Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 27 de novembro de 2017

6 Dias (2017): Nem sempre a realidade funciona no cinema

Eventos como os de "6 Dias" são frequentes no cinema. É uma situação complicada, envolvendo vidas de civis e decisões do alto escalão da política. Mas alguns casos apenas não são devidamente bem apresentados no cinema.

Não raros são os filmes que nascem de acontecimentos reais. Mesmo desconsiderando cinebiografias, eventos políticos, religiosos ou culturais são tão frequentemente retratados no cinema, que muitas vezes o público nem imagina que tal história tenha de fato acontecido. Porém se engana quem pensa que retratar essas histórias no cinema sempre funciona. O que não diminui a importância (ou relevância) do ocorrido.

O longa “6 Dias”, dirigido por Toa Fraser (“The Dead Lands”) é um desses casos que a realidade não funcionou muito bem no cinema. Na trama, um grupo separatista árabe invade a embaixada iraniana em Londres pedindo a libertação de 91 companheiros presos no Irã. Para lidar com a situação, o inspetor chefe da polícia britânica e membro da unidade de negociações, Max Vernon (Mark Strong, “Kingsman: O Círculo Dourado”), é chamado para convencer os terroristas a não executarem nenhum dos reféns. Ao mesmo tempo um grupo de elite do exército britânico se prepara para invadir o local.

Há uma preocupação inicial em estabelecer algumas regras a partir de depoimentos reais. A invasão à embaixada ocorre um ano após Margaret Thatcher tornar-se primeira ministra. As imagens que abrem o filme apresentam o posicionamento de Thatcher com relação ao terrorismo. Também é apresentado uma ação de um grupo de elite no Estados Unidos, numa situação semelhante, mas com um final trágico por erro estratégico. Ambas as informações têm peso no filme, pois afetam diretamente as decisões do negociador e do grupo militar. Dessa forma, a abertura, além de reforçar a ambientação e o realismo, ganha tempo no desenvolvimento que virá a seguir.

O filme tem um início dinâmico e sem muitas enrolações. São apresentados os protagonistas envolvidos nessa situação (os terroristas, o negociador, a jornalista e o grupo especial) de forma muito rápida, mas que, graças a eficiente montagem, explicam muito bem quem é quem e qual o papel dessas pessoas nos eventos. Falta porém o desenvolvimento de alguns. Em especial para a jornalista da BBC, Kate Adie (Abbie Cornish, “Tempestade: Planeta em Fúria”), cujo envolvimento é reforçado ao final, mas durante o filme pouco demonstra sua finalidade. Ela parece ter sido escolhida ao acaso pelo diretor para ganhar destaque entre os demais jornalistas.

Há também uma indefinição no que o filme irá abordar. Por ter vários envolvidos, os eventos entregam diversos núcleos, porém nenhum é devidamente desenvolvido. Ao tentar mostrar todos os lados, o roteiro perde a chance de desenvolver algum vínculo, exceto por Mark Strong. Se a montagem consegue ser dinâmica e funcional ao longo do primeiro ato, nos seguintes ela é mal executada, mudando entre os dias de forma ora confusa, ora apressada. Assim, o filme se preocupa mais em abordar o que acontece do lado de fora da embaixada do que do lado de dentro. Se por um lado isso reforça as difíceis decisões que cada um dos envolvidos precisa tomar, por outro falta uma noção de urgência com a situação interna. Quando o filme finalmente decide criar uma situação de maior tensão entre os reféns e os terroristas, a resolução acaba sendo rápida demais.

Cabe apenas o devido destaque à participação de Mark Strong como o negociador. O ator consegue entregar o conflito pessoal de alguém que procura resolver a situação com o menor número possível de mortes de ambos os lados. No momento derradeiro, no último contato com os terroristas – e tendo conhecimento das consequências do que está fazendo – Strong consegue mudar tanto a expressão quanto o tom de vocês, numa das melhores sequências do filme.

Dessa forma, “6 Dias” é um filme que não consegue entregar a verdadeira urgência dos acontecimentos. Seja pela transição entre um dia e outro, seja pela precariedade do roteiro com alguns personagens, falta tensão ao filme. Há um ou outro momento que se destacam, mas na conclusão, é possível se perguntar se está era realmente uma boa história para se adaptar.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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