Texto fraco diminui a qualidade técnica de um filme que acredita demais que a história apresentada já é suficiente para justificar a interminável duração.
Escândalos de corrupção, investigações de crimes hediondos e julgamentos envolvendo grandes corporações costumam ganhar as páginas de importantes jornais dos Estados Unidos, em longos artigos detalhando como o problema foi resolvido. Casos como “O jornalista e o assassino”, de Janet Malcolm, publicado na The New Yorker ou “Ela disse”, de Jodi Kantor e Megan Twohey, feita para o The New York Times, ganharam notoriedade após as publicações, narrando tramas que pareciam ter saído de grandes produções de Hollywood. Talvez seja por esta razão que algumas dessas histórias acabem sendo adaptadas para as telonas. Porém, se em algumas situações, a narrativa justifica a adaptação, este não pareceu ser o caso de “O Preço da Verdade”.
Baseado no artigo “The Lawyer Who Became DuPont’s Worst Nightmare”, da New York Times Magazine, a obra acompanha o advogado Robert Bilott (Mark Ruffalo), que ganhou prestígio defendendo grandes empresas de produtos químicos. No entanto, ele começa a rever certos princípios quando dois fazendeiros apresentam vídeos que podem ligar a DuPont, gigante do setor químico, à intoxicação de animais e de pessoas.
Buscando beber da fonte das “histórias-denúncias” que foram levadas aos cinemas nas décadas de 1970 e 1980, Todd Haynes (“Sem Fôlego”) é preciso em criar uma atmosfera de tensão, mesmo em meio ao dia-a-dia de um advogado. O protagonista é amigo de Phil Donnelly (Victor Garber), o homem que está enfrentando nos tribunais, logo não há qualquer motivo aparente para que pudesse surgir alguma tensão desse conflito. Sem ter como se apegar ao texto, Haynes se dedica a construir uma ambientação que se comunique mais expressivamente com o público. Fotografia, trilha sonora e montagem trabalham juntas para que a ausência de alguns elementos textuais do roteiro não possa ser sentida. O resultado, embora eficiente, não é completamente efetivo.
A atuação de Mark Ruffalo também contribui, apesar de haver pouca substância para o ator se apegar, para a conexão da tensão ao conflito principal. Este parte, então, para os coadjuvantes, como seu chefe, Tom Terp (Tim Robbins) e o fazendeiro Wilbur Tennant (Bill Camp), de onde surgem alguns dos momentos mais memoráveis do filme e os principais pontos de virada. Tudo isso se soma para criar o cenário perfeito para um thriller com influências de outras narrativas “mundanas” — “Todos os Homens do Presidente” segue como um dos melhores exemplos nesse sentido —, mas que se perde com o texto fraco e mal desenvolvido.
Não significa dizer que não haja ritmo para a trama, mas sim que ele é inconstante, principalmente, pelo roteiro não saber para qual caminho seguir em determinados momentos. E há um motivo para que isso aconteça: a justiça não depende de ritmo. Ela é demorada e, na sua maioria, monótona. Ver Bilott procurando conexões entre os animais da fazenda morrendo e o papel da DuPont nesses fatos se mostra uma escolha fraca para fazer a produção avançar. Somados a isso, há problemas nos personagens que vão desde o precário desenvolvimento (Anne Hathaway no papel de Sarah, esposa de Robert, é o maior desperdício), até as motivações mal construídas de outros, como a que impulsiona o protagonista a aceitar o processo.
Tudo isso em um filme que, quando parece estar se aproximando de um possível desfecho, ganha um desnecessário quarto ato e evidencia o problema estrutural da sua trama. Ainda que pequenos subplots tentem dar força ao texto, mostrando as consequências dos produtos químicos da empresa na vida de outras pessoas ou o julgamento dos moradores de uma cidade do interior para aqueles que ousam desafiar a fábrica que oferece vagas de emprego, faltam elementos que tornem o enredo mais interessante. Contudo, cabe ressaltar que a opção, ao menos, é consciente, uma vez que Haynes não se desapega do caso principal, demostrando acreditar com muita devoção no poder daquilo que conta.
Seria incorreto afirmar que “O Preço da Verdade” é um filme ruim. Apesar de todos os problemas narrativos que se destacam, a qualidade técnica da produção não nega que este é um projeto de um grande diretor. Infelizmente, tudo isso se torna secundário quando a trama se perde e tem dificuldades para estabelecer um ritmo (mesmo que lento) para apresentar os eventos. A montagem favorece muito esses problemas ao propor progressões constantes no tempo, mas o resultado ainda se mostra muito aquém dos nomes envolvidos no filme. O “Caso Tennant”, como é chamado, é digno de toda a atenção recebida aqui, devido a sua importância, entretanto no final, soa como se funcionasse melhor como um bom artigo de jornal apenas.