Longa-metragem baseado no sucesso literário de A.J. Finn desperdiça talento de Amy Adams e grande elenco com um thriller de ritmo lento e desfecho anticlimático.
Não é de hoje que Hollywood aposta em adaptações de livros que oferecem uma base promissora, como o excelente suspense psicológico “Garota Exemplar” de David Fincher, capaz de adaptar o romance de Gillian Flynn com maestria. Porém, é essencial para o sucesso de tais obras que seus realizadores estejam atentos aos percalços de transpor o texto das páginas de um livro para cenas com imagem e som. Neste sentido, Joe Wright, diretor das adaptações de “Orgulho e Preconceito” e “Anna Karenina”, parecia ser uma escolha segura para assumir a direção de “A Mulher na Janela”, adaptação da Netflix baseada no best-seller escrito por Daniel Mallory sob o pseudônimo A.J. Finn. Contudo, o resultado se provou diametralmente avesso às expectativas.
A trama acompanha Anna Fox (Amy Adams), uma psicóloga infantil agorafóbica que passa os dias trancada em sua casa no Harlem bebendo vinho, assistindo filmes antigos e bisbilhotando a vizinhança através da janela. Quando uma nova família se muda para a residência em frente a sua, ela passa a receber visitas do jovem Ethan (Fred Hechinger) e começa a suspeitar que o pai dele, Alistair Russell (Gary Oldman), é um agressor. Logo após conhecer a mãe do garoto, Jane (Julianne Moore), Anna testemunha a mesma sendo assassinada do outro lado da rua. Ao chamar a polícia e acusar Russell, ele prova que sua esposa está viva, sendo agora interpretada por Jennifer Jason Leigh, fazendo todos questionarem sua sanidade.
Presumivelmente, parte da complexidade de adaptar a obra encontra-se no desafio de produzir um suspense que referencia justo o mestre do gênero, Alfred Hitchcock, evitando ao máximo comparações com seus clássicos, ainda que eles sejam parte fundamental da construção da protagonista no livro. Fugindo de tais paralelos, Wright, acertadamente, atenua as referências hitcoquianas tornando o aceno aos fãs bem mais sutil se comparado ao texto original. Logo no primeiro ato, trechos de “Janela Indiscreta”, “A Casa Encantada” e “Um Corpo que Cai” surgem brevemente na TV, sinalizando que a personagem pode estar confundindo realidade com ficção.
No papel de uma narradora não confiável, Adams entrega uma boa performance, ainda mais se levado em consideração as fragilidades do roteiro de Tracy Letts (“Álbum de Família”), como a constância de diálogos pouco inspirados, a falta de desenvolvimento dos personagens e a quantidade excessiva de antigos clichês e facilitações narrativas. Outro destaque positivo é a atuação de Julianne Moore que mesmo com pouquíssimo tempo de tela consegue brilhar. Infelizmente, o mesmo não pode ser dito em relação a Gary Oldman, subaproveitado e tendo que se virar com um material bem aquém de seu talento, assim como todo o restante do elenco.
Apesar de alguns eventuais acertos é notório que grande parte do sentido da narrativa foi perdido durante o processo de adaptação. Ironicamente, o enredo e a direção são tão instáveis quanto o psicológico da heroína, sempre oscilando de tom e jamais definindo ao certo sua proposta. Todavia, é somente no último ato que tudo desanda de vez, e o que antes era a história de uma mulher buscando superar um evento traumático, repentinamente se torna um pseudo terror slasher com direito a final girl, destoando completamente do que vinha sendo apresentado anteriormente.
Mesmo ostentando um grande elenco e uma equipe técnica competente, “A Mulher na Janela” jamais consegue definir seu propósito, tampouco aprofundar sua trama e personagens coadjuvantes. Por vezes presunçosa, a adaptação tenta a todo custo compensar a falta de sequências interessantes e o ritmo lento com um mistério requentado, cuja resolução se apresenta da maneira mais expositiva e anticlimática possível, fazendo parte do público se revirar em seus assentos tamanha vergonha.