Adaptação de conto de H.P. Lovecraft é uma prova de que não basta ter uma história interessante se a execução for fraca.
O horror de H. P. Lovecraft tem sustentação no desconhecido. Para o autor, não existia nada mais assustador do que algo inimaginável, que é difícil assimilar. Essa proposta fazia com que cada leitor sempre imaginasse algo único. Por meio de um conceito abstrato, o autor cria um ambiente de medo coletivo, mas que, ao mesmo tempo, é bem particular para cada leitor. Isso permite também uma criatividade sem fim, proporcionando um universo com dimensões incompreensíveis e sobrenaturais. Partindo desse ponto, o diretor Richard Stanley tinha meio caminho andado para a adaptação de “A Cor que Caiu do Espaço”.
Baseado no conto homônimo, publicado em 1927, a trama gira em torno de Nathan (Nicolas Cage), um fazendeiro que mora com sua esposa, Theresa (Joely Richardson), e seus três filhos, Lavínia (Madeleine Arthur), Benny (Brendan Meyer) e Jack (Julian Hilliard). A família vê a tranquilidade do campo em risco quando um meteorito cai na propriedade, gerando um clarão púrpuro que invade toda a casa. Aos poucos, o ambiente da fazenda passa a se modificar e o comportamento das pessoas fica cada vez mais bizarro.
Stanley, cujo último longa-metragem, ainda que incompleto, foi “A Ilha do Dr. Moreau” no longínquo ano de 1996, abandona rápido as intenções de deixar o medo no campo das ideias. Depois de um bom primeiro ato, o diretor decide abandonar a construção de ambiente e passa a mostrar demais, transformando o horror cósmico de Lovecraft em um gore.
A história em si já é difícil de adaptar, pois a própria indistinção da cor, um dos mistérios mais fascinantes da obra original, precisa ser abandonada por causa do visual. Assim, o diretor e a equipe de efeitos visuais precisam escolher uma cor como ponto de partida, que na teoria deveria ser irreconhecível. Quando a trama de fato se assume gore, busca inspirações em um horror corporal, o chamado body horror, cheio de criações perturbadoras e deformadas com inspirações nos monstros das obras de David Cronenberg e John Carpenter.
Os efeitos visuais têm momentos bons e ruins – funcionam melhor quando são utilizados em efeitos práticos. O diretor de fotografia Steve Annis (“I Am Mother”) brinca a todo momento com jogos de luzes, que ajudam a ambientar o clima de tensão com a chegada da cor, mas se tornam repetitivos com o excessivo uso de flares de lente.
O roteiro, escrito pelo diretor e por Scarlett Amaris, deixa de lado algumas ideias impostas no primeiro ato, como a presença de Ward (Elliot Knight), que trabalha para uma hidrelétrica do vale e fica sem função ao longo do filme. Outro personagem que fica escondido é Ezra (Tommy Chong), um tipo de zelador que mora na propriedade e que se resume a aparições de alguns segundos. Já interpretação de Nicolas Cage vai subindo de tom a cada ato. A impressão é que o ator abraçou essa abordagem e o diretor entrou na brincadeira. O problema é quando fica caricato em vez de dar medo, ficando muito mais perto de uma comédia do que o terror psicológico.
“A Cor que Caiu do Espaço” inicia com um potencial enorme, mas praticamente muda de gênero ao longo do filme. É triste ver a boa construção do início ser jogada no lixo. Que bom seria se o terceiro ato permanecesse no mundo das ideias ou apenas nos livros de Lovecraft.