Atores empenhados não salvam uma trama prolixa e uma direção inconsistente, resultando em apenas mais um filme esperto sobre a caça às drogas.
Depois de mais uma missão disfarçado onde é quase incinerado por uma pane na escuta escondida sob a roupa, o agente do departamento de segurança americano Robert Mazur (Bryan Cranston) considera aposentar-se, mas um novo trabalho desperta seu interesse. Conversando com sua tia (Olympia Dukakis), recebe o conselho: “Se vai continuar nisso, não seja um zé-ninguém, seja um zé-alguém!”.
Assim, o agente decide encarnar o papel de Bob Musella e infiltrar-se no perigoso esquema internacional de lavagem de dinheiro, a fim de desvendar uma trama de tráfico de drogas que chega, no topo, ao cartel de Medellín liderado por Pablo Escobar. A trama policialesca já conhecida dos espectadores da série “Narcos” ganha novos contornos com o roteiro de Ellen Sue Brown, baseada no livro do próprio Mazur. Desta vez, o foco recai sobre essa figura corajosa que moveu montanhas para viabilizar uma operação muito maior do que a estrutura policial americana poderia montar, além de arriscar-se ao máximo em meio a figuras não apenas perigosas, mas completamente loucas.
Decepciona-se, porém, quem espera um filme sobre o cartel de Medellín ou a mítica figura de ‘don’ Pablo, cujo nome é citado pela primeira vez apenas aos quarenta minutos de filme. Deste modo, sua figura é mais um espectro que ronda toda a história e o protagonista, com um momento de exceção, circula apenas entre seus intermediários (igualmente perigosos). Desse modo, o título original (“The Infiltrator”, o infiltrado) da obra é mais honesto que sua tradução para o português.
Dirigindo apenas seu quarto longa metragem para o cinema, o diretor Brad Furman mostra suas limitações e vícios que pode tentar abandonar daqui para frente. A velha colagem de imagens de arquivo, recortes jornalísticos e mapas estilizados preenchem a tela para situar o espectador nas mudanças espaciais de uma trama global, porém menos eficiente do que outros filmes já apresentaram. Seu maior defeito, porém, é ter no elenco nomes como Cranston e Diane Krueger (como a agente Kathy) e não valorizar seus potenciais dramáticos, desperdiçando os momentos mais tensos da trama com takes mal feitos, quando poderia, para seguir seu tradicionalismo, apostar em clássicos e bem focados closes faciais de seus atores. Um exemplo dessa falta de tato com o manejo da câmera é a cena do aniversário de casamento de Mazur, quando o agente encontra um amigo traficante e, tentando disfarçar e proteger a esposa, tem um rompante de raiva com o garçom do restaurante. Uma grande cena de Cranston, que lembra seus melhores momentos como Walter White em “Breaking Bad”, é desperdiçada por enquadramentos vazios e uma montagem sem propósito.
Tramas sobre o tráfico de drogas parecem estar em voga no audiovisual atual, especialmente diante do distanciamento histórico da tensa década de 80, de política proibicionista norte-americana e surto de cocaína emanando da América do Sul. Ainda que atraia o interesse o público por suas histórias espertas, cheias de viradas, falsificações e certo glamour do crime, muitos desses filmes poucos se diferenciam, e infelizmente “Conexão Escobar” é um desses.
O ponto positivo da abordagem aqui apresentada é o de acrescentar nuances aos criminosos latinos que superam (um pouco) a representação estereotipada de outras produções. Existem personagens mais glamourosos e complexos do que apenas o velho provinciano latino suado (ainda que aqui ainda existem vários tipos assim), dando ao grupos ares mais próximos aos excêntricos mafiosos italianos de “Família Soprano” e “Os Bons Companheiros”. O melhor entre eles talvez seja a personificação que Yul Vázquez faz de Javier Ospina, um traficante sexualmente dúbio que só se veste de branco e é um dos poucos personagens a ter um arco com começo, meio e fim. Pela atuação, mais do que qualquer outro do elenco, o ator merecia uma indicação na temporada de prêmios, mas acho difícil para um filme que tem tudo para passar despercebido na memória de críticos e espectadores.
Vale também destacar o trabalho John Leguizamo, ator favorito do diretor, presente em três de seus quatro filmes até aqui, que assume a loucura de seu personagem, um policial infiltrado que vai longe demais no disfarce. Ao lado de um monstro como Cranston, que mostra fôlego depois de seu papel memorável na televisão, o ator não passa vergonha e a ele estão reservados alguns dos melhores momentos da narrativa.
Assim, com uma história que oferece pouca novidade e que poderia até mesmo ser enxugada em prol do ritmo, indo direto ao ponto do que pretende contar, “Conexão Escobar” é uma decepção para quem esperava um filme memorável, como a história do cartel de Medellín demanda. E embora muitos talvez digam que as comparações são injustas, entre essa narrativa e “Narcos”, a série de Padilha fica com minha indubitável preferência.