Em mais uma tentativa da 20th Century Fox em emplacar uma franquia Young Adult, o diretor entrega um filme até visualmente interessante, mas sem ritmo ou carisma.
Em tese, Tim Burton era uma ótima escolha para levar “O Lar das Crianças Peculiares” para o cinema. Seu estilo visual único com certeza afastaria a comparação entre a adaptação do livro de Ransom Riggs e a franquia “X-Men”, a roteirista Jane Goldman tem experiência com esse tipo de material e faixa etária (vide “Kingsman – Serviço Secreto”, “Kick-Ass” e “Stardust – O Mistério da Estrela”) e o elenco – com alguns colaboradores habituais de Burton – contem nomes fortes encabeçados por Eva Green e Terence Stamp.
Mesmo assim, o filme simplesmente não funciona, para desespero da 20th Century Fox que tenta há anos emplacar uma série Young Adult nos cinemas, tendo fracassado com “Eragon”, “Percy Jackson” e com o terceiro “As Crônicas de Nárnia”. Mesmo tendo (em teoria) o time certo e um bom material original, o longa falha em capturar a atenção do público.
Asa Butterfield encarna o protagonista da história, Jake. Após a morte de seu avô (Stamp), Abe, o rapaz segue algumas pistas que o levam para o Lar de Crianças onde Abe passou sua infância. Lá, ele descobre não apenas que as histórias que seu avô contava sobre as crianças com dons “peculiares” eram verdade, como também que as crianças e a diretora do lugar, a Sra. Peregrine (Green), estão em perigo, caçados por criaturas lideradas pelo maligno Sr. Barron (Samuel L. Jackson).
A ilha onde boa parte da produção se passa e o próprio lar em si são ótimas criações do experiente Gavin Bocquet (que recentemente brilhou em “Warcraft – O Primeiro Encontro de Dois Mundos”), enquanto Coleen Atwood, em mais uma colaboração com Tim Burton, produziu belos figurinos que representam muito bem a personalidade de cada um dos peculiares. Mas não basta o diretor jogar uma estilosa Eva Green e um design de produção interessante na concepção visual das crianças e criaturas para cativar o público. A trama tem de fazer algum sentido, bem como apresentar aos heróis desafios interessantes.
A apresentação do mistério envolvendo o avô de Jake e as crianças peculiares do título, bem como a revelação destas e da natureza de seu lar funciona muito bem. O problema é que, após o protagonista descobrir seu “destino”, a história desaba, especialmente por não seguir as próprias regras e contar meramente com a estupidez de seus próprios personagens para avançar a trama. Até mesmo a relação entre Jake e as crianças é desenvolvida aos solavancos e clichês, só assim explicando seu romance a jato com Emma (Ella Purnell) e especialmente sua rivalidade instantânea com Enoch (Finlay MacMillan), que só pode ser descrita como “nunca te vi, sempre te odiei”.
Butterfield surge completamente perdido em cena, sem saber exatamente em que direção levar o seu Jake, tendo pouquíssima química com o restante do elenco. Eva Green, embora seja interessante o modo com que lida com a rotina dos dias no seu “lar”, faz basicamente uma versão light de sua Vanessa Ives de “Penny Dreadful” e Samuel L. Jackson faz… uma caricatura de vilão, remetendo, infelizmente para o Octopus de “The Spirit – O Filme”, embora não tão escatológico. O que se sai melhor dos adultos é Terence Stamp, que faz do seu Abe, ao mesmo tempo, amoroso e misterioso (curiosamente, o personagem funciona melhor quando lida com a versão mais jovem de seu neto).
O desperdício de bons atores como Allison Janey, Chris O’Dowd e especialmente Judi Dench é quase criminoso, só não o sendo porque se há crime neste filme está em sua esquisitíssima montagem e na péssima trilha de Matthew Margeson e Michael Higham, que consegue estragar o que deveria ter sido uma das melhores cenas do filme, na qual Burton faz uma ótima homenagem ao lendário Ray Harryhousen.
Contando com um clímax terrível que peca pela burrice dos personagens e por fechar mal e porcamente a trama, “O Lar das Crianças Peculiares” se revela um longa quase que desprovido de charme e carisma ou qualquer senso de real de aventura e divertimento. Bom, ao menos os créditos são imaginativos e tem uma música da Florence Welch.