A Netflix reúne um elenco excepcional para essa comédia de ação divertida, que mistura o Ceará e São Paulo numa combinação explosiva.
Não é de hoje que a parceria entre Edmilson Filho e Halder Gomes trouxe um refresco para o humor nacional, desde “Cine Holliúdy”. Agora, somando o time com Vitor Brandt na direção e um diverso elenco de incríveis humoristas, “Cabras da Peste” abrilhanta o catálogo de comédia da Netflix em um momento que o Brasil e o mundo precisavam de leveza.
A história junta um policial da pacata cidade de Guaramobim, interior do Ceará, com um policial de escritório paulista quando uma cabra é sequestrada por um caminhão de rapadura que ruma à São Paulo. Os policiais, Bruceuilis (Edmilson Filho) e Trindade (Matheus Nachtergaele) acabam se intrometendo numa perigosa operação que envolve um criminoso de codinome Luva Branca, líder do tráfico de entorpecentes.
Ao estilo buddy cop, mas carregado de brasilidade, o filme referencia o cinema de ação seja nas coreografias de luta, seja na atuação propositalmente canastrona e cheias de frases de efeito. Deixando claro desde as primeiras cenas que apesar dos combates e trocas de tiro, o longa não se leva a sério e isso se sustenta pela edição e trilha sonora, que agregam ao ritmo sabendo o momento de parar a ação para deixar a piada entrar ou quebrando cenas pesadas – de quebra-quebra ou até assassinato – com músicas inusitadas.
O núcleo de Guaramobim é simplesmente hilário. Os atores, muito confortáveis em cena, demonstram muita sinergia e naturalidade, deixando um gosto de quero mais, já que boa parte do filme se passa em São Paulo. Já na terra da garoa, o humor funciona de forma diferente, contrastando com o ritmo mais frenético do Ceará, pois é onde existe mais tensão e suspense. No entanto, não é nenhum demérito, a comédia surge em momentos mais pontuais, mas quando chega, o riso é certo.
O carisma de Edmilson é indiscutível. Quando em cena, é magnético, além de entregar uma atuação muito corporal com coreografias de luta bem encenadas que mesclam com o humor na medida certa. Resgata uma comédia de ação com ares de Jackie Chan, mas que ainda assim traz originalidade, reascendendo um gênero do cinema que estava esquecido. Nachtergaele está mais comedido, na pele do sensível policial de escritório, com cômicos momentos de afetação. Seu trabalho, como sempre, está irretocável, embora a personagem escrita não seja tão cativante.
O roteiro acerta no tom das piadas, aproveitando brechas para alfinetar questões políticas, sem forçar a barra. Além disso, se diverte com regionalidades e estereótipos, mas ao invés de se apoiar nisso para fazer um humor ofensivo, brinca consigo mesmo ironizando os próprios pré-julgamentos e isso é de uma riqueza e sagacidade que poucas comédias demonstram.
Além do elenco nordestino já citado – que traz os impagáveis Valéria “Rossicléa” Vitoriano, Victor Alen, Falcão e o próprio protagonista – o núcleo do sudeste, além de Nachtergaele que é hors concours – vem com Leandro Ramos, Evelyn Castro, Juliano Cazarré, Letícia Lima e outros, uma combinação de talentos que dá gosto de ver juntos em tela. E cada um conseguiu brilhar em momentos de ouro, uma tarefa difícil quando se tem uma dupla de protagonistas como essa.
É um deleite saber que a locadora vermelha vem cada vez mais investindo em comédias brasileiras e para além disso, “Cabras da Peste” celebra a diversidade cultural, tanto na ambientação, quanto no texto e na escalação do elenco. Ademais, se abre um leque em diversificar também a comédia, que em amálgama com o gênero de ação consegue não se levar a sério sem precisar ser tosco – como poderia se esperar desse tipo de gênero – e sim mostrando sua qualidade técnica e utilizando-a a favor de sua trama. Em momento de crise e pandemia, cabe destacar a importância que nossa arte tem em trazer leveza para nossas casas, coisa que todos os brasileiros estão precisando nesse momento e este longa, sem dúvidas, cumpre esse papel.