Com uma vida regada a controvérsias e escândalos, a ícone dos anos 2000 Paris Hilton retorna para mostrar um lado que afirma ter escondido de todos por muitos anos.
O mundo das mídias digitais é muito pautado pelo controle da autoimagem, sendo Paris Hilton o exemplo de um produto que nasceu a partir desse fenômeno nos anos 2000. A herdeira do império de hotéis Hilton se tornou símbolo de futilidade e de um estilo de vida ostentador e inalcançável, que gerou tendências que reverberam até hoje. “A Verdadeira História de Paris Hilton” documenta o outro lado dessa história.
Paris Hilton propõe mostrar com o documentário os bastidores de sua agitada vida em um nível íntimo nunca antes visto. Desconstruindo a imagem da “loura burra”, uma mulher mais madura reivindica sua imagem pessoal revelando que a “it girl” que conhecemos tratava-se de uma personagem. A empresária e DJ abre sua vida revelando traumas da adolescência enquanto acompanhamos a dualidade de uma rotina ultra expositiva e rodeada de pessoas, ao mesmo tempo que é solitária, carregada de desconfiança e pesadelos.
Embora o longa fomente discussões muito importantes e delicadas, principalmente no que tange o trauma que ela passou na adolescência, a narrativa falha em suas propostas. Um discurso exaustivamente repetido por toda a produção é o fato de que o público agora se depara com a vida da socialite como realmente é, livre da manipulação dos realities show que participou – principalmente o bem sucedido “Simple Life” que deu início à personagem Paris Hilton, a herdeira estúpida. No entanto, a linguagem cinematográfica escolhida é muito semelhante ao reality, resultando em uma sensação de pasteurização e encenação.
Outro ponto é que a obra é introduzida se entendendo como um filme-denúncia, contudo há um caminho longo a percorrer até que esta denúncia se concretize. É apenas no ato final que os holofotes caem sobre as vítimas e seus relatos de abuso sofridos dentro dos internatos. Durante todo o resto do documentário, seguimos a trajetória da menina rica que está usando sua fama para abrir caminhos e fazer sua fortuna através de seu nome – que virou uma marca. Assim, enquanto a acompanhamos escolher qual roupa caríssima vai decidir levar para a próxima viagem, se sustenta a todo momento a ideia de que as máscaras que ela decidiu usar são consequências de algum trauma que ninguém sabe, esvaziando e tornando cansativo um problema sério e pouco debatido.
Não se pode, porém, negar ou minimizar as diversas formas de violência sofridas por ela. É nítido que o machismo afeta mesmo mulheres que são dotadas de algum poder, neste caso o aquisitivo. A socialite aborda com superficialidade os abusos que sofreu em seus relacionamentos amorosos, no entanto mostra o quão asquerosas podem ser as dinâmicas da alta sociedade. Isto posto, é conveniente que Paris se empodere destas histórias neste momento, uma vez que o documentário é uma nítida propaganda de sua empresa. Por conta disso, o residual do filme são sentimentos contraditórios. Ao passo que a denúncia é importante, há uma sensação de enganação, ficando dúbio se este não foi apenas mais um movimento estratégico de venda por parte da empresária, mesmo que, desta vez, se utilizando de suas verdades.