Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 18 de novembro de 2018

A Vingança Perfeita (2018): a quilômetros de distância da perfeição

Um belo visual neon e para por aí. Pouquíssimas coisas - sendo bem otimista - satisfazem nesse filme ineficiente e tedioso sobre vingança.

Desde os primórdios do cinema, o subgênero “filme de vingança” tem apresentado uma rica variedade de narrativas envolventes, algumas mais cruas, e outras com recursos mais elaborados e roteiros que brincam com as expectativas do público, graças aos famigerados plot twists. A lista é grande e a tarefa de enumerar os longas é melhor deixar por conta das enciclopédias do cinema. “John Wick” e “John Wick: Um Novo Dia Para Matar” são exceções que valem a menção, por serem exemplo de vinganças recentes bem executadas e por guardarem certa semelhança estética com “A Vingança Perfeita”, uma produção que parece se deliciar com sua punição mais do que ela merece.

O cenário é concebido no coração de uma cidade decadente, com suas ruas iluminadas apenas pelo neon de seus vultosos outdoors. Ali, em meio ao clima melancólico, localiza-se um terminal, onde o  longa acompanha a trajetória de cinco personagens e suas sinistras motivações: os assassinos de aluguel Vince (Dexter Fletcher, “Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim”) e Alfred (Max Irons, “A Casa Torta”) encarregados de cumprir uma missão macabra, o misterioso zelador Clinton (Mike Myers, “Bohemian Rhapsody“), o professor de inglês Bill (Simon Pegg, “Missão: Impossível – Efeito Fallout”) e a garçonete/dançarina Annie (Margot Robbie, “Pedro Coelho”).

Assim como na franquia “John Wick”, a ambientação de “A Vingança Perfeita” é composta por diversos tons de cores realçados pelo neon, criando um submundo taciturno e distópico (à la “Blade Runner: O Caçador de Andróides”) que, apesar de pouco original, continua se mostrando interessante. Arquiteta-se então, com muita inteligência, a atmosfera perfeita para as peculiares figuras que lá habitam e suas obscuras intenções. Uma pena que toda essa concepção ideal seja apenas um embrulho bonito para um roteiro incapaz de extrair o mínimo de proveito de uma premissa intrigante, personagens potencialmente enigmáticos e de seu conto de vingança, que acaba em confusão na tentativa de ser complexo no tempo e no espaço.

Para não falar que o único atrativo do filme são os elementos que elevam seu ambiente a um território palpavelmente derrotado, o longa expõe algumas atuações muito decentes. Mesmo sabotado por um roteiro desastroso e uma direção que abusa constantemente de ângulos holandeses, o que fazem os mesmos perderem sua relevância dramática, parte do elenco demonstra ser capaz de atrair o interesse necessário para que o espectador sinta-se a vontade para ao menos ir até o final da história. Ainda assim, a maioria das interpretações são sofríveis, morosas e caricatas, complementadas por diálogos risíveis e que levados a sério se mostram mais ridículos.

O elenco traz alguns atores estrelados como Margot Robbie, que usa e abusa de toda a sua beleza e talento para dar vida à sua hipnótica protagonista. Confere a Annie nuances que transitem desde o arquétipo da femme fatale noir até a mocinha indefesa esperando pelo herói. Sua atuação é um dos pontos altos do filme, o que revela sua habilidade para se sobressair mesmo inserida num produto recheado de escolhas duvidosas (vide a participação no bagunçado “Esquadrão Suicida”, no qual ela é praticamente a única coisa boa em cena). Outro que se sai muito bem é o calejado Simon Pegg. Com seu senso de humor ágil e pontual, oferece junto com Robbie sequências refrescantes. O resto? Bom, o resto é de doer. Myers, Fletcher e Irons juntos é melhor esquecer.

Dirigido e roteirizado por Vaughn Stein, que até então só havia exercido trabalhos de segundo diretor e assistente de direção como, por exemplo, em “A Bela e a Fera”, “A Vingança Perfeita” (cujo o título em inglês “Terminal” faz muito mais sentido, além de proporcionar legítimas metáforas), sequer reconhece a hora de encerrar sua narrativa. Quando seu enredo parece resolvido, ainda que de maneira banal, o espectador é desnorteado com mais um plot twist, como se todos os anteriores já não tivessem causado confusão o bastante. Normalmente dá pra enxergar potencial em alguns filmes, o que não é o caso desse. Quem sabe se mais cru e menos difuso o argumento teria engrenado. Esse é para aqueles que achavam que filme de vingança não poderia dar errado.

Renato Caliman
@renato_caliman

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