Tentando servir à família, esta trama de aventura na Netflix é mais uma prova de que a poderosa do streaming está mais preocupada com o selo de exclusividade do que a originalidade de seus filmes.
Ou os algoritmos da Netflix estão com problemas para coletar informações sobre as preferências do seu público ou é a audiência que, na pressa por consumir algo de fácil digestão e pouca complexidade, está ficando menos exigente com as produções do serviço de streaming mais poderoso do mundo. Essas dúvidas podem ser pauta para um artigo como também podem ajudar a explicar a existência de “Missão Pijamas”, uma versão light e bem menos criativa do que o oitentista “Uma Noite de Aventuras”, cuja impressão é de ter sido feito sob encomenda para entreter a família. Uma ‘aventura’ que não se mostra animada o bastante para ir além de piadas tolas, clichês mal empregados e um elenco adolescente, ainda que comprometido, muito imaturo e desconexo em cena.
Escrita pela estreante Sarah Rothschild, a trama apresenta Clancy (Sadie Stanley) e Kevin (Maxwell Simkins), irmãos que descobrem que Margot (Malin Akerman), a mãe normal e caseira que eles julgam ter, na verdade é uma ex-ladra profissional incluída num programa de proteção à testemunha. Quando a identidade de Margot é vazada, e ela e seu marido Ron (Ken Marino) são sequestrados, a jovem Clancy e seu irmão mais novo abandonam os planos e partem noite adentro em busca de pistas do paradeiro dos pais. Logo no ínicio, o roteiro de Rothschild já mostra indícios de que apostará no convencional em detrimento da inventividade. Em poucos minutos, a sensação é de que os personagens, a maneira como estes são apresentados e o cenário já foram vistos antes.
Kevin, embora bem articulado e expressivo – graças a atuação carismática de Simkins -, é uma representação superficial do garotinho sem noção que nutre uma paixãozinha pela amiga da irmã. Clancy faz o papel da jovem em plena adolescência. Não perde a oportunidade de afirmar o quanto o irmão mais novo é esquisito, esconde um amor pelo veterano da escola e para completar tem seus conflitos com a mãe, principalmente porque está não a deixa ter um celular. Ron vive o pai atrapalhado e desinformado o bastante para gerar uma infinidade de questionamentos repetitivos, que o tornam desgastante e tolo. Com uma introdução padronizada, a narrativa reforça a dependência de um desenvolvimento mais inventivo e atraente, o que não acontece.
A produção oferece raros momentos de diversão ao longo de seus 100 minutos – e mesmo assim algumas dessas sequências prometem não arrancar risadas do público. Além disso, os obstáculos impostos até o clímax são frágeis e não representam perigo para os adultos e também não exigem habilidades das crianças, dificultando incluir o filme na categoria de aventura de comédia. Por sua vez, a direção simplória de Trish Sie, responsável por filmes como “Ela Dança, Eu Danço 5: Tudo ou Nada” e “A Escolha Perfeita 3”, não acrescenta nada de novo ao gênero. Recorre a planos fáceis e movimentos corriqueiros. Luta para conferir protagonismo ao elenco infantil, só que em piloto automático se limita em dar continuidade a estrutura previsível da narrativa.
De pista em pista, “Missão Pijamas” revela toda a sua fragilidade, que resulta num longa infantilizado e repleto de diálogos bobos e expositivos. A esperança era que aos poucos a coisa fosse engrenando, porém o que de fato ocorre é uma desconexão gradativa da narrativa e seu desenrolar absurdo. Os personagens vão se tornando irritantes, o clímax um espetáculo exaustivo e a moral da história sem graça e aborrecida. Aflita por construir um catálogo exclusivo, a Netflix coloca a originalidade de escanteio, transforma aqui sua festa do pijama num evento trivial, com o qual fica difícil criar empatia. Se o intuito era entregar uma aventura escapista para assistir com a família em tempos de quarentena, é melhor cada um ficar de pijama no seu próprio quarto.