Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 01 de dezembro de 2018

Sierra Burgess é uma Loser (2018): o que os olhos não veem, pelo chat se sente

Longa acerta ao mostrar por outro ângulo clichês de filme adolescente.

Existe algo de especial em filmes de colegial. É fácil se identificar com as representações do nerd, o atleta, a garota popular, o amigo fiel etc. A história é divertida e sempre traz uma bela moral de superação. Vemos isso muito fácil e nostalgicamente nos filmes dos anos 1980. Em “Sierra Burgess é uma Loser” tudo isso está presente. Se a princípio parece um filme bobo, ele se prova com um roteiro interessante, que não só trabalha bem cada clichê, mas os atualiza.

Sierra Burgess (Shannon Purser, da série “Stranger Things”) é a fracassada do colégio. Mas o curioso aqui é que o filme não a apresenta como uma fracassada de fato, mas uma garota fora do padrão, que se aceita como é, mas luta contra a dificuldade de ser diferente. Ainda assim, já de início ela mostra uma personalidade mais forte que Veronica (Kristine Froseth, “Quem é Você,  Alasca?”), a garota popular, que anda sempre com sua panelinha, mas não é capaz de vencer suas batalhas internas. Até mesmo quando tenta dar um golpe em Sierra, acaba, de certa forma, ajudando a menina ao colocar Jamey (Noah Centineo, “Para Todos os Garotos que já Amei”) em seu caminho. O garoto é o quarterback do time de futebol, porém não é tão popular assim e acaba sendo manipulado pelas meninas ao receber o telefone de Sierra, achando ser de Veronica. O relacionamento, baseado numa mentira, tem assim sua origem e um romance se inicia.

A construção desse romance é o ponto da principal reflexão que o filme traz, com um embate entre aparência x essência. Afinal, o que realmente importa? Neste duelo, os personagens começam a se conhecer, e numa conveniente troca de favores caem os preconceitos.

Por falar em preconceito, o filme ganha pontos pela bela inclusão social. A começar pelo aprofundamento do trio principal, que de cara mostra de maneira não muito convencional o atleta, a líder de torcida e a loser, e como lidam com suas realidades. Quanto às minorias, tudo é feito de maneira bem orgânica, sem levantar bandeira ou fazer panfletagem – bem como deveria ser nas mídias e na vida real. Isso torna o roteiro ainda mais verossímil, e amplia as chances de identificação com os personagens.

E se o filme acerta ao estabelecer a relação entre os envolvidos com o acontecido, o ato final acaba resolvendo tudo de maneira muito rápida. O roteiro diminui o passo da fuga do clichê e reverte a inovação, mas não dá tempo aos personagens de viverem e vencerem seus conflitos.

“Sierra Burgess é uma Loser” pode parecer um filme superficial a princípio, mas surpreende com o desenvolvimento da trama e dos personagens. Apesar da pressa na resolução depois de um longo – mas não chato, muito menos desnecessário – desenvolvimento da situação, é fácil entrar na obra 010e se solidarizar com os alunos, inclusive antagonistas. E a reflexão ao final é tão necessária quanto atual: o quanto podemos conhecer das pessoas através da internet, até de nós mesmos? Entre uma rosa e uma margarida, a última não é tão feia assim.

João Victor Barros
@jotaerrebarros

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