Sucesso de bilheteria e crítica, a obra é um divertido filme assustador, que mistura bem os elementos de terror e comédia sem deixar de ser um agradável filme natalino
O (sub)gênero “terrir” tornou-se particularmente interessante para os grandes estúdios durante a década de 1980. Filmes que eram concebidos como comédias a partir dos conceitos de terror (ou vice-versa) lotaram tantos cinemas que praticamente obrigaram os produtores a embarcarem neste conceito. Daí, poderiam sair obras que abusavam da sátira sem se levar a sério, como “O Ataque dos Tomates Assassinos” (1978), bem como aqueles que apostavam num sarcasmo mais ácido, como “A Volta dos Mortos-Vivos” (1985). Entre um e outro, um universo de possibilidades era lançado, com uma frequência tão assustadora quanto os próprios filmes. “Gremlins” é uma dessas obras, que brinca tão divertidamente com dois conceitos que acaba superando os eventuais problemas técnicos.
A história é relativamente simples. Randall (Hoyt Axton, de “Paixão Incontrolável”), um inventor de habilidades questionáveis, compra para seu filho uma estranha criatura como presente de natal. Ao abrir o pacote, o jovem Billy (Zach Galligan, de “Terror no Pântano 3”) se depara com um mogwai e é informado de três regras que jamais devem ser ignoradas: eles não podem ser expostos à luz, não devem entrar em contato com a água e, acima de tudo, jamais devem ser alimentados após a meia-noite.
“Gremlins” tem como principal função brincar com os sentimentos do público. A pessoa pode ficar com medo, dar risadas ou se emocionar assistindo ao filme. Isso se justifica quando se olha para os envolvidos na produção. O roteiro, de Chris Columbus (novato na época, mas que depois iria trabalhar em títulos como “Os Goonies” e “Esqueceram de Mim”), trabalha com a leveza que a proposta pede. Os gremlins, apesar de oferecerem perigo, são mostrados de maneira comicamente exagerada. Eles são mais arruaceiros do que assassinos, vivendo mais pelo caos do que pela morte. Columbus consegue dar o tom no texto que essas criaturas demandam, sem pesar demais no terror ou na comédia.
A direção ficou a cargo de Joe Dante. Ele somava experiência de filmes como “Hollywood Boulevard”, “Piranha” e “Grito de Horror”, portanto lhe coube a função de deixar o longa mais soturno (contam algumas lendas que uma das cenas excluídas mostrava a cabeça da mãe de Billy decapitada após um ataque dos gremlins). As sequências dos ataques em locais fechados, como a escola ou a casa da senhora Deagle, beiram o claustrofóbico e reforçam que apesar de (também) serem uma piada, os monstrinhos oferecem perigo real à cidade.
Por fim temos ainda Steven Spielberg (“Jogador Nº 1”), que além de ter uma discreta participação no filme, serviu como consultor e produtor executivo do longa. O rei absoluto do que se convencionou chamar de “sessão da tarde” (no Brasil isso praticamente tornou-se um gênero) acompanhou a produção e seu humor é notadamente perceptível, em especial na cena do cinema.
O filme ainda consegue tempo para brincar com referências que dizem algo sobre a própria narrativa, como as menções a Orson Welles (que causou pânico nacional ao ler um trecho do livro “Guerra dos Mundos” num programa de rádio), a “Invasores de Corpos”, que é exibido pouco antes dos mogwais assumirem a forma de casulo para então liberar os gremlins, ou ainda ao clássico “A Felicidade Não se Compra”. De certo modo, “Gremlins” se tornou um simulacro da obra de Capra, não apenas por também ter um trecho exibido, mas pela construção narrativa. O visual das cidades é semelhante, e os dramas vividos pelos personagens (à exceção dos monstrinhos, naturalmente) são equivalentes. Assim, Dante conseguiu tornar a sua obra, apesar de tão despretensiosa, como um dos mais agradáveis filmes de natal.