Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 13 de março de 2019

Titãs (Netflix, 1ª Temporada): violenta história sobre Robin e seus amigos [SÉRIE]

Uma grande evolução com relação às séries da DC Comics, "Titans" trata-se de uma série sobre uma equipe de super-heróis que se unem às sombras de seu líder para combater uma ameaça desconhecida por razões ainda mais desconhecidas.

Parece que a DC ainda não conseguiu se livrar da sua benção/maldição do passado chamada Christopher Nolan. Após o triunfal surgimento desse diretor que, até então, é o maior herói e vilão do universo live-action dos superamigos da justiça (a aclamada trilogia “O Cavaleiro das Trevas” elevara muito o nível de comparação das obras subsequentes), todo o conteúdo audiovisual produzido necessita insaciavelmente ser realista e sério. E é nessa pegada que surge “Titãs“, série distribuída pela Warner Bros. em território americano, e internacionalmente pela Netflix.

A série nos traz o encontro dos integrantes dos Novos Titãs (formação da equipe da década de 1980, com exceção do Ciborgue, possivelmente pela sua participação no grupo principal, nas telonas), onde somos introduzidos ao universo dos personagens. E, ainda que haja menção a alguns dos integrantes do “grupo de elite” da DC, não restam dúvidas se passar em um universo totalmente à parte das demais obras já produzidas.

A primeira temporada é baseada no arco das HQs “O Terror de Trigon”, que conta a história da Ravena e sua ligação com seu pai. Embora seja um arco dos quadrinhos onde os personagens já estejam juntos e possuam inteiro conhecimento de suas capacidades, o roteiro acerta em também introduzir a personagem Ravena nesse novo mundo do qual não conhecia, permitindo que o espectador siga as descobertas ao seu lado. Contudo, ainda que com muito material para abordar e demonstrar, o roteiro se prende apenas a alguns poucos detalhes (deixando todo o resto como segundo plano).

Robin e seus amigos

Apesar de se tratar de uma série de super equipe, a trama segue sobre o relacionamento entre Robin e Ravena. O arco gira em torno de Rachel Roth (Teagan Croft, “Ficção Científica Volume Um: O Legado de Osiris”), mas a equipe (composta pelos quatro heróis) perde espaço para o seu líder, Dick Grayson (Brenton Thwaites, “Entrevista com Deus”), que não apenas passa a conduzir a narrativa como também se demonstra ser o personagem principal. Com pouquíssimas exceções, a história não segue sem a sua presença. Isso fica evidente nos momentos em que precisa se afastar do grupo, onde passamos a acompanhá-lo, ignorando os demais.

Koriand’r (Anna Diop, “The Keeping Hours”) e Gar Logan (Ryan Potter, “Running for Grace”) acabam completamente secundarizados, restando apenas como acompanhantes na jornada de Dick e Rachel. Ainda que sigam à trama, mais parecem coadjuvantes na história, introduzidos apenas para agradar aos fãs dos quadrinhos. Outros personagens secundários surgem no decorrer da primeira temporada, como Jason Todd (Curran Walters, “Playing Dead”), Dawn Granger (Minka Kelly, “Nomis”), Hank Hall (Alan Ritchson, “Office Uprising”) e a Donna Troy (Conor Leslie, da série “Other Space”), todos interligados a Dick Grayson. E com a introdução de tantos personagens, principalmente por se tratar de uma série sobre uma equipe, muitos deles acabam com pouco tempo de tela ou são mal aproveitados.

Destaque para a atuação da Teagan, que consegue nos fazer sentir junto com a Rachel todo o seu sofrimento e drama, e para a Conor, que, quando em tela, rouba a cena.

Motivações forçadas

O nosso grupo de heróis se une porque… Bem, porque sim. As motivações de cada um dos integrantes são rasas ou até mesmo inexistentes. Rachel não possui escolha sobre o que fazer, e Dick decide ajudá-la porque, por algum motivo, sente que possui uma obrigação moral de não abandoná-la. Gar decide segui-la sem razão alguma além de uma aparente paixão à primeira vista, e Kori simplesmente segue sem sequer lembrar da sua motivação.

Outra motivação forçada se dá nos “relacionamentos amorosos” do nosso grupo. Estes acontecem quase gratuitamente, parecendo ser mais fan service do que algo natural.

Mudanças dos personagens na adaptação

Ainda que as bases sejam mantidas, os personagens foram bastante repaginados, dando uma nova visão da equipe, a começar pela forma como são chamados. Dick Grayson é o único com codinome, devido ao seu passado já conhecido como Robin. Rachel, Kori e Gar, no entanto, são chamados apenas por seus nomes, com uma ou outra menção às alcunhas de herói – Ravena, Estelar e Mutano, respectivamente. Outra grande mudança foram as idades do grupo. Dick e Kori são adultos (com Dick parecendo um jovem adulto, Kori um pouco mais velha), enquanto Rachel e Gar são adolescentes (Rachel mais parece uma criança). Mas as alterações não param por aí. As personalidades e poderes de cada um dos titãs também receberam uma boa dose de mudança.

Dick se tornou um assassino psicopata e sanguinolento, sem controle de sua violência, matando a todos sem hesitar. Da mesma forma, Kori, antes bondosa e sentimental, agora é uma exímia lutadora que não se importa em tostar alguns bandidos com seus poderes de fogo. Sua habilidade flamejante mais parece com o Tocha Humana, personagem da Marvel, e limita-se apenas a momentos cruciais, com uma justificativa pouco plausível.

Rachel, personagem serena e sentimentalmente equilibrada, tornou-se uma jovem medrosa e insegura, atormentada por algo incapaz de compreender. Seus poderes, advindos de sua alma e controlados pela sua paz interior, mais parecem fruto de uma espécie de possessão demoníaca. E Gar, em muitos momentos o alívio cômico do grupo em contrapeso à seriedade da Rachel, mais parece seguir a insegurança da sua companheira de equipe. Embora devesse ser capaz de se transformar em qualquer animal (atual ou extinto), limita-se apenas à transformação em tigre (talvez uma escolha de roteiro por questões de efeitos especiais).

Mas vale a pena?

Em meio a uma grande leva de produções live-action de super-heróis, “Titãs” chega para fazer algo diferente. Até consegue se distanciar bastante das outras séries da DC produzidas pelo canal CW, mas infelizmente o fantasma de “O Cavaleiro das Trevas” ainda assombra. O tom sombrio deu um novo ar para a obra, mas a violência exagerada mais parece um apelo injustificado de um jovem para ser visto como um adulto. O roteiro possui uma boa e intrigante trama, mas a presença de alguns fillers e desvios da história quebram o ritmo do enredo. Longe de ser perfeito, mas com bom potencial para crescimento.

Aristóteles Fernandes
@rapadura

Compartilhe