Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 06 de novembro de 2020

Bob Esponja – O Incrível Resgate (Netflix, 2020): o carisma é a fórmula secreta

Animação dirigida por Tim Hill tem roteiro um pouco perdido, mas recompensa com muito carisma, humor nonsense e Keanu Reeves.

Bob Esponja: O Incrível Resgate” seria lançado originalmente durante o aniversário de 20 anos do personagem, criado em 1999 por Stephen Hillenburg. Entretanto, foi decidido o adiamento para evitar conflitos na bilheteria com o público de “Dora e a Cidade Perdida”, também da Nickelodeon Movies. O que ninguém esperava era a pandemia da Covid-19, que atrasou a estreia em mais alguns meses. Finalmente, a Netflix entrou no negócio e lançou a obra no Brasil (e em outros territórios internacionais em acordo com a Paramount), a terceira da franquia, cinco anos após “Bob Esponja: Um Herói Fora D’Água”.

A história começa com Plankton percebendo que Bob Esponja é o maior culpado por frustrar seus planos de roubar a fórmula do hambúrguer do Siri Cascudo. Para chamar a atenção de Bob para outra coisa, ele sequestra Gary e o entrega para o Rei Poseidon, que usa a gosma dos caracóis para se livrar de rugas no seu rosto. Ao perceber que seu pet sumiu, ele se junta a Patrick para resgatar o seu amigo na cidade perdida de Atlantic City. Enquanto ele está fora, Lula Molusco e o Seu Sirigueijo precisam cuidar do restaurante para que as coisas não se tornem um caos sem a presença do melhor funcionário.

A animação tem características realistas, com um nível alto de detalhes nas texturas, bem diferente do 2D do desenho original. A princípio, a técnica causa um estranhamento, mas depois é fácil de se acostumar. Apesar de ser o terceiro filme da franquia, não é necessariamente uma continuação e, por mais que o público possa conhecer, os personagens são apresentados mais uma vez de forma rápida. O primeiro ato tem características parecidas com a trama de “Bob Esponja: O Filme”, em que o protagonista e Patrick se aventuram em um road movie. Porém, o roteiro não é tão focado na viagem em si, criando diversas paradas na aventura que mais atrapalham do que ajudam na continuidade da trama.

Assim como nas obras anteriores, o terceiro filme mantém a tradição de apresentar atores live-action. Depois de David Hasselhoff e Antonio Banderas nas duas primeiras animações, a participação de Keanu Reeves é ainda mais aleatória e incrível. Acostumado com esse tipo de animação híbrida após dirigir “Alvin e os Esquilos” e “Hop: Rebelde Sem Páscoa”, Tim Hill transforma a participação do ator em algo maior do que apenas uma ponta. Ele aparece do nada como um sábio em uma bola de feno, sempre com uma pílula de sabedoria para a dupla de amigos, sem perder uma cara séria impagável.

O nonsense tradicional dos desenhos segue afiado, exagerando nas expressões dos personagens e até deixando a trama principal de lado por algum tempo. Ao mesmo tempo, a história se apoia em padrões muito comuns nos episódios do desenho, como Plankton tentando mais uma vez se apossar da fórmula secreta, a Sandy criando algum tipo de invenção, Lula Molusco reclamando de algo e o Seu Sirigueijo chateado porque está perdendo dinheiro. A trilha sonora de Hans Zimmer e Steve Mazzaro dá um tempero a mais e impulsiona a aventura, causando até algumas piadas nas mãos do Patrick, que brinca com as longas notas tão tradicionais de “Interestelar”. Já a dublagem da versão brasileira segue fantástica, com direção geral de Wendel Bezerra, a voz tão marcante do personagem. Destaque também para Mateus Solano, que faz um ótimo trabalho interpretando a voz do Rei Poseidon, bem canastrão e vaidoso.

Hill, que também é responsável pelo roteiro junto com Jonathan Aibel e Glenn Berger (ambos de “Trolls 2“), inclui diversas cenas do chamado Acampamento Coral, apresentando a infância do Bob Esponja. Os flashbacks são uma das melhores partes da trama, mostrando como cada personagem conheceu o protagonista, mas é necessário destacar que a própria Nickelodeon já anunciou uma série spin-off exatamente com a mesma proposta, fazendo com que o filme também sirva como um teaser ou uma propaganda antecipada do que vem por aí.

O filme não deixa de ser também uma celebração aos personagens e a Stephen Hillenburg, criador do desenho, que faleceu em novembro de 2018 devido a complicações na Esclerose Lateral Amiotrófica. Em comparação com os filmes anteriores, essa é uma história menor, mas que ainda esbanja bom humor, muito coração e carisma.

Fábio Rossini
@FabioRossinii

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