Filme de Evan Morgan entrega uma ótima trama, com protagonista bem desenvolvido e mistério satisfatório.
Em “Um Caso de Detetive”, acompanhamos a jornada de Abe Applebaum (Adam Brody), detetive mirim que conseguia solucionar todos os casos que chegavam até ele e por isso virou quase que uma celebridade na pequena cidade onde vivia. Porém, após não conseguir solucionar o desaparecimento de outra criança, ele entra em uma depressão que o acompanha até a vida adulta. Apesar de continuar trabalhando nessa atividade, ninguém o leva a sério e a cidade o hostiliza. Até aparecer Caroline (Sophie Nélisse), que o apresenta a um caso que pode ser a chance de Abe de se provar e ganhar respeito novamente: descobrir quem matou brutalmente namorado dela.
Dirigido e roteirizado por Evan Morgan, a obra cria uma trama de mistério competente enquanto desenvolve com louvor seu personagem principal. O filme trata de temas sérios, ao mesmo tempo que consegue inserir um humor ácido que casa perfeitamente com o estado mental do protagonista. Apesar de se passar nos dias de hoje, a narrativa é construída como uma homenagem aos filmes clássicos de detetive, deixando a sensação de que a audiência está assistindo a um deles – a ótima trilha sonora de Jay McCarrol é fundamental para a solidificação desse sentimento, cumprindo seu papel com eficiência. Outro projeto recente que conseguiu atingir o mesmo feito é “Dois Caras Legais”, e apesar desta produção recente não ser tão engraçada quanto a de 2016, os duas possuem várias semelhanças, inclusive na forma que retratam os subúrbios norte-americanos e nas sua paleta de cores repleta de tons vivos.
O aspecto de maior brilho do início ao fim é a construção do protagonista. Abe é assombrado por um passado em que era tratado como uma das pessoas mais importantes da cidade – até mesmo policiais se consultavam com ele para resolver casos embora ainda fosse criança. Quando ele não consegue resolver um enigma que estava muito acima das capacidades de um jovem, todos os habitantes se voltam contra ele e carregam um rancor que ele internaliza, acreditando, de fato, não ser bom o suficiente como investigador. Ainda assim, não sabe que outro caminho poderia traçar, perdido num limbo em que usa bebidas e drogas para afastar o sentimento de insuficiência e tentar lidar com o vazio que sente pelos seus fracassos. Durante grande parte da narrativa, o mistério não é o foco, mas as situações que acontecem no caminho até seu desfecho e que ajudam na evolução do personagem. Já Caroline, apesar de servir bem seu papel dentro da história, infelizmente não é tão aprofundada e poderia ter sido melhor utilizada em diversos momentos.
Então, o protagonista é apresentado como uma pessoa com baixa autoestima desde o início, o que ajuda a criar um vínculo com o espectador, que não tem outra opção além de torcer para que consiga se provar. Nem seus pais estão dispostos a acreditar no filho e o julgam independente do caminho que decida seguir – todos esses fatores contrários apenas tornam a vontade de vê-lo se superar ainda maior.
Os feitos de Abe são mostrados na sua infância sempre que possível, porém, de modo astuto, o mesmo não é feito com suas conquistas positivas no presente, optando pela narração nesses momentos enquanto acompanhamos cenas mundanas da sua vida. A abordagem se concentra nas cenas em que se sente deslocado e perdido, o que deixa evidente como ele se vê de verdade: não merecedor de suas conquistas, por conta das diversas coisas que, em contrapartida, ele nunca conseguiu obter. Adam Brody o transforma em um personagem palpável e humano – sua ótima atuação adiciona diversas camadas emocionais ao personagem, e junto com o roteiro de Morgan, o consolida como uma figura por quem se torce facilmente.
Embora não ganhe tanto foco quanto a jornada pessoal do protagonista nos dois primeiros atos, o mistério da morte do namorado de Caroline realmente começa a tomar forma e a se destacar no terceiro ato. A produção lida com a mudança de tom da comédia para suspense com maestria, fazendo a charada ser mais interessante e surpreendente do que muitos filmes que se levam mais a sério. É sempre louvável quando um diretor transforma uma simples conversa entre dois personagens na parte mais aterrorizante de seu longa, e Morgan executa isso com destreza.
No seu âmago, “Um Caso de Detetive” apresenta uma narrativa que explora as pressões e expectativas que colocamos em nós mesmos. Como a cobrança extrema que vem de dentro de cada um pode ser um caminho para a autodestruição, e como faz toda a diferença quando alguém realmente confia no nosso potencial. Tudo isso ao construir um ótimo mistério, criando uma obra que merece ser colocada na lista dos fãs do gênero.