Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

La Casa de Papel – Parte 5, Volume 2 (Netflix, 2021): o bella ciao, bella ciao

Elétrica e emocionante, a série encerra sua trajetória em grande estilo, às vezes longa e exagerada demais, porém inegavelmente bem-sucedida.

Despedidas não são fáceis. Ainda mais quando estamos dizendo um “adeus” ao invés de um “até logo”. Pois chegou, enfim, o momento de dar “tchau” para os amigos mascarados de trajes vermelhos que por tantos anos ofereceram o melhor – e também o pior – do entretenimento. O volume 2 da parte 5 de “La Casa de Papel“, série que se transformou num dos ícones da cultura pop recente, e que encontrou no Brasil um porto seguro repleto de fãs, chega para oferecer um final honroso ao bando liderado pelo Professor. Disposta a entregar tudo o que vinha prometendo, a produção aposta suas últimas fichas no drama, impulsionado pelo clima de encerramento, e na ação desenfreada, consequência da conclusão do roubo, para sair de cena de maneira tocante e gloriosa.

A série retoma sua narrativa com os Dalís no limite, correndo contra o tempo para concluir a extração do ouro, ao passo que precisam lidar com a morte de Tóquio (Úrsula Corberó). Enquanto isso, fora do Banco da Espanha, o Professor (Álvaro Morte) e Marselha (Luka Perros) seguem uma perseguição à oficial Alicia Sierra (Najwa Nimri) para manter o atraco dentro dos planos. Nesta última leva de cinco episódios, o criador Álex Pina mostra que apesar da divisão das partes, a espera pelo final vale a pena. Sem a necessidade de perder tempo com barrigas ou ganchos para o futuro, motivos que levaram a parte anterior à exaustão, Pina vai amarrando as pontas do roteiro com conflitos divertidos, emocionantes e cheios de ação. Os obstáculos ainda surgem, mas tudo é praticado com agilidade.

O sentimento de urgência toma conta da narrativa conforme os episódios vão passando e Pina se mostra muito mais seguro na direção, oferecendo ótimos momentos de suspense e tensão que relembram as grandes virtudes do primeiro roubo. Porém, La Casa de Papel não é e nunca foi uma série somente sobre ação, mas sim sobre a construção de laços de amizade. Laços que fizeram o público sentir junto com os assaltantes a perda de Berlim, Nairóbi, Tóquio, entre outros que se foram. E nesse ponto, a produção apresenta sequências e diálogos intensos, como quando o Professor narra para seu irmão o dia em que viu o pai morrer. Soma-se a isso o carisma indiscutível dos personagens, e aqui vale incluir também os “vilões”. O elenco talentoso potencializa as ações com atuações inesquecíveis.

Embora recupere o fôlego num momento crucial, após um primeiro volume capenga em vários aspectos, a última parte da série permanece refém de alguns vícios que a acompanharam ao longo do caminho. Apoiada em uma estrutura de novela do horário nobre, “La Casa de Papel” insiste em flashbacks expositivos, que servem apenas para justificar, de forma barata, a presença de algumas figuras. E mais uma vez, Berlim (Pedro Alonso) é quem mais aparece quando o passado ressurge, e se antes era bastante cultuado pelos fãs, suas aparições são exageradas e seus diálogos demasiadamente saturados, como se fosse um filósofo grego. A narração póstuma de Tóquio é outro artifício batido, que também flerta com reflexões vazias e não desperta nenhum tipo de emoção no público.

Mas nem mesmo as decisões mais questionáveis foram capazes de impactar na conclusão da jornada. Entre erros e acertos, “La Casa de Papel” deixará saudades. Embalada por uma atmosfera nostálgica, a narrativa, que não teve receio de se estender e dividir quando não era necessário, que se divertiu com exageros e planos mirabolantes e que se jogou no drama, às vezes piegas e caricato, chega ao final com a sensação de dever cumprido dentro e fora da tela. Uma empreitada com começo, meio e fim arrebatadores que apesar de sua aventura aparentemente escapista, também reservou tempo para criticar o sistema capitalista que corrói diversas nações. E que se curvou ao Brasil com uma passagem empolgante de Bella Ciao na versão samba. Una mattina mi sono alzato, o bella ciao, bella ciao, bella ciao, ciao, ciao…

Renato Caliman
@renato_caliman

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