Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de janeiro de 2019

Whitney (2018): vida, polêmicas e morte do ícone

O documentário tem montagem ágil com a cara dos primórdios da MTV e mostra através arquivos, entrevistas e gravações de shows, como foi a vida tumultuada da artista.

A palavra ícone nasceu para tratar de figuras religiosas e sagradas, mas foi diversificando o seu significado com o passar do tempo. Hoje, o termo serve para descrever desde os desenhos nos computadores e celulares que indicam funções de maneira visual, até algo ou alguém que é representativo. Whitney Houston (“O Guarda-Costas”) é, nesse sentido, um inegável ícone da música e da cultura pop norte-americana, com todos os seus prós e contras. Ela teve o pacote completo, com ascensão, fama, percalços e queda. Tudo isso está condensado no documentário “Whitney“, dirigido por Kevin Macdonald (“O Último Rei da Escócia”).

Whitney Elizabeth Houston, ou Nippy, como seus familiares e pessoas próximas a chamavam, cantou e encantou gerações. A artista feminina detém o recorde de mais músicas consecutivas no topo da Billboard. Ela colocou oito canções diferentes no primeiro lugar do veículo que cobre o mundo da música e elenca os maiores sucessos. Mas, quem reconhece prontamente o seu nome, talvez não saiba o caminho percorrido por ela para chegar ao estrelato, tampouco o conturbado final de sua vida.

A história de Whitney renderia uma biografia em duas parte, ou até mesmo uma série de alguns episódios, por isso as suas duas horas de duração possam pesar um pouco para o público pelo excesso de conteúdo. Mas a jornada vale o investimento. Há recompensas para todos os tipos de espectadores em momentos divertidos, emocionantes, surpreendentes e, é claro, dançantes. A artista nasceu em uma casa de músicos e foi criada cantando nos corais da igreja, isso contribui para que ela estivesse sempre rodeada pela família nas suas turnês e gravações nos anos de sucesso. Mas também teve responsabilidade pelo problemas físicos e psicológicos pelos quais Whitney passou.

Como o filme é um documentário participativo, no qual a voz do entrevistador fazendo perguntas está presente, a equipe de filmagem não exita em questionar irmãos, mãe, tia, agentes e amigos sobre temas polêmicos envolvendo relacionamentos, abusos, vícios, dinheiro e tudo o mais que esteve presente na trajetória da cantora. Isso trouxe à tona declarações fortes e revelações espantosas, mas deixa de lado outras tantas ou explora sem a profundidade que temas como violência doméstica ou representatividade do negro na cultura norte-americana poderiam ter.

Se em longas de ficção, uma das tarefas do montador é fazer o seu trabalho praticamente ser invisível, em obras de não-ficção, como o documentário em questão, a presença desse profissional é notada e se torna a alma do filme. O editor Sam Rice-Edwards tem aqui a sua estreia em longas-metragens com um excelente trabalho. Sob a supervisão do experiente diretor Macdonald, o editor amarra situações em que as falas validam as imagens selecionadas, além de outras nas quais as declarações contrastam com os vídeos.

Para dar um exemplo prático de como sua construção é eficiente, em uma cena é mostrado um zoom de uma foto de Whitney com o magnata da música Clive Davis e mais alguém fora de enquadramento. Enquanto da fotografia vai revelando a mãe de Whitney, Cissy Houston, presente na imagem, as declarações dos agentes Steve Gittelman e Nicole David atestam que o verdadeiro responsável pela construção da artista não foi Clive, e sim Cissy, que esteve presente o tempo todo na fotografia e na vida da cantora.

Mesmo com toda a energia que a artista tinha, e com a divisão do filme em capítulos com montagens que lembram o começo da MTV, a escolha por utilizar o terço final do filme com os problemas vividos por Whitney é desgastante e deixa um gosto amargo só aliviado por uma playlist com grandes músicas da cantora como “So Emotional”, “How Will I Know” e “I Wanna Dance with Somebody”, todas presentes no longa.

Hiago Leal
@rapadura

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