Leve e divertida, a série acerta em cheio ao propor uma discussão aberta e sob várias perspectivas sobre sexo e outros conflitos que afligem grande parte dos adolescentes.
A adolescência é uma fase de amadurecimento: um período de transição física e psicológica em que o ser humano deixa de ser criança. Do ponto de vista clássico, acontece entre os 12 e os 22 anos de idade. Esse período é, por muitos, considerado um dos melhores de nossas vidas, porque esbanjamos energia e o senso de irresponsabilidade perdoável é altamente sedutor. No entanto, também traz perguntas acerca de uma porrada de temas, descobertas, frustrações e outros conflitos, em princípio “assustadores”, que precisam ser discutidos às claras a fim de tornar a transição mais fluída. É isso a que se propõe “Sex Education“. Em sua primeira temporada, a série da Netflix apresenta-se inclusiva e representativa, e por meio de uma linguagem franca, leve e bem-humorada, se abre ao sexo, preconceito, aceitação, religião, entre outros assuntos considerados – erroneamente – espinhosos por parte da sociedade.
Nessa primeira parte, somos apresentados a Otis (Asa Butterfield, “A Invenção de Hugo Cabret”), um garoto de 16 anos que enfrenta uma fobia que faz com que qualquer tentativa de masturbação termine em frustração. Soma-se a isso o fato de ser filho da Dra. Jean Milburn (Gillian Anderson, “Arquivo X”), uma especialista em terapia sexual, que logo revela-se uma mãe controladora. A vida dele vira de cabeça para baixo quando, junto com Maeve (Emma Mackey), montam uma clínica de conselhos sexuais para atender a galera da escola onde estudam. Mas nem tudo gira em torno de Otis. Embora o vejamos como nosso protagonista, o roteiro idealizado por Laurie Nunn revela-se hábil e inteligente ao acompanhar jornadas distintas e igualmente interessantes como, por exemplo, a do garoto gay negro Eric (Ncuti Gatwa debutanto com estilo em um papel expressivo), cuja história mostra-se a mais legal; do pressionado atleta Jackson (Kedar Williams-Stirling), que também sofre de ansiedade; da rebelde Maeve; e do metido a opressor Adam (Connor Swindells, “Keepers”).
Nota-se que a grande maioria do elenco é composto por iniciantes, o que poderia facilmente resultar em um produto amador e sem tanto apelo. Porém, o que vemos é que a escolha por atores e atrizes novatos no meio artístico, com exceção dos “protagonistas”, demonstra ser a opção mais acertada, já que encaixa bem com a proposta da série de trazer frescor e naturalidade às performances, sem vícios e com o objetivo de aproximar o espectador do drama daqueles renegados, sendo eles gays, lésbicas, playboys, patricinhas, nerds, virgens, negros, brancos, loiros, morenos, altos ou baixos. Todos aqueles que, de alguma forma, sofrem, estão aqui muito bem representados. E o mais importante de tudo, e que “Sex Education” faz com excelência: todos são iguais aos olhos do roteiro e, no final, passam pelas mesmas hostilidades e têm que lutar contra os mesmos julgamentos. O gay que vive numa família religiosa, o esportista que sofre com a pressão em casa e também na escola para ser o melhor, as meninas que precisam encarar o machismo e a exposição, os meninos que sentem a pressão por nunca terem transado, etc.
Não há espaço para o choque, e se o há não deveria. Mas é claro que não é um universo perfeito, pois os conflitos e os traumas são necessários para moldar as motivações de cada personagem, e nesse ponto o argumento revela uma qualidade ímpar. Tal qualidade pode ser vista ainda por meio de seus belos e reflexivos diálogos, que proferidos por uma porção de atores carismáticos, são capazes de fazer o público se emocionar e manter-se engajado com a narrativa, mesmo essa expondo certos problemas em seu ritmo – entre um episódio e outro é inevitável não sentir aquela esticada básica da Netflix. Outro ponto positivo e muito atraente na série é a sua trilha sonora, afinal, música boa e juventude são dois elementos que devem caminhar de mãos dadas. Embalada por sucessos de The Cure, Billy Ocean, A Flock Of Seagulls, Go West, etc., que são inseridos pontualmente em momentos condizentes com suas letras, a trajetória dos adolescentes da escola de Moordale ganha eloquência e uma aprazível sensação de querer sair dançando pela casa.
Finalizado o último episódio, o único desejo era viajar no tempo, voltar aos 15 anos e assistir a tudo novamente. Ou quem sabe ir além, para um futuro, com os filhos beirando ou vivendo a adolescência e então assistir todos juntos os oito episódios dessa prazerosa primeira temporada. A série conversa com várias frentes, e confere a elas a mesma intensidade para que possamos sentir e entender a relevância de cada uma. Uma série linda e sincera, que infelizmente – ou felizmente – deixa aberto seus arcos dramáticos para a segunda temporada. É feita para rir, se emocionar, dançar, se identificar, empoderar, representar, aprender e com isso ensinar. Mostra que o sexo é bom e precisa sempre ser discutido. “Sex Education” é sobre tempo difíceis, tempos de pensamento, de reflexão, conquistas, experiência e, sobretudo, sobre tempos bons, onde viver da maneira que você escolher é um direito e só diz respeito a você mesmo. A segunda temporada já foi oficializada e, para quem gostou, tem muito ainda que rolar. Para quem ainda não entendeu, tem mais lições vindo por aí!