Comédia com Amy Schumer é repleta de boas intenções, mas não é inventiva o bastante para escapar dos clichês.
Lançada ao estrelato após protagonizar a série que leva seu nome (“Inside Amy Schumer”), Amy Schumer passou a ser uma voz feminina importante, ao lado de outras como Amy Poehler e Tina Fey (ambas oriundas do “Saturday Night Live”), numa profissão dominada por homens. Dona de um humor ácido e certeiro, convidou o público a refletir (e rir!) um pouco mais sobre os padrões -morais e de beleza, impostos pela sociedade. Propõe essa discussão em seus shows de comédia stand-up, séries de TV e, claro, em seus filmes. Em “Descompensada” (2014) falou sobre os pontos positivos da poligamia, o não se apaixonar e o lado bom da curtição. Com “Viagem das Loucas” (2017) conversou sobre curtição e relações familiares. E agora, em “Sexy por Acidente“, seu terceiro longa-metragem no posto de protagonista, a comediante ataca os modelos de beleza fabricados pela indústria e diverte com as armas que se apresentam, porém, não é ambiciosa o necessário para se destacar.
Na história, Amy é Renée Bennett, uma mulher que se acha feia e acima do peso e, por conta disso, trava diariamente uma batalha contra a insegurança. Mas, após acordar de um acidente na academia, passa a acreditar que ela é a mulher mais bonita e capaz do planeta. Essa confiança toda a capacita a viver sem medo. Mas o que acontece quando, na verdade, a aparência dela nunca mudou?
Só com essa premissa é possível adivinhar o que vem a seguir. No início não interfere, pois a habilidade da atriz em tirar vantagem cômica de sua fisicalidade rende cenas engraçadíssimas. Ela pratica um “O Amor É Cego” (2001) sem os truques visuais do filme com Jack Black (“Jumanji: Bem-vindo à Selva”), e isso é um fator positivo que faz com que o público a veja da mesma maneira que os personagens da narrativa, abrindo um leque ainda maior para as piadas do roteiro. Soma-se a isso o carisma de Schumer e a dinâmica dela com os coadjuvantes, em especial com Rory Scovel (“A Casa Caiu: Um Cassino na Vizinhança”), seu par romântico no longa.
A relação com suas duas amigas (as atrizes Busy Philipps e Aidy Bryant), cada uma com uma aparência física diferente, o que por um lado ajuda a expandir os dramas e não focar somente na personagem principal, já não se mostra acertada quando aprofundada. Em poucos instantes, a ultrapassada busca pelo homem surge, contraditório para um filme que levanta a bandeira da autoconfiança e independência. As cenas em que ela divide a tela com Michelle Williams (“Venom”), responsável por interpretar uma figura peculiar, por conta de sua voz exageradamente infantil, termina por irritar, ainda que tenha uma explicação (ridícula), para isso. Por outro lado, a relação brinca com os estereótipos do que imaginamos ser uma CEO da indústria da moda.
Porém, conforme a narrativa vai se desenrolando, o que era para ser cômico perde sua força, resultando em previsibilidade. A mensagem interessante e muito necessária, que poderia servir de estímulo às pessoas que se enxergam na mesma situação que a protagonista, esvai-se na romantização dos acontecimentos, revelando a fragilidade do argumento escrito pela dupla Abby Kohn e Marc Silverstein (ambos de “Como Ser Solteira”), que não demonstra vontade em ampliar a discussão para além das salas de cinema.
Infelizmente nem todas as soluções encontradas para os nossos problemas de insegurança e insatisfação com a beleza exterior são simples como a produção revela em tela. Nem sempre é apenas uma questão de atitude ou autoconfiança. A discussão em “Sexy por Acidente” é rasa, tendo em vista o tamanho do problema. Cheio de boas intenções embrulhadas em muito sarcasmo, o filme pode agradar e gerar faíscas, mas está longe de servir de modelo ou pauta de mudanças.