Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 03 de novembro de 2018

12 Heróis (2018): salvadores do mundo em sua primeira missão no Afeganistão

Produção ganha em cenas de guerra e ao mostrar contexto político no Afeganistão, mas peca pela tradicional visão dos americanos como os heróis do Ocidente e da democracia.

O cinema está repleto de filmes de guerra, principalmente aqueles que contam histórias envolvendo os Estados Unidos e todos os conflitos que o país já enfrentou. Em “12 Heróis” não é diferente. Dirigida por Nicolai Fuglsig (“Exfil”), a obra conta a história real da primeira tropa do exército americano, composta por doze soldados de elite, enviada ao Afeganistão após o ataque terrorista às Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001. O longa é estrelado pelo australiano/asgardiano Chris Hemsworth (“Vingadores: Guerra Infinita”), no papel de Mitch Nelson, capitão da tropa, e por Michael Shannon (“Fahrenheit 451”), que interpreta Hal Spencer, homem de confiança de Nelson.

Em toda produção estadunidense a contar o ponto de vista dos próprios americanos, a mensagem que se busca passar é a de que os EUA sofreram um ataque (o que de fato aconteceu) e precisa responder à ofensiva de maneira enérgica. Utilizando a tradicional linguagem patriótica, “12 Heróis” apresenta os americanos como os salvadores da democracia e da liberdade. Momentos de batalha e também de camaradagem entre os doze militares enviados para o país do Oriente Médio reforçam essa impressão.

Um ponto positivo do filme consiste no fato dele não apresentar os afegãos simplesmente como vilões. O roteiro faz questão de mostrar que existe um cenário político muito mais complexo, onde diversas tribos estão em constante briga pelo território em questão. Neste contexto, cabe ao capitão Nelson ajudar o general afegão Abdul Rashid Dostum (Navid Negahban) a enfrentar a Al Qaeda e todo o mal que a organização representa. Faltou apenas mostrar que esse mal, objeto de desejo de enfrentamento dos americanos, foi criado pelos próprios, afinal, como surgiu a figura de Osama Bin Laden, mostrado apenas uma vez na tela?

Gravado no Novo México, o filme consegue impressionar pelas paisagens montanhosas exuberantes, emulando bem o cenário do Afeganistão e suas intermináveis cavernas, elemento muito importante nos conflitos naquele país. A trama também aborda bem o aspecto de geografia, onde dominar e conhecer o território à frente é de vital importância para seguir vivo na guerra. As cenas dos conflitos armados entre americanos e afegãos são bem desenvolvidas, e as explosões causadas pelos B-52 americanos, que jogam suas poderosas bombas do alto, causam estragos que convencem. Realmente parece não haver o uso de efeitos especiais.

A mesma noção de geografia, que serve como norte do filme, também o prejudica. Em alguns momentos, temos a impressão que um confronto está próximo, mas na verdade ele está bem longe. Em outra ocasião, soldados americanos correm para ajudar seus companheiros (que parecem estar longe), mas depois de alguns passos eles já estão no mesmo local! Aspecto confuso da produção, que não conseguiu desenhar bem o mapa dos conflitos. Aliás, o longa também falha ao mostrar a história dos doze soldados. Alguns estão na tela apenas porque a história real foi com doze combatentes. Só três realmente se destacam: Nelson, Spencer e Sam Diller (Michael Peña, de “Homem Formiga e a Vespa”). O restante tem apenas seus nomes apresentados, faltando um mínimo de profundidade a esses personagens.

Um ponto de muito destaque no longa são os cavalos. Usados pelo General Dostum para se deslocar nas intrincadas montanhas afegãs, Nelson e sua tropa devem aprender a andar nos animais para conseguir chegar nas cidades tomadas pela Al Qaeda. É interessante o contraponto apresentado, pois para se chegar até uma cidade que precisa ser bombardeada pelo que existe de mais moderno no Exército americano, é necessário usar cavalos, algo rústico e antigo. E os animais acabam se mostrando decisivos em várias batalhas.

Momentos de reviravolta e de ajudas inesperadas, ou previsíveis se pensarmos no conceito de Deus ex machina presente no cinema, tornam “12 Heróis” fácil de antever em diversos momentos. Como a história do 11 de setembro e seus desdobramentos têm uma presença muito forte no imaginário coletivo, assistir ao filme e conhecer detalhes dessa história em específico, que era secreta até pouco tempo atrás, ajuda a entender o começo da reação americana contra a Al Qaeda. Pena que, para isso, o principal combustível seja o patriotismo americano, sempre exacerbado e focado em apenas uma direção, sem levar em conta motivos e contextos de outras culturas e povos. Talvez fazendo isso o longa se tornasse mais interessante, mas talvez a obra ficasse enfadonha demais para os padrões de cinema de ação hollywoodianos.

Filipe Scotti
@filipescotti

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