Com uma ideia inicial e uma apresentação de universo deslumbrantes, o novo longa de Alexander Payne tenta se equilibrar entre méritos e problemas, mas acaba se perdendo demais na tentativa de forçar uma reflexão sobre a sociedade atual.
Alexander Payne (“Nebraska”) tem uma carreira curta, mas de sucesso notável em Hollywood. Contando com três indicações ao Oscar de Melhor Diretor e outras três de Melhor Roteiro, seus filmes costumam representar a sociedade americana – e mundial – de uma forma satírica. Em “Pequena Grande Vida”, o diretor mantém o estigma de criticar o corpo social, porém seu grande pecado foi inserir essa crítica de forma muito abrupta e inesperada, em um longa que vinha se desenhando de uma forma tão maravilhosa a partir de uma premissa bastante instigante.
O conceito da obra é simples e brilhante: cientistas descobrem como encolher seres humanos e decidem utilizar esta técnica para solucionar os diversos problemas da escala global, desde a superpopulação até a escassez de alimentos. O tom da apresentação da descoberta já deixa claro que o filme até se leva a sério como uma ficção científica, porém sempre flertando com uma espécie de leveza. Os aspectos cômicos são inseridos de forma muito inteligente, fazendo com que a mensagem do diretor seja assimilada pelo público de forma bastante natural. A divertida e onipresente trilha sonora de Rolfe Kent (da série “Dexter”) também ajuda nessa climatização.
Não só a apresentação, mas todo o primeiro ato é simplesmente espetacular. Payne consegue criar uma atmosfera imersiva impressionante, de modo que é impossível não se conectar com o mundo apresentado. Ele se preocupa ainda em mostrar tanto a dualidade da ideia em geral – o encolhimento foi concebido para salvar o meio ambiente, mas as pessoas só se interessam em multiplicar seu dinheiro – quanto as reações da população, argumentando para opiniões tanto a favor quanto contra. A fotografia também é muito bem planejada, para sempre dar a sensação de pequenez dos ambientes encolhidos, aumentando ainda mais a imersão.
Dentro dessa premissa, somos apresentados ao casal Paul (Matt Damon, “Suburbicon: Bem-vindos ao Paraíso”) e Audrey Safranek (Kristen Wiig, “Mãe!”) que, passados dez anos da descoberta, decidem que se encolher é a melhor solução para seus problemas. E é a partir desse ponto que o longa começa a se dividir entre méritos e erros.
Embora a ambientação cative, a quantidade de plots inseridos e prontamente esquecidos ou mal resolvidos, incomoda. O diretor parece não se importar nem um pouco com alguns personagens, dando pouquíssimo tempo de tela para se desenvolverem e fazendo com que logo fiquem pelo caminho, não causando assim nenhum impacto na trama principal. Os poucos que se salvam são Cristoph Waltz (“A Lenda de Tarzan”) como Dusan, em papel divertido, que rende ótimas cenas, e Hong Chao (“Vício Inerente”), que embora entregue uma atuação apaixonante como Ngoc Lan Tran, é uma personagem bastante estereotipada.
À medida que o filme se encaminha para o final, ele passa a se afastar da proposta descontraída e começa a pender para um viés emocional muito raso e previsível. A questão ambiental, antes usada como desculpa para o encolhimento, agora toma uma proporção gigantesca na história, diminuindo até a participação dos protagonistas, que passam a ser muito passivos até o fim da trama. Até mesmo Ngoc Lan, antes o único aspecto risível entre os dois últimos atos, enviesa para um tom melodramático que até condiz com sua personagem, mas só funciona para quem realmente embarcou na proposta de reflexão do diretor.
Com uma premissa brilhante e bastante original, “Pequena Grande Vida” é praticamente impecável no aspecto técnico. Porém, apenas o conceito não é a garantia de um bom filme, sendo responsabilidade do roteiro encontrar uma forma de mesclar uma trama interessante à ideia inicial. Infelizmente, embora tenha todo o mérito de passar uma mensagem importante de preservação e propósito de vida, Payne acabou sabotando a si mesmo com sua alegoria.