Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 01 de agosto de 2020

Sócias em Guerra (2020): boa mensagem, pouca comédia

Filme de Miguel Arteta consegue passar uma mensagem positiva, porém falha em obter sucesso em grande parte de seus momentos cômicos.

“Sócias em Guerra” conta a história de Mel (Rose Byrne) e Mia (Tiffany Haddish), duas amigas que compartilham a paixão por maquiagem desde sua adolescência e decidem criar uma marca de cosméticos juntas. Quando abrir uma loja física as deixa no vermelho, Claire Luna (Salma Hayek), uma grande magnata do ramo, parece ter boas intenções ao querer investir na empresa, porém seu verdadeiro propósito logo se torna claro, forçando Mia e Mel a lutarem pelo controle do seu próprio negócio.

Dirigido por Miguel Arteta (“Jantar com Beatriz”) e roteirizado por Sam Pitman e Adam Cole-Kelly, ambos com poucos créditos de escrita antes deste, o texto foca bastante no relacionamento entre as amigas, sendo este o ponto central do filme, que faz um trabalho eficiente ao desenvolver essa relação. Byrn e Haddish apresentam uma boa química, mesmo que o roteiro contenha diversos diálogos expositivos sobre o passado das duas, o que resulta em momentos que não fluem bem como deveriam.

O argumento de Pitman e Cole-Kelly vai pelo caminho certo no início do primeiro ato, ao tratar temas sérios com a leveza que uma comédia pede. Bons exemplos são a forma que Mel e Mia se sentem desconexas das amigas mais bem-sucedidas, que por vezes as julgam por não terem construído uma família e se dedicarem completamente a suas carreiras; e o machismo dentro do mundo dos cosméticos, lugar que em teoria deveria ser acolhedor para todas as mulheres. O filme contém algumas boas tiradas envolvendo concepções sobre a experiência feminina, enquanto outras apenas reforçam estereótipos prejudiciais.

Apesar de construir relativamente bem a base para uma comédia eficiente, “Sócias em Guerra” nunca atinge todo seu potencial no momento de criar situações cômicas: com a introdução da personagem de Hayek, a audiência é apresentada ao mesmo clichê da latina exagerada e escandalosa já visto diversas vezes antes, e que aqui também anda de mãos dadas com uma vilã fraquíssima, sem real motivação que faça sentido. Ela é apenas uma peça para trazer conflito entre as personagens de Byrne e Haddish. Porém, em vez de tentar introduzir problemas entre as amigas de forma mais embasada ou criativa, aqui os roteiristas escolheram o caminho mais fácil, o que resulta em uma vilã sem graça que não ajuda nem um pouco na comédia já escassa.

Infelizmente, Hayek está presa a um texto que a obriga a ser apenas mais um clichê ambulante, sem ter muito com o que trabalhar. Aqui se encontram piadas já refeitas tantas vezes em filmes do gênero que quase não surtem mais efeito nenhum, como uma famigerada cena onde uma das personagens passa mal porque outra colocou pimenta demais em sua comida. Com um elenco forte de ótimos atores já experientes em comédias, como Jennifer Coolidge, Karan Soni e Billy Porter (que rouba todas as cenas que aparece), é frustrante ver o filme indo pelo caminho mais fácil e repetindo as mesmas piadas em toda sua duração.

A partir do momento em que Hayek entra em cena, temas mais sérios são tratados de forma superficial, como o próprio conflito entre as protagonistas e a vilã. As brigas entre as amigas já começam quase imediatamente depois que Claire é inserida na história, tirando a nuance que poderia existir ao desenvolver essa divergência aos poucos. Enquanto Mel aceita rapidamente o que Claire apresenta, passando por cima de seus princípios, ao mesmo tempo Mia não abraça nada que lhe é apresentado. Por ambas serem tão radicais nas suas escolhas, é uma tarefa difícil se conectar com alguma das duas. As cenas onde apresentam e resolvem conflitos são tão rápidas que é difícil estabelecerem um grande impacto. Esse problema pode se dar também à duração de apenas 83 minutos, que passam voando, mas pelo menos a direção de Arteta concede um bom ritmo para a obra.

É interessante ver uma comédia que passa uma boa mensagem sobre ser autossuficiente e principalmente sobre amizade feminina, e por isso o conjunto da obra consegue ser ainda mais frustrante. “Sócias em Guerra” pode até ser divertido para passar o tempo por conta de seus poucos minutos de duração, apesar de seu desfecho previsível. Mas não dá para não pensar sobre como esse conceito poderia ter sido melhor aproveitado se colocado nas mãos de pessoas com vontade de trazer algo novo para o gênero.

Lívia Almeida
@livvvalmeida

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