Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 13 de fevereiro de 2016

Brooklyn (2015): como sabemos onde é nosso lar?

Produção caprichada oferece à jovem Saoirse Ronan a chance para brilhar num filme todo seu.

brooklyn-posterTodo ano o Oscar encontra um jeito de incluir em sua seleta lista de concorrentes a Melhor Filme ao menos uma produção vinda da Europa anglo-saxã ou, pelo menos, de língua inglesa. Existe algo na ligação histórica ou nas características mais notáveis desses países, como a elegância, a racionalidade ou o exotismo do sotaque, que parece conquistar os membros da Academia. Neste ano, ao lado de “O Quarto de Jack” (2015) está “Brooklyn”, uma clássica história de “coming of age” (transição da infância à maturidade) adaptada para as telas pelo experiente Nick Hornby.

Colm Tóibin, autor do romance do qual se origina esse roteiro, não esconde os elementos pessoais que inseriu na história, como sua cidade natal de onde também é a protagonista, uma jovem esforçada chamada Ellis, vivida com a competência já conhecida por Saoirse Ronan, indicada ao Oscar pelo papel. Jovem e inexperiente, Ellis decide deixar as limitações da Irlanda e partir para os EUA. Com a ajuda da irmã, com quem tem uma forte ligação, arranja um emprego e uma moradia em Brooklyn, bairro de Nova York. Ao chegar, enfrenta os clássicos desafios da adaptação cultural e saudade de casa, fazendo-nos pensar muitas vezes que ela simplesmente não vai conseguir. A menina, contudo, amadurece, aprendendo a desenvolver suas características interpessoais e enfrentar os desafios da vida independente.

Mesmo sem haver grandes surpresas no roteiro, a condução é tão belamente executada que tampouco nos inquieta a ausência de mais ação. Trata-se de um filme mais monótono e certamente mais sentimental do que muitos outros dessa temporada de prêmios, o que deve afastar certo público, mas graças ao excelente trabalho das equipes de figurino, maquiagem e direção de arte (que também mereciam ter sido lembrados pela Academia), além dos belos enquadramentos do jovem diretor John Crowley, somado à fotografia de Yvés Bélanger, constrói-se uma bem cuidada história, fácil de se acompanhar por quase duas horas.

Como pano de fundo da trajetória de Ellis, está a história das imigrações nos Estados Unidos, especificamente em Nova York e com destaque aos italianos e irlandeses, fundamentais na construção do país. A jovem Ellis, ela mesma, no melhor estilo Blache Dubois, dependendo da solidariedade de estranhos desde quando embarcou num navio para cruzar o Atlântico, completa sua jornada pessoal quando se vê ajudando a outros como ela, da mesma forma como um dia foi ajudada.

Para além de Ellis, a trama segue muito em torno das personagens femininas, embora haja alguns bons papéis masculinos, como o do jovem irlandês interpretado por Domhnall Gleeson (um ator que atualmente parece estar em todo filme que vejo, de “Star Wars VII” a “Ex-Machina”). Desde sua vida na Irlanda, sem a figura paterna, até a casa em que se hospeda no Brooklyn, junto a outras tantas meninas vindas de outros lugares, a protagonista está sempre rodeada por mulheres, todas cheias de sonhos. Assim, a trama de Ellis torna-se mais doce e singela, embora a garota tenha um notável crescimento, muito dependente da habilidade da Saoirse em moldar diferentes facetas de sua personagem.

Ainda que o dilema principal da história demore a acontecer e que tudo se desenrole fácil demais para a jovem Ellis, existe uma poesia no drama de Colm Tóibín que Nick Hornby consegue capturar muito bem. Assim, com elementos melodramáticos funcionando quase sempre na dose certa, “Brooklyn” oferece a uma jovem atriz a chance de brilhar tanto quanto sua adorável personagem.

Vinícius Volcof
@volcof

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