Obra de Mattson Tomlin ignora a questão da maternidade e acumula tantos furos no roteiro que fica fácil torcer para os androides.
A ficção científica não é um dos gêneros mais fáceis de trabalhar. Na maioria das vezes, as ideias requerem um orçamento maior, com auxílio de bons efeitos especiais e maquiagem, por exemplo. “Mãe x Androides”, produzido pela Hulu e distribuído no Brasil na Netflix, até tinha um potencial grandioso, mas não há investimento no mundo que sustente um roteiro ruim e um diretor perdido.
A obra dirigida e roteirizada por Mattson Tomlin (“Power”) conta a história de Georgia (Chloë Grace Moretz), uma jovem que descobre na véspera de Natal que está gravida. Apesar da surpresa do seu namorado Sam (Algee Smith), eles decidem enfrentar juntos essa novidade, mesmo passando por um momento conturbado no relacionamento. Fica entendido que a obra se passa em um futuro com androides que já fazem parte da sociedade e vivem em paz com seus donos. De repente, surge um som agudo, um tipo de pulso eletromagnético, e os robôs começam a se rebelar.
Os equipamentos eletrônicos param de funcionar e o androide da casa mata duas pessoas. O casal consegue fugir, mas em questão de poucos minutos, a cidade inteira já está incendiada pela rebelião das máquinas. Dito isso, o diretor encerra aqui sua explicação sobre o apocalipse e adianta sua história em nove meses, quando a protagonista está prestes a entrar em trabalho de parto. Em um cenário em que os androides já dominaram grande parte dos Estados Unidos, Sam e Georgia decidem caminhar até Boston em busca de um refúgio na Ásia.
Nessa caminhada pela floresta, os robôs se transformam em uma espécie de Predador misturado com zumbis, caçando todos que passem por esse “território perdido”. O roteiro de Tomlin é tão inocente que os personagens quebram frequentemente as regras estabelecidas na própria história. Um exemplo rápido: o silêncio é essencial para os androides não notarem a sua presença. O que o casal decide? Seguir com a moto mais barulhenta do mundo pela floresta a 120km/h, afinal, o que poderia dar errado? Logo em seguida, Sam decide largar a grávida no meio da floresta para atrair os androides. Essa sequência de decisões e erros acontece a cada 5 minutos.
O diretor, ao mesmo tempo em que deseja estabelecer seu universo, corta os melhores momentos das suas principais cenas. O dia do apocalipse passa tão rápido que mal dá tempo de entender a gravidade da situação. Em outra situação, sem qualquer indício anterior de violência, Sam entra em uma briga completamente gratuita com um soldado e… tela preta, o diretor não mostra o confronto. No dia seguinte, o sargento informa que Sam deixou o recruta com uma fratura no rosto e cego de um olho. Fica no imaginário uma luta incrível que nunca será exibida.
Simplesmente não dá tempo de se importar com Sam e Georgia, que se mostram bastante indecisos. Primeiro, querem apenas um parto seguro. Depois, decidem deixar um local completamente tranquilo. Em seguida, querem uma vida nova na Coreia, porque aparentemente está tudo bem por lá. A relação deles é resumida a brigas e reconciliações, acertos e erros na busca pela sobrevivência. Outro desperdício é a questão da gravidez, que é utilizada apenas como um ponto de urgência, fazendo com que os personagens não fiquem simplesmente aguardando o bebê nascer. Se o título fosse “Dinossauro X Androides”, com poucas alterações no texto, era possível manter o roteiro, tamanho o desinteresse ao tratar a maternidade.
“Mãe x Androides” é um filme que não acerta nos protagonistas, no roteiro e nem nas cenas de ação. Moretz faz o que pode com a dificuldade de mobilidade e com os diálogos rasos, sendo um verdadeiro desperdício ver uma atriz talentosa em um projeto desses. É impossível não torcer para uma vitória dos androides depois de conhecer dois protagonistas tão insuportáveis.