Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 16 de maio de 2018

Han Solo: Uma História Star Wars (2018): cadê aquele cafajeste raiz que a gente ama?

Apático e distante, o filme parece não dialogar com a saga que o inspira, borrifando referências e situações sem qualquer empatia.

Desde que foi anunciado, lá nos idos de 2013, o longa “Han Solo: Uma História Star Wars” – que obviamente ainda não possuía este nome – gerou uma grande discussão entre os fãs da saga, já que alguns defendiam a intenção da Disney/Lucasfilm em contar a história do contrabandista cafajeste mais amado do mundo, enquanto outros acreditavam que esta revisita não faria sentido algum de existir. Além disso, entendiam que ela poderia, inclusive, afetar a aura “esperta” que o ator Harrison Ford, ao lado do diretor George Lucas, criaram para o personagem icônico. Vista as atribulações que se sucederam com a produção, com direito à demissão dos diretores originais e contratação de um novo profissional, até que o longa não é o desastre que poderia ser, mas também não chega a agradar.

Ron Howard, diretor dos bons “Rush: No Limite da Emoção” e “Frost/Nixon”, além da não tão boa trilogia baseada nas obras do escritor Dan Brown, assumiu o longa aos quinze minutos do segundo tempo e precisou, sem adiar um dia sequer a data de estreia, dar conta de uma refilmagem de quase oitenta por cento do filme, o que é um mérito e tanto. O que não podemos chamar de excelência é o tom que ele resolveu dar à história. Com uma visível e incômoda intenção de se afastar de polêmicas, algo que Rian Johnson abraçou com prazer, para o bem ou para o mau, em “Os Últimos Jedi”, o diretor criou aqui uma obra insípida e carente de emoção genuína.

Han Solo, ou só Han, já que o filme se preocupa até em explicar a origem do sobrenome do herói, é uma espécie de escravo que rouba apenas para conseguir sair, juntamente com a namorada Qi’Ra, das garras de seus captores e fugir do planeta arruinado onde nasceu. Um infortúnio separa a dupla, e Han se envolve com uma rede de contrabandistas intergaláticos, no intuito de se tornar um piloto e retornar para salvar a garota. No caminho, ele acaba encontrando e conhecendo o inseparável amigo Chewbacca. Não surpreendendo a audiência nem por um segundo, mesmo que haja muita intenção para tal, a impressão é a de que o roteiro do longa não se desenvolveu em torno da mitologia do personagem, como deveria ser, e sim como uma história padrão qualquer, onde foram salpicadas, aqui e ali, as centenas de referências que permeiam a saga “Star Wars”.

Além de tratar burocraticamente cada “causo” existente na vida do protagonista, Howard consegue subtrair todo o sentimento que elas poderiam causar no público. Um exemplo é a tão esperada fuga pelo percurso de Kessel, que Han orgulha-se em propagar por toda a galáxia, ao tê-la percorrido em menos de doze parsecs. A fotografia da sequência é tão escura e os acontecimentos se atropelam de tal forma, que causam uma confusão visual em nada parecida com a fuga alucinada que a situação sugeria. Não obstante, os momentos que mais sofrem com essa falta de conexão são os emotivos. É impossível se afeiçoar aos personagens e às histórias que os ligam, afinal os próprios indivíduos parecem não se importar um com os outros em nenhuma circunstância.

Dono de uma das atuações inéditas mais (mal) julgadas da história do cinema, Alden Ehrenreich (“Ave, César!”) não compromete e entrega uma decente “imitação” (no bom sentido da palavra) das performances de Harrison Ford na saga. Pena que seu personagem não pareça o mesmo, já que aqui a sua personalidade é muito diferente do que vemos na trilogia original. Emilia Clarke (da série “Game of Thrones”) e Woody Harrelson (“Três Anúncios para um Crime”) têm os seus espaços e charme no longa, mas as reviravoltas e dilemas morais dos papéis que eles interpretam não fazem muito sentido, já que seus percalços e tragédias nunca são efetivamente sentidos. Outro que se esperava mais – e que também é prejudicado pelo roteiro -, é Donald Glover (da série “Atlanta”). Apesar do figurino incrível e do porte divertido do ator em tela, seu Lando Calrissian pouco faz no filme além de desfilar com suas estilosas capas.

Positivamente, temos uma visão da galáxia que é pouco explorada na franquia, a das pessoas normais que vivem sob o regime imperial, e das mazelas econômicas e sociais que ele provoca. Se existem contrabandistas, piratas, ladrões e assassinos profissionais a rodo e em todo lugar, o filme faz questão de frisar que isso acontece em decorrência da truculência e ganância do império. Efeitos pontuais e uma diversificada e criativa gama de seres e criaturas que povoam o longa, fazem com que não nos esqueçamos do fato de estarmos diante de um exemplar de “Star Wars”. Por mais fraco que seja. Com destaque para a personagem androide  L3-37 (Phoebe Waller-Bridge, de “Adeus Christopher Robin”), interessante visualmente e que parece ser a única criatura com emoções genuínas em toda a trama.

Ao fim da sessão de “Han Solo: Uma História Star Wars” fica a impressão de que este era realmente um filme que não precisava existir. Insosso e apático, o longa não causa a emoção e o divertimento que as melhores obras da saga oferecem, e mais, tem potencial para ser rapidamente esquecido.

Rogério Montanare
@rmontanare

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