Com uma mensagem poderosa e atual, o longa se perde na ambição de juntar muitas histórias em uma só, evidenciando um sério problema de foco.
O esporte é capaz de proporcionar diversos momentos únicos, seja em emoção, seja em diversão, ou em representatividade. Um dos acontecimentos mais marcantes do desporto, que uniu todas essas características, foi a Batalha dos Sexos, partida onde dois tenistas de sexos opostos se enfrentavam amistosamente. Dentre as várias edições deste evento, o confronto mais memorável foi, sem dúvidas, entre Bobby Riggs e Billie Jean King, em 1973. O longa “A Guerra dos Sexos” se propõe a contar a história desse evento de forma suave e divertida, sem esquecer de toda a carga social por trás dele. Porém, ao perder constantemente o foco de qual trama quer abordar, o filme deixa apenas uma sensação de que poderia ter sido bem melhor.
A partida que dá título ao longa é apenas o clímax da história, que se inicia mostrando a trajetória de sucesso de Billie Jean e como ela foi importante para acabar com a disparidade no pagamento e na distribuição de prêmios entre tenistas homens e mulheres, reflexo da realidade de toda a sociedade daquela época. Os diretores Jonathan Dayton e Valerie Faris (“Pequena Miss Sunshine”) aproveitaram a dimensão deste evento para fazer um filme mais atual do que nunca. A relação entre a personagem interpretada por Emma Stone (“La La Land: Cantando Estações”) e as demais tenistas é bonita de se ver, mostrando a importância da sororidade e como ela segue sendo necessária até os dias de hoje.
Esta mensagem, passada de um jeito agradável de assistir, poderia facilmente ser o mote principal da obra. O problema está em todas as outras subtramas colocadas a seguir, gerando um desvio de foco gritante na história. A descoberta amorosa de Billie Jean ao se relacionar com sua cabeleireira Marilyn (Andrea Riseborough, “Animais Noturnos”) rende ótimas cenas e revela um potencial para um filme apenas sobre isso. Contudo, dentro deste longa, a relação não flui no mesmo ritmo das demais sequências e parece bastante deslocada da trama principal. Tanto que, quando o enredo decide novamente focar na mensagem de igualdade, a mudança de tom é bastante abrupta, deixando a obra sem uniformidade.
Já Bobby Riggs, embora interpretado brilhantemente por Steve Carell (“A Grande Aposta”), é apresentado e desenvolvido de forma muito apressada, com sua vida pessoal e seus problemas conjugais sendo praticamente jogados na tela, além de se falar muito pouco sobre sua história pregressa. Várias tomadas focadas no personagem parecem não levar a história a lugar algum, desconectadas da trama com Billie Jean e tentando forçar um desenvolvimento que se revela inútil no decorrer da obra. Apesar disso, ele traz toda a comicidade necessária para deixar o filme leve e fácil de digerir, mesmo quando diz ou faz coisas tão absurdas que chegam a gerar dúvidas sobre a veracidade desses acontecimentos. Felizmente, muito do que é mostrado no longa possui registros imagéticos, comprovando a excentricidade do tenista.
Aliás, não só os eventos em geral, mas toda a ambientação dos anos 1970 é extremamente fiel e realista. O tom alegre, os equipamentos, a presença massiva do cigarro na sociedade… tudo foi pensado para ser o mais autêntico possível. O fatídico confronto também é mostrado de forma primorosa, dando a sensação de uma partida transmitida naquela época, alternando com a visão dos presentes no estádio e criando uma atmosfera emocionante.
Mesmo com o longa sendo obviamente focado em Billie Jean e Bobby, o descaso com os demais coadjuvantes incomoda muito. O marido de Billie, Larry King (Austin Stowell, “Colossal”), que poderia trazer toda a profundidade necessária para o relacionamento homoafetivo da tenista, é extremamente raso, não acrescentando nada além de conflitos bobos, como na primeira vez em que aparecem juntos. Todas as outras tenistas mostradas tiveram sua importância diluída em função do protagonismo de Billie para a história, o que seria compreensível se a relação entre elas não fosse tão gostosa de se ver no primeiro ato e quase totalmente esquecida no decorrer do longa. Já Jack Kramer (Bill Pullman, “Independence Day: O Ressurgimento”), presidente da associação masculina de tenistas, aparece apenas para ser a representação do mal na história, quase como um vilão de desenho animado. A exceção, claro, fica por conta de Marilyn, devido ao relacionamento mais íntimo com a personagem principal.
“A Guerra dos Sexos” abordou um evento memorável, especialmente contra a desigualdade entre homens e mulheres. Porém, ao tentar condensar muitas outras tramas de potencial relevância, o longa não consegue se aprofundar bem em nenhuma delas, além de constantemente desviar o foco dos espectadores. Embora o carisma do elenco, a beleza da história real e a força da mensagem reduzam as falhas, o sentimento que fica é de que a obra poderia ser muito mais impactante, especialmente no momento em que a sociedade atual se encontra.