De volta ao gênero que o consagrou, James Wan mostra porque é considerado um dos maiores nomes do terror contemporâneo, com mais um filme aterrorizante.
Desde que lançou “Jogos Mortais” (2004), filme que deu origem a maior franquia de terror da década passada, o malaio James Wan começou a ser visto pela indústria como o nome pop de maior potencial do gênero. No entanto, mesmo fazendo longas interessantes do estilo como “Sobrenatural” (2010), foi somente com o sucesso estrondoso de “Invocação do Mal” (2013) que o cineasta passou a ser reconhecido pelo público em geral e ganhou uma legião de fãs. Wan que já ultrapassou a barreira de estilo fazendo o filme de ação mais lucrativo e elogiado dos últimos anos, “Velozes & Furiosos 7” (2015). Fato que não afastou o autor da vertente que o consagrou.
Poucos sabem, mas a sequência “Invocação do Mal 2” começou a ser realizada antes mesmo do lançamento mundial do original, algo bastante incomum em produções do tipo. Justamente pelos realizadores apostarem ou acreditarem no poder de alcance do projeto. E levando em conta a estrutura fílmica seguida, adaptar casos vividos pelo famoso casal Warren (investigadores de fenômenos paranormais), era mesmo de se imaginar que colocando essas histórias nas mãos de um bom diretor poderia gerar não apenas uma continuação como também uma nova franquia.
Novamente com James Wan no comando criativo e a dupla Chad e Carey Hayes no roteiro, o longa pincela inicialmente o evento mais conhecido e discutido presenciado pelos Warren, o massacre em Amityville – conto este que por sinal já foi adaptado duas vezes para o cinema, ambos chamados de “Horror em Amityville” (1979 e 2005). Mas o motivo do episódio estar presente no filme não é gratuito, existe uma ligação direta com o caso que será abordado como o plot central da fita, chamado popularmente de Enfield Poltergeist.
A trama se passa na Inglaterra, sete anos após os eventos do primeiro filme, quando Lorraine (Vera Farmiga) e Ed Warren (Patrick Wilson) vão até uma pequena cidade britânica ajudar uma família que está sendo atormentada por uma manifestação sobrenatural despertada através de uma das meninas da casa. Ao mesmo tempo, Lorraine tem visões e pressentimentos envolvendo sua filha e o próprio Ed, o que a deixa emocionalmente abalada para lidar com novos trabalhos. Principalmente quando toda investigação do caso aponta para uma fraude.
Inserindo então os personagens em meio a esses e outros dilemas, acompanhamos o momento conflituoso do casal e principalmente o drama vivido pela família inglesa destacada. Algo de certo modo semelhante ao que vemos na história anterior, porém, ao longo da exibição, temos a percepção que não estamos diante daquilo que vimos em outrora, principalmente no que se refere à linguagem narrativa. O primeiro longa apostava em um estilo mais sutil e elegante, a condução de cena marchava lentamente e o principal elemento utilizado para causar medo era a atmosfera soturna e alguns ruídos característicos das obras do diretor.
Já em “Invocação do Mal 2” tudo desde o início parece muito claro e gráfico. A ideia é passada de maneira mais “gritada”. O uso de jumpscares – algo muito criticado no terror atual – é constante e a aparição dos fenômenos sobrenaturais não é medida, surgindo na presença de policiais ou mesmo na frente das câmeras. Ou seja, temos uma produção tão genérica quanto tantas outras contemporâneas do estilo, certo? Errado! O caso aqui é exatamente oposto e, ao contrário do que se pode pensar, tal empreitada constata ainda mais o total domínio de James Wan no gênero em questão.
Utilizando artifícios que estariam desgastados e ferramentas relegadas por alguns especialistas do gênero, Wan desconstrói essa vertente do estilo que é olhada de lado e consegue, de maneira impressionante, entregar um filme ainda mais assustador que o original. A forma que cria a tensão das cenas até chegar num clímax apavorante é de uma eficiência admirável, bem como o modo que desenvolve seus personagens, os aprofundando bem e fazendo com que o espectador compre o drama vivido por cada um. Seu sempre parceiro de trilhas sonoras, Joseph Bishara tem grande função na construção desse ambiente sombrio, pois seus temas são tristes e até um pouco nostálgicos.
Contando também com um roteiro heterogêneo e cheio de diálogos funcionais, a trama que poderia soar clichê ganha um contexto genuíno por conhecermos de perto a personalidade da mãe e suas filhas – aliás, todo elenco mirim está excelente e demonstra uma enorme entrega. O que falar então da abordagem empregada no casal Warren, onde notamos a cumplicidade total e chegamos até sentir o amor e o respeito que nutrem um pelo outro. Obviamente muito disso se deve as gigantes performances de Patrick Wilson e Vera Farmiga, que dominam em tela e conseguem transmitir a credibilidade necessária – Wilson, em particular, tem uma cena memorável quando junto à família canta Can’t Help Falling In Love, de Elvis Presley.
Provavelmente teremos uma terceira parte e acredito que há material até para mais que isso, no entanto o maior temor dos fãs é que James Wan deixe de lado o projeto, assim como aconteceu em “Sobrenatural: A Origem” (2015), onde o roteirista original assumiu a direção e ainda assim não conseguiu nem de longe o mesmo resultado. Fica então nossa torcida para que Wan encerre pelo menos a trilogia abordando com profundidade os eventos de Amityville. Caso não aconteça, temos em “Invocação do Mal 2” outro bom filme contemporâneo de horror, feito por um cineasta apaixonado pelo gênero e que mesmo se aventurando em outros trabalhos, não vai tardar em voltar.