Acertando na conexão e na química entre as protagonistas, nova comédia familiar da Netflix escorrega no roteiro preguiçoso.
Um dos plots mais usados nas comédias é a busca por uma recompensa ou fortuna. Para que o personagem ou um conjunto deles conquiste tal prêmio, deve passar por desafios e descobertas capciosas, no estilo de uma gincana. A Netflix chega com uma produção espanhola no mesmo estilo, em que tira todo o potencial cômico que poderia arrancar de um quarteto talentoso para apostar num drama barato. “O Outro Pai” narra a jornada de quatro irmãs que são surpreendidas com a morte da mãe. Na leitura do testamento, a matriarca deixa um vídeo revelando que elas não são filhas biológicas do pai que sempre conheceram. Para receberem a tal herança, precisam encontrar seu pai (ou pais) biológicos, sendo praticamente forçadas a conviveram juntas.
Assim, as quatro se unem numa mistura de road movie com filme de superação, dispostas a encontrar seus verdadeiros pais, à medida que aprendem umas sobre as outras, além da própria identidade. Se existe algo em que o filme acerta é na escola de seu elenco, refletido nas belas, poderosas e distintas personalidades das filhas. Sara (Blanca Suárez, da série “As Telefonistas”) é a mulher de negócios centrada, objetiva e que saiu de sua casa em busca de um sonho, Lucia (Macarena García, “Palmeiras na Neve”) é a caçula inconsequente e portanto a que foi menos próxima da mãe, Sofía (Amaia Salamanca, “Desaparecida”) é a artista que foge de compromissos sérios, enquanto Claudia (Belén Cuesta, “La Llamada”) deseja manter um retrato tradicional e conservador de si mesma, saindo de uma casamento que já estava fadado ao fracasso. Separadas são independentes e demonstram posições de poder em áreas profissionais, amorosas e sexuais, juntas apresentam boa química e se complementam apesar das diferenças.
O filme de Gabriela Tagliavini (“A Fronteira”) deixa claro que apesar de a busca pelos pais mover a trama, a importância está nas descobertas emocionais, mesmo que a trilha sonora exagerada em certos momentos emule um drama desnecessário. O texto escrito a oito mãos entre estreantes e experientes, passeia entre uma clara e evidente tentativa de imitar comédias americanas e um tom novelesco sem nenhum apelo narrativo. Se rende boas sequências nas conversas fluídas, dinâmicas e naturais entre o quarteto, perde na tentativa forçada de engajar figuras excêntricas. A sequência do carro por exemplo, reafirma o poder dessas mulheres – para logo depois uma ação impensada de uma delas destruir completamente o que foi construído.
“O Outro Pai” levanta conflitos de interesse e desejo sobre a busca do sonho por alguém ou o abandono dos mesmos sonhos por uma pessoa, que acabam não rendendo o que poderiam e se resolvem de forma rápida, também devido à curta duração do filme. A personalidade dos pais se confunde com a das filhas, fazendo com que um texto que tentou ser imprevisível a todo instante se cercasse de previsibilidade, principalmente próximo aos minutos finais quando um pequeno plot twist já estava mais do que na cara desde o início. A força está na interação das protagonistas e qualquer coisa fora dela, incluindo um romance nada atrativo, torna a dramédia desagradável.