será importante para a sequência da Fase 5.

É lá também que conhecemos Kang, um ser de intelecto genial que está sempre vários passos à frente de seus inimigos. Quando está em tela, o vilão monopoliza a atenção de todos, incluindo o espectador, com sua presença intimidadora, mas, ao mesmo tempo, carismática. O papel seria desafiador para qualquer ator, e é Jonathan Majors que o torna algo extraordinário. O desafio de interpretar Kang reside justamente no fato de não haver apenas um dele, como já constatamos em “Loki“, e cada um ser diferente, mas Majors consegue — até o momento, pelo menos — imprimir personalidade e temperamento próprios para cada um deles. O de “Quantumania” faz uso de seus poderes claramente superiores para se tornar o Conquistador que conhecemos, uma ameaça não apenas ao Reino Quântico, mas a todas as realidades.

No caminho dessa entidade poderosa, cinco obstáculos pequeninos: Scott e sua família. Apesar da ameaça em escala multiversal, “Quantumania” permanece, em essência, um filme do Homem-Formiga, com tudo aquilo que isso acarreta, principalmente o foco no clã Lang-Van Dyne. A narrativa familiar é tradição, já que essa é uma das poucas famílias funcionais na franquia atualmente, e ajuda a colocar em perspectiva o tamanho da ameaça que Kang representa. Não se trata necessariamente de grandes desastres universais, mas de proteger quem você ama. Nesse contexto, a grande força motriz do longa é a relação entre Scott e sua filha Cassie, aqui interpretada por uma burocrática Kathryn Newton, aparentemente incapaz de atuar da boca para cima. Frente à Hope Van Dyne de Evangeline Lilly, ao Hank Pym de Michael Douglas ou à Janet Van Dyne de Michelle Pfeiffer, a jovem adição ao elenco da Marvel desaparece. Por sorte ela divide mais tempo com Paul Rudd, que é capaz de puxar qualquer um com seu carisma e timing para comédia.

Tudo que ocorre de mais importante no filme é ambientado no Reino Quântico. Se antes ele era visto apenas como uma ferramenta para derrotar vilões superpoderosos, agora ele é praticamente um personagem em si. É aqui que o design de produção se destaca como o principal trunfo da obra, atribuindo um ar de estranheza e esquisitice a tudo que se passa naquele lugar ainda pouco visto na Marvel, utilizado pelo roteiro de Jeff Loveness como elementos a mais para gerar humor. Mesmo piadinhas aparentemente imaturas fazem sentido no Reino Quântico, já que lá nenhuma regra que conhecemos se aplica. Loveness, veterano de “Rick and Morty“, série campeã do nonsense contemporâneo, entende isso perfeitamente, e concilia a narrativa clichê que o núcleo duro do longa requer à atmosfera de ficção científica do Reino Quântico de forma leve e natural.

Isso se traduz na tela pela dinâmica impressa por Peyton Reed na direção. Em “Quantumania”, ele se torna apenas o segundo diretor do estúdio a conseguir concluir uma trilogia, e muito disso se deve ao fato de Reed ter experiência em lidar com histórias pessoais inseridas em contextos maiores, como é o caso de grandes franquias como a Marvel. Ele não só encaixou os outros dois “Homem-Formiga” dentro do grande quebra-cabeças do MCU, como agora consegue dar início a uma nova fase desse universo sem que perder sua própria essência e identidade.

O que quer que venha no futuro da Saga do Multiverso, é graças a “Quantumania” que poderemos entender. Ainda que algumas das engrenagens já estivessem em movimento discreto, o meio segue sendo importante, e a tela grande é onde os rumos de qualquer franquia são decididos. Não há forma melhor de começar essa nova jornada do que com um filme tendo claro que o que está em jogo vai muito além de realidades e dimensões alternativas. O essencial, na maioria das vezes, é invisível aos olhos de tão pequeno. Tal qual um Homem-Formiga.

Julio Bardini
@juliob09

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