Segundo longa de Cory Finley encontra o tom certo entre o riso e a responsabilidade ao traduzir para as telas o caso real envolvendo os diretores de um colégio público de Nova York e um desvio milionário das verbas estudantis.
“Vaidade. Definitivamente é meu pecado preferido”, diz o personagem encapetado de Al Pacino em “Advogado do Diabo”. Diante dos outros seis pecados capitais listados na Bíblia, a vaidade parece o mais inofensivo de todos. Para o diretor Cory Finley, porém, é a vaidade que faz render suas histórias preferidas de contar. Ainda iniciante, o primeiro longa de Finley, o indie “Puro-Sangue” (2017), usa o pecado como um traço em comum que às vezes une suas protagonistas peculiares na empreitada de matar o padrasto de uma delas. Já em seu segundo longa como diretor, “Bad Education”, adquirido pela HBO após sua estreia no Festival Internacional de Cinema de Toronto em 2019, a vaidade é o grande fio condutor.
Baseado em fatos, Finley e o roteirista Mike Makowsky tinham uma história que muitos jornalistas gostariam de contar em artigos extensos: no colégio público onde Makowsky completou o Ensino Médio, em Nova York, 29 membros do conselho administrativo desviaram milhões de dólares do fundo estudantil para gastos pessoais, viagens e apostas em jogos de azar. O interessante é que o diretor do colégio e principal membro incluso no esquema, Frank Tassone (Hugh Jackman), era uma figura querida pelos alunos e que passava a imagem de ser um líder afável e incorruptível. Mas quem desmascara a figura é uma aluna chamada Rachel (Geraldine Viswanathan), que escreve para o jornal da escola e vai atrás do furo de reportagem.
Em “Bad Education”, a vaidade se faz presente não somente nos objetivos, mas também nas reações dos que estão envolvidos tanto no esquema de desvio de dinheiro quanto em quem pretende desvendá-lo. O que torna uma situação bizarra tão prazerosa de acompanhar é o equilíbrio do humor da situação, que, aqui, complementa a gravidade do caso e não o torna só um conto jocoso.
O longa toma coragem de abraçar os detalhes mais absurdos da história, como a forma com que Tassone mente sobre sua sexualidade, arrancando as risadas nervosas que um acontecimento como esse inevitavelmente traz para que a narrativa fique mais instigante para quem assiste, mas sem tornar “Bad Education” uma grande piada de mau gosto que usa as inseguranças de seus protagonistas como punchline. O riso é provocado unicamente pelas decisões tomadas, a maioria péssimas, pelos envolvidos, cada um agindo mais irracionalmente que o outro para que sua fonte de indulgências não acabe.
Quem provavelmente mais brilha neste aspecto em particular é Allison Janney que, como em “Eu, Tonya”, traz à tona o que poderia ser uma atuação exagerada da figura real que interpreta, mas que é mais fiel do que se imagina. Em “Bad Education”, apesar de ter menos tempo de tela que muitos dos envolvidos por ser a primeira dos membros do conselho administrativo a cair, ela é talvez a que mais obviamente parecia estar envolvido no esquema, mas, como ela mesma avisa, “vocês ainda não viram quem é o verdadeiro sociopata” na história toda.
E quando este sociopata se revela na figura de Tassone, a recompensa vem completa com Jackman se livrando de seus personagens bonzinhos do passado e assumindo a postura de um vilão mais pé no chão e humano, mas não menos errado em seus ideais. Sua grande sacada é se distanciar do estereótipo do homem mau que se revolta quando chegam mais perto de descobrirem que ele é a causa de todos os problemas – Tassone prefere se apegar às suas vaidades e sustentar a mentira até o fim.
Considerando a história que têm em suas mãos, Finley e Makowski trabalham com o realismo das respostas de seus personagens para mostrar como um pecado aparentemente menos nocivo do que a ira, por exemplo, ainda pode corroer o humano. Mas em momento algum a culpa, a busca por justiça ou a moralidade são postas como o objetivo deles para conduzir “Bad Education” – o instigante é o desenrolar da descoberta e o quanto alguém é capaz de se afundar e arrumar desculpas para seguir com a vida de confortos e privilégios que criou para si, especialmente quando a pessoa em questão sempre passou uma imagem de autoconfiança, altruísmo e comprometimento com sua comunidade.
No fim, “Bad Education” é um belo esforço de como a autoimagem e a realidade podem se embaralhar e deteriorar até mesmo aqueles que possuem as melhores das intenções e que tentam exercer a empatia. Nessa briga, quem saiu vencendo foi a vaidade.