A diversão descompromissada e despida de preocupações com o realismo ou com a seriedade é o maior desejo desse filme trash, no melhor sentido da palavra.
A Hollywood dos anos 1980 atendeu a diferentes gostos e preferências, agradando a um público que, até hoje, lembra com saudosismo daquela década. Houveram filmes de personagens “brucutus”, imortalizados por Sylvester Stallone e Arnold Swarzenegger, como “Rambo” e “Comando para Matar“. Houveram filmes sobre jovens adolescentes, feitos por John Hughes, como “Curtindo a Vida Adoidado” e “Clube dos Cinco“. Houveram slasher movies, como “Halloween” e “Sexta-feira 13“. E houveram também filmes como “A Bolha Assassina“, cujas histórias enfocam monstros assassinos disformes e o pânico gerado por eles.
O longa, dirigido por Chuck Russell (“O Escorpião Rei“), é a refilmagem de uma ficção científica de horror chamada “A Bolha“, de 1958. Trata-se de um terror passado em uma cidade da Califórnia, onde estudantes descobrem uma substância gelatinosa que derrete carne humana. Quando ela começa a crescer descontroladamente e a atacar os moradores, uma equipe do exército é enviada para conter a ameaça. Essa história combina muito bem com a inocência de uma década que parecia não ser tão cética a ponto de duvidar de argumentos fantásticos que ultrapassavam nossa realidade; não havia, portanto, a preocupação em tornar eventos incomuns palpáveis ao nosso mundo, nem realistas dentro de justificativas científicas aceitáveis para o cinema. A fantasia estava presente por si só e já era suficiente como exercício de imaginação e de projeção da criatividade.
O aspecto fantástico se destaca desde a abertura, quando a câmera desce do céu e passeia pela cidade em tomadas aéreas ou planos gerais com uma iluminação azulada e sombria. As duas características ambientam o público nos cenários daquela cidade e indicam que o risco mortal vem do espaço, fugindo das leis naturais conhecidas. A ambientação naquele universo também é feita através de personagens típicos dos filmes da década de 1980: o atleta Paul (Donovan Leitch, “Tempo de Glória“), a cheerleader Meg (Shawnee Smith, da franquia “Jogos Mortais“), o delinquente juvenil Brian (Kevin Dillon, da série “Entourage“), o xerife Herb (Jeffrey DeMunn, da série “The Walking Dead“) e outras figuras marcantes; todas elas habitam uma cidadezinha pequena de classe média e cuidam de suas vidas, dos jogos de futebol americano na escola e do trabalho cotidiano.
Porém, o que mais se sobressai é a caracterização da bolha assassina e sua violência inexplicável. A partir do momento em que cai na Terra, seus ataques se sucedem contra os habitantes de forma brutal e repulsiva ao liberarem um excesso de gosma e de sangue durante a absorção das vítimas. O estilo trash, não apenas é criado pelos criativos ataques encenados (invadindo o corpo da vítima ou a sugando de surpresa, por exemplo), como também pelo CGI utilizado na composição da criatura – os efeitos visuais podem estar datados e destoantes do cenário e dos personagens, porém conseguem reforçar o tom fantasioso da história.
Além do terror ocasional provocado pelos ataques, há também um bom humor próprio da diversão pretendida pelo roteiro. Duas passagens engraçadas são construídas pela montagem de cortes secos que conectam situações distintas a partir de um significado cômico inesperado: após a primeira aparição da bolha, há um corte para dois meninos comendo uma gelatina com forma semelhante à criatura assassina; e alguns ataques desse ser são seguidos pelo enquadramento de uma plateia se assustando durante uma sessão de filme de terror, reação lógica à violência praticada pelo monstro.
Por outro lado, as trajetórias dos personagens e seus temas não são um ponto forte da produção. Não há o mínimo desenvolvimento daqueles indivíduos ou evoluções pelas quais eles passariam, somente a criação de arquétipos facilmente reconhecíveis e a exposição muito rápida de alguns conflitos. O padre local acredita que as mortes são o prenúncio do Juízo Final bíblico e enlouquece em sua crença deturpada; uma agência governamental está disposta a sacrificar vidas inocentes para conseguir capturar o organismo e poder estudá-lo; e as eventuais explicações científicas daqueles acontecimentos são abandonadas em favor da criação de uma mitologia própria para o filme, que não dependa da razão nem da ciência.
“A Bolha Assassina” em seu período de lançamento se juntou a outras produções que refilmaram histórias de terror da década de 1950, entre elas “A Mosca” e “O Enigma de Outro Mundo“. O trabalho de Chuck Russell, ao contrário dos outros dois, teve um alcance popular maior e ajudou a construir a áurea década de 1980. Pode não ser um filme imune a críticas e equívocos, nem um grande exemplar de qualidade na sétima arte, mas é um entretenimento que sabe o que quer e entrega uma diversão descompromissada que não se leva a sério mais do que precisa.