Nem mesmo o carisma de duas Drew Barrymore é capaz de salvar esta dramédia rasa sobre as agruras da fama e o sabor do anonimato.
“Duas Por Uma” indica o tipo de comédia que o título sugere ser e que o público está cansado de ver: uma história bobinha, reciclada e com uma mensagem positiva no final. Ocorre que, ainda que não tenha originalidade para surpreender o espectador e, de fato, entregue uma reflexão açucarada e conveniente no desfecho, o longa explora uma inesperada veia dramática, que basicamente coloca a comédia desta produção da Netflix em segundo plano. O problema é que os gêneros não se alinham e, por mais que se esforce, a narrativa não faz rir e muito menos demonstra potencial para emocionar. Consegue manter a curiosidade graças a sua protagonista que, ao viver duas, se mostra bastante confortável e disposta a tentar algo diferente em papéis que podem representar uma enorme parcela das celebridades babacas de Hollywood.
Escrita por Sam Bain, esta quero-ser-uma-sátira-de-Hollywood traz Drew Barrymore em dose-dupla, interpretando Candy e Paula. A primeira é uma estrela da comédia – inclinada ao vício em cocaína – que ganhou fama e sucesso por seu humor físico. A segunda presenciou todos esses anos de glória nos bastidores cumprindo seu papel como substituta e renegada. Quando Candy tem um surto durante uma gravação e é obrigada a ir para uma clínica de reabilitação, propõe a Paula que esta vá em seu lugar, com a promessa de um novo trabalho depois de sair. A substituta vê a chance de ouro para ter a vida que sempre sonhou. Enquanto isso, Candy desfruta do anonimato, um romance virtual e passa a se dedicar à carpintaria. Trocando de lugar, elas dão início a um conflito que vai revelar muito sobre a maneira como encaram a vida.
Embora queira discutir o estilo de vida desregrado de algumas celebridades, o modo como agentes e estúdios buscam lucrar, entre outras questões que envolvem um mundo de fingimentos, o roteiro de Sam Bain tem dificuldades em ir além do trivial e não se aprofunda nas questões que propõe abordar (o ‘vício’ de Candy, por exemplo, é ilustrado uma vez e esquecido logo depois). Feita a toque de caixa, a produção apela para as facilidades que seu formato disponibiliza e nem os clichês oferecidos pela figura do doppelgänger são bem utilizados pela narrativa. Conflitos que poderiam render sequências divertidas são raros, e o drama, ainda que útil, acaba ganhando mais destaque do merecia. O filme desperdiça as mesmas oportunidades que “Cara x Cara”, série com temática semelhante protagonizada por Paul Rudd.
Encarregada da direção, a experiente Jamie Babbit, que trabalhou com Drew em “Santa Clarita Diet” e dirigiu alguns episódios de excelentes séries como “Boneca Russa” e “Maravilhosa Sra. Maisel”, mostra a mesma falta de criatividade do roteiro e também não se revela capaz de estabelecer um tom satisfatório entre a comédia e o drama. São inúmeras as situações, principalmente no drama, que a diretora perde a chance de explorar a tensão que permeia o conflito de interesses entre Candy e Paula. E com uma passividade que não faz jus à comédia, depende exclusivamente da atuação de sua protagonista, que sustentada por um roteiro frágil e uma direção convencional, até cria personagens peculiares e insinua momentos simpáticos, mas nada que diga ao espectador que ele vai encontrar ali uma obra diferente que já tenha visto.
Como a Drew Barrymore, quem sofre com o argumento são os coadjuvantes que se limitam a representar cartas marcadas de Hollywood. Até mesmo o ótimo ator Michael Zegen acrescenta pouco como interesse amoroso das protagonistas. Sua tara por carpintaria ecoa artificial e sem graça. A impressão que fica é que se fosse transformada em uma minissérie, com tempo hábil para desenvolver seus personagens e conflitos, quem sabe o filme conseguiria proporcionar algumas sequências divertidas com a troca de lugar de Candy e Paula. Além disso, poderia mergulhar a fundo nos obstáculos que a famosa e sua substituta enfrentariam ao longo do caminho que escolheram seguir. Ou quem sabe se os envolvidos não tivessem tirado a ideia do papel. Cheio de boas intenções e execução débil, “Duas Por Uma” chega para não fazer diferença.