Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 15 de agosto de 2020

Dançarina Imperfeita (Netflix, 2020): leve, prazeroso e fugaz

Comédia adolescente honesta e sem grandes surpresas. A produção da Netflix não se leva a sério, mas cumpre o que promete.

A Netflix tem investido de forma massiva em conteúdo original, notadamente no que se refere ao segmento da comédia adolescente. Com isso, quer esteja entregando qualidade ou não, é fato que tais materiais garantem, pelo menos até então, um grande alcance de público. Assim, o novo sucesso da plataforma, “Dançarina Imperfeita“, surge de modo sorrateiro e despretensioso, sem se levar muito a sério, conquistando o nicho que busca uma diversão leve para embalar um sábado à tarde despreocupado.

O enredo retrata a trajetória de uma jovem extremamente aplicada cuja única ambição é ser admitida na faculdade que tanto almeja. Há, no entanto, um empecilho em seu caminho, uma vez que a universidade parece desejar mais de seus alunos que boas notas e engajamento em trabalhos voluntários. Isso leva a protagonista Quinn Ackerman (Sabrina Carpenter) a buscar esse ”algo a mais” formando um grupo de dança, que é o mote do filme: coreografias muito bem trabalhadas e sequências divertidas de personagens improváveis aprendendo juntos a encontrar o seu ritmo. Adicione ao contexto um romance leve, crível, cujo parceiro (Jordan Fisher) tenha uma boa química com a protagonista e eis uma fórmula bem sucedida.

O filme é bem honesto quanto ao que promete, não excedendo as expectativas nem para o bem, nem para o mal. Mas, certamente, algo que funcionou muito bem na obra foi a direção de elenco e o casting, de modo que todos os atores casam perfeitamente com os seus papéis e são extremamente carismáticos. Isso acaba ofuscando eventuais problemas com o roteiro – posto que se cria uma certa afeição com os personagens. Liza Koshy surge nessa obra, inclusive, como uma excelente descoberta, demonstrando o seu potencial multifacetado com sua espevitada e divertida Jasmine, de forma a roubar o foco nas sequências em que se faz presente. Outro triunfo consiste na elaboração do figurino, primordialmente nas cenas das batalhas coreografadas, em que aparecem roupas bastante criativas e que, em muitos momentos, acabam favorecidas pela iluminação do palco com a criação de efeitos inovadores. A trilha sonora também é algo que vale a pena ser citada, com músicas que realmente dão vontade de pausar tudo e ir dançar.

É importante situar cada obra em seu lugar e, com “Dançarina Imperfeita” não deve ser diferente. Assim, não é justo que se espere grandes enredos, plot twists ou fechamentos de arco perfeitamente coesos de um longa-metragem cuja pretensão é, justamente, cair na previsibilidade tão amada por uns e tão rechaçada por outros. Naturalmente, a Netflix mais uma vez não procurou fugir de clichês e de receitas já desgastadas nas comédias românticas. Porém, contanto que não se busque uma experiência engrandecedora mediante a sétima arte, o filme é honesto ao denunciar desde o início a sua essência: um coming-of-age leve, prazeroso, mas fugaz.

Não se fazem mais comédias românticas tão memoráveis, e esse gênero parece cada vez mais restrito às plataformas de streaming, por mais que seja um dos de mais sucesso popular atualmente. Em vez de lamentar, por que não atentar para o filme de cada semana e torcer para que entre eles surja o “Medianeras” ou o “Frances Ha” dessa década? Decerto, experiências audiovisuais como esta estrelada por Sabrina Carpenter são prazeres efêmeros e pouco memoráveis, mas não são justamente tais vivências às vezes tão necessárias no mundo frenético de hoje? O mercado tem mudado e, cabe aos amantes de cinema também se adaptarem às novas demandas, mesmo que isso signifique não tirar nada de venturoso de um filme que não seu caráter recreativo por si só. E, se tem algo que esse romance dançante promove é entretenimento de qualidade.

Lígia Amora
@rapadura

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