Sucesso de bilheteria na China, longa tem premissas científicas absurdas, bom elenco e efeitos especiais de alto nível, pecando apenas no roteiro previsível que escorrega com itens bobos e fora de tom.
Sucesso de bilheteria chinês e distribuído no Brasil pela Netflix, “Terra à Deriva” parte de uma premissa cientificamente um tanto excêntrica. O nosso sol está se expandindo e engolirá o sistema solar em poucos anos, forçando as mentes científicas da Terra a procurarem uma solução drástica: mudar a Terra para outro sistema. Para tal, milhares de gigantescos motores foram construídos para impulsionar o planeta numa viagem de 2500 anos até seu destino final.
Essa é a proposta da operação chamada “Terra Migratória”, mas o filme engata a marcha mesmo logo após essa introdução, cortando para após 17 anos de operação, quando a Terra está se aproximando de Júpiter para usar sua gravidade como impulso para seguir viagem. Só que as coisas não saem como planejado e o gigantesco planeta gasoso começa a puxar o nosso mundo para si, causando terremotos que desligam boa parte dos motores. Daí, passamos a acompanhar dois núcleos trabalhando para o mesmo fim. O primeiro é composto pelo astronauta Lu Peiqiang (Jing Wu, “Lobo Guerreiro 2”) e seu parceiro russo Makalov (Arkady Sharogradsky, “Icaria”) fazendo o possível na estação espacial que acompanha a Terra em sua viagem para combater a programação do computador MOSS (numa clara homenagem/inspiração do HAL 9000 de “2001: Uma Odisséia no Espaço”). O segundo é formado pelo filho de Peiqiang, Liu Qi (Chuxiao Qu, da série “Bloody Romance”), sua irmã Han Duoduo (Jin Mai Jaho, “Go Brother!”), e um grupo de engenheiros e militares que tentam levar um novo núcleo de energia para o motor de sua cidade com o intuito de reiniciá-lo.
A partir deste ponto, o filme parte numa jornada comum a vários filmes sobre catástrofes, com um visual que não deve nada a qualquer grande blockbuster hollywoodiano e um roteiro que comete os mesmos tipos de erros bobos. Com a transição entre os grupos na estação espacial e o na Terra, o longa presenteia o espectador com tomadas belíssimas que vão desde Júpiter no horizonte a veículos especiais atravessando trechos perigosos de cidades submersas e congeladas. Com efeitos especiais feitos numa parceria com a famosa Weta, a mesma responsável pela trilogia “O Senhor dos Anéis”, cada tomada convence e leva a uma imersão que só um CGI de alto nível consegue. O diretor Frant Gwo (“My Old Classmate”) mergulha sem receio e usa vários planos abertos para escancarar que os cenários são, de fato, embasbacantes.
É uma pena que tamanha qualidade visual não se reflita no roteiro, que é básico e previsível como a maioria dos filmes deste gênero oriundos de Hollywood. O que não quer dizer que não seja divertido, mas se o longa abraçasse um pouco mais a galhofa de sua proposta, algo que “Armageddon” fez com excelência, teria funcionado melhor.
O filme, entretanto, acerta nos atores e na maneira de diluir o protagonismo entre os membros dos times. Sim, fica claro que pai e filho têm maior peso (e o último diálogo entre eles emociona de verdade), mas os coadjuvantes têm sua função para que tudo flua. Pena que bons momentos de interação são intercalados com erros de continuidade bizarros. Há uma cena, por exemplo, em que dois personagens estão com seus trajes térmicos e seus capacetes nas mãos enquanto o veículo no qual se encontram balança freneticamente. Um deles passa mal e vomita dentro do próprio capacete, o que leva a uma divertida gag de tentar roubar o capacete do outro na hora de sair para a gelada atmosfera, mas logo que a cena corta para os dois do lado de fora, ambos estão com seus capacetes… limpos! Sendo que não houve tempo hábil para limpar nada pois estavam correndo para sobreviver. Esse tipo de incongruência narrativa aparece em vários momentos e não dá para ignorá-los.
Apesar dos defeitos narrativos e do erro em tentar se levar um pouco a sério demais, “Terra à Deriva” é um baita blockbuster de filme catástrofe que tem de tudo para entreter a maioria dos espectadores assinantes da Netflix, que comprou os direitos de distribuição. Ele só precisava ter entendido que está mais para “Michael Bay” do que para “Steven Spielberg”.