Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 22 de março de 2018

Medo Profundo (2018): faltou mais imersão

Repetitivo e superficial, o longa traz pouco mais do que uma diversão descompromissada de fim de noite.

Filmes de sobrevivência dependem muito de dois fatores para conseguir criar a sensação de claustrofobia necessária para um bom desempenho. O primeiro é a sensação de se estar sem saída: seja estando com o braço preso entre duas rochas, em um caixão, um navio afundando ou mesmo em uma selva labiríntica, estes elementos cumprem o papel de isolar os personagens para aprofundá-los em si mesmos e naqueles que os acompanham. Daí depreende-se o segundo elemento crucial para o bom funcionamento de um filme de sobrevivência: a empatia com as pessoas naquela situação. “Medo Profundo” consegue êxito no primeiro ponto, mas falha em fazer com que nos importemos com suas protagonistas.

Assim como os pôsteres e o título em inglês entregam (“47 Meters Down“), já é perceptível desde o início que o mergulho com tubarões brancos das irmãs Lisa (Mandy Moore, “Um Amor Para Recordar“) e Kate (Claire Holt, da série “The Originals“) no México vai dar errado – e não tarda para que isso aconteça. Presas em uma gaiola a 47 metros abaixo da superfície, cercadas por tubarões famintos e com o oxigênio acabando, as duas precisam correr contra o tempo para salvarem suas vidas.

O cenário é construído para incitar o pânico que está ali. Além de estarem literalmente presas, as irmãs estão cercadas pelos maiores predadores das profundezas, e ainda impossibilitadas de subirem rapidamente à superfície, porque a despressurização repentina mataria a ambas. Neste quesito, o filme é bem-sucedido. Embora previsíveis, os elementos que agravam a situação se dão de maneira rápida e aprofundam a gravidade do problema. As reações desesperadas das personagens não parecem exageradas, porque o perigo é real e “plausível”.

“Plausível”, entre aspas, porque embora não haja limites para a estupidez humana, Kate realmente tenta por isto à prova. Além de repetidas vezes ignorar o bom-senso, a personagem de Holt utiliza de subterfúgios rasos e sem lógica para fazer com que Lisa a acompanhe no mergulho. Neste processo, Kate não só se torna uma personagem pouco inteligente, como também uma irmã e pessoa ruim. É neste ponto que reside o principal problema do filme. O desenvolvimento entre as irmãs não se dá com foco no relacionamento entre elas, mas em um homem, fora do eixo principal da trama, e sobre como elas lidam ou deveriam lidar com ele. Ao fazer esta escolha equivocada, o roteiro acaba enfraquecendo as protagonistas, deixando-as superficiais e desinteressantes – e, consequentemente, nos importamos pouco com seus destinos. Quando o longa tenta se voltar para o eixo mais óbvio e desenvolver as personagens – através do relacionamento entre as duas -, é tarde demais, e o dano já é irrecuperável. A história continua se afogando em perigos demais para personagens de menos.

E de fato, são perigos demais. A trama abusa de infortúnios para as duas personagens, de tal forma que suas sevícias só podem ter saído de uma mente ligeiramente sádica ou da vida real; é difícil aceitar tamanho índice de catástrofes por minuto, e a repetição das desgraças se torna desinteressante e cansativa com o tempo. Por mais divertido que seja ver uma perseguição com um tubarão (aparentemente todos lentos e ruins de mira), após a quarta vez, a tendência é se torcer para o peixe. Desta forma, temos cerca de vinte minutos de filme que poderiam ser cortados sem qualquer prejuízo para a trama, o que nunca é um bom sinal.

Dentre suas repetições e suas personagens tristemente mal desenvolvidas, “Medo Profundo” é raso, mas entretém. Entre ataques violentos, quedas subaquáticas vertiginosas e uma trama que tenta surpreender em mais de um momento, o longa é bem-sucedido em capturar seu público em momentos pontuais, mas não consegue retê-lo entre seus dentes. Uma diversão simples que pouco oferece, porém pouco deixa a desejar.

Erik Avilez
@eriksemc_

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