Narratologicamente frágil e espantosamente anacrônico, agradará a quem se enquadra na condição de fã, mas não a um espectador com mais de 13 anos de idade.
Elaborar um roteiro é uma tarefa bastante árdua: argumento criativo e original, delinear um enredo, moldar a sequência narrativa e formatação (distinta dos livros tradicionais) – e assim por diante. O trabalho de Ramón Salazar em “Tini – Depois de Violetta” poderia ter sido feito por uma criança, tamanha a sua simplicidade. Narratologicamente frágil e espantosamente anacrônico, o longa é (provavelmente) satisfatório para as/os fãs – e apenas para elas/eles.
Baseada na série do Disney Channel (logo, inserida num contexto maior e com fãs já engajados), a película relata um período sabático da protagonista Violetta (Martina Stoessel), que, cansada da vida atribulada de celebridade e em crise no relacionamento com León (Jorge Blanco), aceita um convite para passar um tempo na Itália. Lá, descobre fatos até então desconhecidos sobre o seu passado, além de fazer novos amigos e conhecer Caio (Adrián Salzedo), que lhe desperta novas emoções.
A direção de Juan Pablo Buscarini abraça símbolos retrógrados ao literalmente colocar o herói em cima de um cavalo branco, cavalgando em busca da mocinha. A paradigmática cena de rompimento do ciclo de bloqueio criativo com o piano sendo carregado numa subida e a câmera lenta antes do ápice indicam a limitação técnica de Buscarini – contudo, os efeitos visuais no final são aceitáveis. Também no figurino o trabalho é conservador, com uma protagonista que se veste quase que como uma freira (em especial, na cena do jantar na casa de Caio). É bem verdade que o vestuário se altera drasticamente no fim, metáfora da libertação, mas não é o que prevalece. Até o penteado do elenco não passa impune: não bastasse o visual despojado de Caio em contraposição eloquente ao “mauricinho” León, há um truque (de mágica, com toda certeza) com o cabelo de Violetta no final, arrumado em segundos, que certamente as mulheres gostariam de aprender. A trilha sonora? Um pop adolescente ordinário. A catarse das/dos fãs pode ser atingida na cena final (assim como nas sequências de Caio sem camisa), mas nada que encante um espectador com mais de 13 anos de idade.
A dublagem é pavorosa, só não tanto quanto o texto de Salazar. Pérolas como “sempre gostei de dançar, mas, desde que meu pai morreu, eu tive de trabalhar” – ou seja, dançar não é trabalhar – são constantes, e a ousadia de citar que “o essencial é invisível aos olhos” fez Saint-Exupéry revirar-se no túmulo. Os furos de roteiro (qual a razão da falta de inspiração de Violetta? Quem é Ludmilla? O que realmente houve com a mãe da protagonista?) convivem com a infantilidade do plot ao não ter antagonismo concreto. O maniqueísmo seria o esperado, todavia, partir de um simples mal-entendido, sem nenhuma figura vilanesca de destaque, é o ápice da ingenuidade. Com afinco, pode-se arrancar uma crítica aos paparazzis, bastante superficial, ainda no primeiro ato.
O elenco talvez seja, no máximo, esforçado. O histrionismo de Mercedes Lambre é de causar raiva, ainda que compatível com Ludmilla, personagem com, no mínimo, um défice de inteligência (comprovado quando ela fala com animais e objetos inanimados). A interpretação blasé de Stoessel dá a Violetta o contorno oitocentista atribuído à protagonista: recatada, carece sempre de uma figura masculina como amparo emocional, inclusive na tomada de decisões. Sua vulnerabilidade reside até mesmo nas escolhas: seu pai diz que ela é “adulta e já pode escolher”, mas não surpreende ela optar justamente pelo que ele aponta como ideal. Em tempos de Elsa (Frozen) e Merida (Valente), a Disney apresenta uma Violetta, no mínimo, ultrapassada.
Porém, não se pode negar que “Tini: Depois de Violetta” é um retrato de uma visão de mundo, ainda que antiquada. Não chega a ser ofensiva, mas apenas frustrante. Há um elemento que se salva: os belos e charmosos cenários italianos.