Dupla de cineastas estreantes escreve e dirige esta boa crônica de intrigas, que é cheia de estilo e originalidade em sua ambientação.
Numa fria cidadezinha de pescadores na costa do Maine, nos Estados Unidos, vive um grupo de mulheres com muito a esconder. Em “Blow The Man Down“, são elas que dominam e constroem a intriga do filme, tanto na frente quanto atrás das câmeras. Escrito e dirigido pelas estreantes em longa-metragem Bridget Savage Cole e Danielle Krudy, a produção conta a história de duas irmãs tentando acobertar um crime sem se dar conta dos outros segredos e jogos de poder que esconde a cidade.
O título do filme traz múltiplos sentidos, mas trata-se primariamente de um antigo cântico inglês famoso e entoado por marinheiros. Esta canção pontua os capítulos desta crônica e ajuda a ambientar a história. As protagonistas, Mary Beth (Morgan Saylor) e Priscilla (Sophie Lowe) Connelly, são jovens mulheres que acabam de perder a mãe e, consequentemente, herdam seu negócio falido e suas dívidas. Quando Priscilla se envolve num incidente e mata um homem, as irmãs tomam a péssima decisão de sumir com o corpo. O problema é que, apesar de pequena, a cidade abriga certas relações oblíquas que irão pautar as consequências deste sumiço. No centro da confusão, está a senhora Enid (Margo Martindale), dona de um estabelecimento fachada para outros propósitos e antiga amiga da falecida mãe das meninas.
Personagem à parte, a cidade fictícia de Easter Cove tem todos os aspectos físicos amplificados pela cinematografia. As imagens são tratadas tecnicamente para dar uma textura fílmica, bastante granulada, essencial para a criação do clima ao lado da cenografia. É possível sentir o frio úmido e o cheiro de maresia enquanto a história se desenrola. E desenrolar é um verbo apropriado, pois apesar de as complicações de esconder um homicídio serem um tema frutífero em obras do mesmo gênero, “Blow The Man Down” está mais interessado em ampliar aos poucos o escopo e revelar outras relações de poder na cidade, maiores do que envolve o incidente das protagonistas. Até a trilha sonora é construída sobre um ritmo marchante, indicando subjetivamente uma dinâmica em trabalho.
Inicialmente, o filme estabelece que o público deve seguir o ponto de vista das irmãs, sentindo a angústia de se envolver num crime, tentar consertar as falhas e ver a polícia se aproximar dos fatos, tudo isso com a diversão característica do humor ácido de produções como “Fargo” e “Killer Joe – Matador de Aluguel“. No entanto, a evolução da personagem de Enid, excelentemente caracterizada por Martindale, surpreende com uma outra trama digna de um filme próprio. Ela complica a situação das irmãs Connelly convidando a audiência para uma trama envolvendo mais personagens, devidamente equilibrados na narrativa, e contribuindo para uma história mais original em termos de perspectivas.
Com somente 90 minutos, é notável que Bridget Savage Cole e Danielle Krudy conseguiram explorar um grande potencial cinematográfico com “Blow The Man Down”, servindo como um belo showcase para elas e para a equipe do filme. Há algumas conveniências no roteiro e, como o tom e a perspectiva da história mudam à medida que ela se amplia, o espectador ocasional pode não embarcar completamente. No entanto, a experiência original criada pela dupla é razão mais que suficiente para assisti-lo e na melhor tela possível. É uma pena que não teve distribuição em cinemas além de alguns festivais, mas por outro lado o streaming da Amazon Prime Video o faz estar devidamente disponível a mais pessoas.