Sem Pedro Pascal e Wagner Moura, “spin-off” entrega uma versão piorada da série original.
Em novembro de 2018, os fãs de “Narcos” aguardavam ansiosamente o que parecia ser a estreia da 4ª temporada da série. Entretanto, a Netflix surpreendeu quando no lugar disso estreou em seu catálogo “Narcos: México”, como uma série independente da trama original. Um acerto do serviço de streaming, que com a decisão não manchou o nome de um excelente seriado com três temporadas bem construídas.
Na nova série, acompanhamos a ascensão de Miguel Ángel Félix Gallardo (Diego Luna, de “Rogue One: Uma História Star Wars”) como o traficante mais poderoso do México, e observamos o surgimento do primeiro grande cartel do país. Félix é apresentado como um ambicioso ex-policial que sonha em crescer no mundo do tráfico com a comercialização da maconha criada e cultivada por seu sócio de Rafa Quintero (Tenoch Huerta, de “Os Tigres Não Têm Medo”). Para isso, precisa fazer novas e perigosas alianças, e alterar o status quo do tráfico de drogas mexicano.
Do outro lado da moeda está Kiki Camarena (Michael Peña, de “Homem-Formiga e a Vespa”), um incorruptível agente americano da DEA transferido para o México, que não se conforma com a apatia da polícia local e entra em uma perseguição de gato e rato com Félix, em uma tentativa de frear o narcotráfico.
Ficou com a sensação de já ter visto isso em algum outro lugar? É porque já viu.
Após o fechamento da narrativa de Pablo Escobar (Wagner Moura, de “Trash: A Esperança Vem do Lixo”), “Narcos” sobreviveu com a permanência no elenco de Pedro Pascal (“O Protetor 2”) como o agente Peña, que agora buscava desmantelar o cartel de Calli. Apesar da opção de continuar como uma antologia, os criadores Carlo Bernard, Chris Brancato e Doug Miro (os mesmo de “Narcos”) decidiram lançar “Narcos: México” como uma série independente de sua antecessora. O que não seria ruim, se ela tivesse inovado em algum aspecto. Entretanto, a série repete as mesmas fórmulas trazidas anteriormente, sem o carisma de seus vilões e a alma presentes na série originária.
Não é como se não houvessem atuações poderosas no seriado. Michael Peña brilha como Kiki Camarena, conseguindo dissociar-se totalmente de seu marcante personagem Luis, alívio cômico da franquia de “Homem-Formiga”. Joaquín Cosio (do aguardado “Rambo 5”) entrega uma performance espetacular como Don Neto, um experiente e sábio traficante, que apesar de durão, tem sua vulnerabilidade bem explorada. Ele também é responsável por alguns (dos poucos) momentos engraçados da série.
Mas quem entrou em “Narcos: México” como um de seus principais nomes e permaneceu totalmente ofuscado foi Diego Luna. Félix é extremamente ambicioso, mas o fato de seu passado não ter sido explorado faz com que o público não compreenda ou empatize com suas motivações. Pouco a pouco, há em Félix uma transformação muito similar com a ocorrida em Walter White (Bryan Cranston, de “A Melhor Escolha”) em “Breaking Bad”. Entretanto, não há espaço para a evolução do personagem que justifique a mudança em sua personalidade.
Quem ganha com a falta de brilho de Luna é Tenoch Huerta. Seu Rafa se torna o verdadeiro vilão, aquele que o espectador ama odiar. Ele é impulsivo, mimado e perverso, chegando a lembrar em alguns momentos uma versão mais corajosa de Joffrey Baratheon (Jack Gleeson), de “Game of Thrones”. Com isso, nos importamos mais com o desfecho de Rafa que com o do principal antagonista.
Em um mundo dominado por homens (principalmente na década de 70 e 80), “Narcos: México” agrada ao trazer mulheres mais presentes, em vez de meros objetos de desejo. Destaques para Alyssa Diaz (da série “Ray Donavan”) e Teresa Ruiz (da série “Aqui na Terra”), que interpretam respectivamente Mika Camarena e Isabella Bautista. Mika é esposa de Kiki e ganha maior protagonismo nos últimos episódios, que lhe rendem algumas cenas impactantes. Já Isabella engana ao ser apresentada como apenas mais uma mulher hiperssexualizada. Em verdade, ela é empoderada e luta por reconhecimento e uma posição de maior destaque no cenário do narcotráfico mexicano.
Apesar de os personagens serem diferentes e da locação ter sido alterada da Colômbia para o México, o estilo narrativo permanece o mesmo. A repetição da fórmula (narração em inglês, utilização de filmagens jornalísticas da época, trama sobre cartéis violentos, com perseguições e tiroteios) torna a experiência do espectador cansativa. Nem o crossover inesperado no 5º episódio consegue prender a atenção do público por muito tempo.
A fotografia continua excelente, com câmeras em movimento e muito dinamismo, embora as sequências de tiroteios sejam longas, repetitivas e, portanto, cansativas. Há algumas cenas mais poéticas, com a presença de elementos musicais se encaixando perfeitamente na narrativa. Já as locações são um deleite para os olhos, com paisagens ora desérticas, ora com muito verde e mar.
Com uma trama que somente engata nos episódios finais, temos a sensação de que a temporada inteira foi um prelúdio do que está por vir. No fim das contas, fosse a série em português, o espectador conseguiria assisti-la tranquilamente enquanto realizava outras tarefas mais urgentes.