Apesar de ser realmente o exemplar mais fraco desta segunda trilogia da equipe mutante nos cinemas, o longa também é, paradoxalmente, o mais divertido da série, graças ao seu renovado rol de heróis.
A franquia “X-Men” certamente é uma das maiores do portfólio da Fox, já perdurando 16 anos e, com este “X-Men – Apocalipse”, entrando em seu nono episódio cinematográfico. Não é segredo para ninguém que o primeiro filme da série, lá em 2000, foi um dos pilares sobre os quais o subgênero de filmes baseados em quadrinhos se ergueram. No entanto, àquela época, o diretor Bryan Singer fez um esforço consciente para não abraçar demais as origens do material.
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Aquele longa e os capítulos que o sucederam eram mais voltados para ficção científica, com pitadas de super-heróis aqui e ali, alcançando variados graus de sucesso, tendo seus picos nos ótimos “X-Men 2” (dirigido pelo próprio Singer) e “X-Men – Primeira Classe” (comandado por Matthew Vaughn). Em um mundo pós-Marvel Studios, no entanto, Singer trouxe o novo filme da franquia mais para o superheróico fantástico, deixando um pouco de lado o lado sci-fi mais sério e o foco no preconceito sofrido pelos mutantes.
O roteiro de Simon Kinberg (“X-Men – Dias de um Futuro Esquecido”) traz o primeiro grande supervilão da saga, Apocalipse (Oscar Isaac), um mutante com mais de cinco mil anos de idade que ressurge nos extravagantes anos 1980 com o objetivo de conquistar o mundo, recrutando para isso seguidores como a jovem Tempestade (Alexandra Shipp), o furioso Anjo (Ben Hardy), a guerreira Psylocke (Olivia Munn) e Magneto (Michael Fassbender) que vinha tentando viver uma existência pacífica mas cai no discurso do vilão após uma nova tragédia.
Cabe então ao Professor Xavier (James McAvoy), Fera (Nicholas Hoult) e Mística (Jennifer Lawrence) liderarem uma leva de jovens e inexperientes X-Men para salvarem o mundo desta ameaça. Dentre os “novatos” estão Scott “Ciclope” Summers (Tye Sheridan), que recém descobriu seus dons mutantes e é trazido para a Escola Xavier por seu irmão, Alex (Lucas Till), um dos alunos originais; Jean Grey (Sophie Turner) que mesmo sem ter pleno controle sobre seus dons de telepatia e telecinese já se mostra extremamente poderosa; Noturno (Kodi Smit-McPhee), que fora resgatado por Mística de arenas ilegais de luta na Alemanha Oriental; e Peter Maximoff (Evan Peters), o jovem velocista que havia ajudado os X-Men na aventura anterior e agora ressurge buscando respostas sobre suas origens.
Um ponto positivo é que cada um dos heróis possui um arco próprio, embora alguns se mostrem extremamente batidos, caso de Mística que, além de ser vivida com certa má vontade por Jennifer Lawrence, tem uma trajetória tão parecida com a de Katniss aqui que Suzanne Collins poderia processar os realizadores do longa. Mas todos os plots envolvendo os jovens X-Men são bem explorados, mesmo com ressalvas como uma morte inútil e uma não-resolução forçada para deixar um gancho para eventual continuação.
O mais chocante é que, por mais que os realizadores deixem claro seu desejo de ir por um caminho mais “super” neste filme, são aqueles elementos que tornaram a franquia única que fazem o filme pegar no tranco, justamente a interação dos mutantes entre si e com o mundo onde estão inseridos.
O roteiro de Kinberg e a própria direção de Singer tentam forçar a ameaça de Apocalipse e seus Cavaleiros, mas falham miseravelmente em estabelecer o vilão como uma entidade a ser temida, prendendo o talentoso Oscar Isaac em vazios discursos padrões – além de soterrado em uma maquiagem questionável. O mesmo acontece com Alexandra Shipp, Olivia Munn e Ben Hardy, que basicamente entram mudos e saem calados, para desgosto dos fãs de seus personagens.
Melhor sorte, ao menos em parte, tem Michael Fassbender, cujo Magneto tem um ótimo início no filme mas que se perde totalmente após a tragédia envolvendo sua família. Mesmo sua relação com Peter, que deveria ser um foco para os dois personagens é (não) resolvida de uma maneira frustrante, desperdiçando dois dos melhores atores do elenco. Digo isso porque Evan Peters funciona quase que como uma injeção de adrenalina na produção, com seu Peter trazendo organicamente humor e frescor ao longa, roubando a cena em todas as suas aparições.
Tye Sheridan e especialmente Sophie Turner trazem um novo olhar para Scott e Jean, renovando os personagens clássicos com sucesso. Turner, aliás, tem tudo para ser o grande destaque das vindouras continuações. O Noturno de Kodi Smit-McPhee tem muito em comum com a versão anterior, vivida por Alan Cumming, mas seu visual traz um que meio Michael Jackson que se encaixa com o período da narrativa.
E embora Nicholas Holt tenha pouco a fazer como Fera, é bom ver o crescimento de James McAvoy como Charles Xavier no decorrer dos últimos filmes da série e é gratificante ver que o ator trouxe humanidade ao papel ao deixá-lo mais falível e tangível que sua versão mais madura – vê-lo gaguejando ao reencontrar um antigo amor acrescenta novas camadas ao antes monolítico Professor X.
O fato das set-pieces envolverem figuras cuja face conhecemos e que aparecem como únicas dentro da projeção faz com que o público se envolva muito mais nessas grandes cenas do que em filmes como “Vingadores – Era de Ultron”, que trazia os heróis combatendo soldados padrões completamente desprovidos de personalidade. Por mais que certos personagens sejam mal desenvolvidos e alguns efeitos não sejam perfeitos, o público “sente” mais o impacto das cenas aqui. O combate entre os grupos rivais é plasticamente interessante, a ótima cena de Peter na escola é fantástica (deixando sua participação no capítulo anterior no chinelo), mas o duelo entre Xavier e Apocalipse no Plano Astral frustra pelo leque de possibilidades não exploradas ali.
Ademais, é impossível ignorar uma gigantesca barriga que o filme possui em seu segundo ato, quando o plot principal simplesmente é interrompido para dar lugar a um interlúdio no Lago Alcali que basicamente recicla informações e elementos de “X-Men 2” simplesmente para um fan-service que nem ao menos pôde ser explorado em sua totalidade por conta da classificação indicativa do longa, prejudicando a fluidez de uma história já problemática (sem contar as próprias inconsistências cronológicas da franquia, algo infelizmente transportado dos quadrinhos originais e que diminuem um pouco a “saga”).
Apesar de seus graves problemas, o saldo de “X-Men – Apocalipse” ainda é positivo, mais por seus fatores humanos do que por seus superpoderes, além de ser possivelmente um dos mais divertidos filmes da série, mantendo o interesse do público até o fim.
P.S.: há uma cena pós-créditos que deixa uma ligação para a próxima aventura mutante.