O diretor francês Alain Fresnot volta a comandar um longa brasileiro para contar uma história de desejo carnal e sofrimento.
Embora essa obra seja mais uma do acervo brasileiro de filmes dirigidos por Alian Fresnot (“Raul – O Início, O Fim e o Meio”), essa é a primeira vez em que o diretor francês mergulha tão profundamente em uma melancolia cinematográfica. Trabalhando em cima de uma fotografia pouco saturada, “Uma Noite Não É Nada” conta a história de um desejo carnal e um sofrimento silencioso.
Paulo Betti (“A Fera na Selva”) que já havia trabalhado com o diretor em “Ed Mort” (1997), tem aqui novamente a responsabilidade de carregar o protagonismo de um longa comandado por Fresnot. Ele interpreta Agostinho, um entediado professor de física de um supletivo noturno, vivendo na cidade de São Paulo em 1984 com sua dedicada esposa Januária (Claudia Mello), com quem leva um casamento frio e monótono. Entretanto, ele passa a se sentir estimulado quando a presença de uma aluna desinibida começa a chamar sua atenção. Com a mais pura referência à “Lolita”, a personagem Márcia (Luiza Braga) é o elemento que faz o filme andar e traz os principais clichês que o olhar masculino busca imprimir nesse tipo de figura. Ela é aberta ao sexo e se mostra desde sua primeira aparição atraída pelo professor, ao ponto de se masturbar na sala de aula para chamar a atenção do mesmo.
Com uma história pouco convencional e que busca chocar o público o tempo todo, parte do roteiro também escrito pelo diretor tem um bom ritmo e desenvolve muito bem a apresentação dos personagens, passeando por ambientes que remetem com muita fidelidade o que já foi a cidade de São Paulo há mais de trinta anos. A proposta da identidade visual escolhida pelo diretor de fotografia Pedro Farkas (“Paraíso Perdido”) é bastante corajosa e anda de mãos dadas com a essência cabisbaixa das cenas, potencializando os conflitos. Porém, a partir do final do primeiro ato o núcleo principal perde força e se mostra uma parte do filme que carece de motivação, esperando soluções práticas para conseguir dar continuidade à trama.
A forte presença de Cláudia Mello se destaca e não passa despercebida pelo espectador, pois ela convence desde sua primeira aparição em cena. Em contrapartida, os coadjuvantes que se dividem entre funcionários da escola e os familiares do protagonista acrescentam muito pouco e seus papéis, de texto fraco, mostram personalidades gratuitas que pouco se diferem da própria figuração. Entretanto, quando nos referimos às atuações, o ponto alto da obra de Alian Fresnot é o casal principal de atores, que apesar de não conseguirem segurar a falta de estrutura da segunda parte do roteiro, compensam em esforço e entrega.
Aos 66 anos de idade e com inúmeros trabalhos já na carreira, a experiência de Paulo Betti se sobressai do início ao fim. Com uma carga emocional enorme sob seu papel, o ator parece ter dedicado muito tempo estudando as nuances de uma pessoa que sofre de ansiedade e depressão. Suas expressões parecem dizer muito, mesmo quando não há palavras saindo de sua boca e o ator vende muito bem a posição em que se encontra dentro da história. Contudo, não menos impactante, a jovem Luiza Braga entrega um dos pilares mais interessantes do filme. Somando-se a narrativa de sua personagem e os conflitos de um protagonismo perigoso, a atriz traz a performance mais forte do longa e, quando está em cena, acrescenta personalidade aos diálogos.
O retrato temporal que situa os estigmas ligados à AIDS funcionam e mostram como eram significativas as vidas dadas como perdidas ao descobrimento da doença, o que se reflete no longa com o decorrer do roteiro. Contudo, “Uma Noite Não É Nada”, apesar de se apoiar em boas atuações e um visual interessante, continua sendo uma obra que perde tempo tentando chocar ao invés de investir no processo de contar uma boa história.