Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Bom Comportamento (2017): intenso, cru e impecável

Bons atores podem conseguir se destacar num filme ruim. Mas, mesmo quando o início da carreira é marcado por papeis e atuações fracas, quando esses atores encontram um projeto que une um bom roteiro com uma boa direção, vemos uma espécie de renascimento. Ao longo dos anos já vimos diversos atores que passaram por essa situação, Robert Pattinson parece ser o mais novo nome da lista.

Bons filmes não precisam reinventar a roda. Não é necessário grandes orçamentos, nem cenas com sequências enormes, inúmeros elementos e personagens interagindo. Não que grandes filmes não possam ser bons. É importante reconhecer projetos menores que conseguem entregar bons filmes. Esse é o caso de “Bom Comportamento”, filme dirigido pelos irmãos Benny e Josh Safdie (“Amor, Drogas e Nova York”) e com Robert Pattinson (“Z: A Cidade Perdida”) no papel principal.

A trama é tão simples quanto a execução. Connie Nikas (Pattinson), tentando buscar uma vida nova com seu irmão Nick (Benny Safdie) decide assaltar um banco. Mesmo com a ação bem executada, Nick acaba preso, o que faz com que Connie busque maneiras para conseguir dinheiro, pagar a fiança do irmão e seguir com o sonho de uma vida nova.

Os irmãos Safdie são ainda novatos no trabalho de longa metragens para o cinema. Porém isso, de modo algum, significa que eles não sabem o que estão fazendo. Pelo contrário, cada cena tem uma direção cuidadosa, precisa e certeira. Isso fica mais evidente quando novos personagens surgem na trama, contando com um tempo de tela que não excede o necessário, seja para fazer a trama seguir, seja para aprofundar ainda mais o personagem de Pattinson.  Sem excesso, mas sobretudo com tranquilidade, os irmãos entregam um filme que sem pressa e com excelentes sequências, principalmente nos momentos de maior tensão, como a cena em que Connie vai resgatar o irmão no hospital.

Quem brilha (com o perdão do trocadilho) é Robert Pattinson. Em seu trabalho mais consistente, o ator entrega um personagem que oscila entre a frieza e tranquilidade nos momentos que deve tomar uma atitude para resolver problemas, e a confusão quando percebe que seus planos não saem como o esperado. Pattinson vai bem, mas não se impõe gratuitamente. Seu personagem não é grandioso (ao contrário, é um ladrão comum) e não há uma tentativa de torná-lo maior do que o roteiro pede do ator. Mas é nos detalhes que vemos o destaque. No olhar e nos trejeitos criados.

A ele soma-se a discreta, porém profunda, atuação de Benny Safdie como Nick. O diretor tem uma participação pontual no começo e no final do longa e um curto trecho no meio. Ele convence ao entregar uma pessoa com algum tipo de deficiência mental. Não há estereótipos nem grosserias, apenas uma pessoa com uma limitação. E a forma como Nick é utilizado no filme prova o quanto os irmãos Safdie estavam conscientes do roteiro durante a produção.

O roteiro é o alicerce do filme. Escrito por Josh Safdie em parceria com Ronald Bronstein (que vem trabalhando com os irmãos Safdie desde “Go Get Some Rosemary”), a trama é simples. A qualidade do filme ganha destaque por conta da simplicidade. Cada conflito criado tem seu próprio tempo para encontrar uma resolução e por vezes essa resolução não é definitiva. Por se tratar de um filme que consegue emular tão bem a realidade, não busca conclusões para todos os problemas. Afinal, constantemente enfrentamos situações que não possuem um desfecho conclusivo. Elas podem ser (ou se tornar) consequências de outras situações. Nessa bola de neve que só cresce, o roteiro brinca com maestria.

Ainda existe a interessante trilha que, assim como a fotografia, busca influência de thrillers dos anos 80. O neon brilhando por todos os lugares. A música com sintetizadores que emitem ruídos intermináveis. Tudo isso é muito bem utilizado em função da narrativa. É claro que não é essencial, sendo, provavelmente, uma escolha inspirada mais em influência do que como um elemento necessário para se contar a história. Mas funciona e muito bem. E ao não buscar se destacar, cria uma atmosfera muito particular, quase como uma identidade.

Bom Comportamento” é um desses filmes que chegam de forma discreta e acabam entregando um excelente conteúdo. É contido, com boas cenas e com um final incômodo, mas verdadeiro. O trabalho da direção em compreender o tamanho que a trama possui e evitar exageros, torna-se um mérito que merece destaque. Essa direção, somada ao excelente desempenho dos atores, consegue criar um filme intenso e muito bem composto.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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