Sem qualquer tipo de abordagem inovadora ou estrutura que fuja do lugar comum, longa diverte pela honestidade que apresenta em não se levar muito a sério e pelo carisma da dupla principal.
O maior erro que um cinéfilo pode cometer, especialmente um crítico, é entrar na sala de cinema com qualquer tipo de expectativa para um filme, seja boa ou ruim. Uma das melhores sensações, entretanto, é sair dela se surpreendendo positivamente. Às vezes por ignorância, outras por não gostar das pessoas envolvidas ou da temática, e em alguns casos por puro preconceito, o fato é que, conscientemente ou inconscientemente, certo ou errado, quase sempre conjecturamos perspectivas para determinado filme. Este fui eu entrando para assistir “Pai em Dose Dupla”.
Adoro o gênero (quem não gosta?), acho Mark Wahlberg um ator competente e o diretor Sean Anders já havia me surpreendido com seu último trabalho (também uma comédia), mas algo, no entanto, não me deixava confiante quanto ao grau de divertimento que iria obter naquela experiência. Quebrei a cara, o que, como um bom cinéfilo, me deixou ainda mais satisfeito do que se tivesse ido com a expectativa de ver o que vi. “Pai em Dose Dupla” é divertidíssimo.
Ok, “divertidíssimo” talvez seja uma palavra muito forte, mas sim, a obra entrega muito mais do que pode aparentar à primeira vista. Aqui, acompanhamos Brad (Will Ferrell), um pacato americano classe média que vive em função de se tornar um bom padrasto para os filhos da sua esposa, Sara (Linda Cardellini). Por não poder gerar filhos e achar que sua vocação sempre foi ser um bom pai e chefe de família, isso se torna o grande objetivo da sua vida. O jogo muda de figura quando o verdadeiro pai (Wahlberg) das crianças, um garotão boa pinta e muscoloso, aparece em cena para reivindicar esta posição, mesmo que de maneira disfarçada.
O ambiente familiar daquelas pessoas vira, portanto, de cabeça para baixo com a chegada de Dusty Mayron. À princípio, Brad tenta lidar bem com a situação, e Dusty também parece querer um relacionamento pacífico, mas, aos poucos, a dinâmica entre ambos vai evoluindo, resultando em uma dupla tão cômica quanto improvável (reeditanto a parceria de “Os Outros Caras“, de 2010). O timing entre os dois é tão bom que, por vezes, você até esquece que está acompanhando uma produção hollywoodiana batida e pouco ousada, feita para agradar o público médio daquele país.
Por que sim, o roteiro, escrito a seis mãos por Sean Anders, Brian Burns e John Morris, não é muito melhor do que o que encontramos em qualquer produção meia boca do gênero em Hollywood. O ritmo é irregular, algumas piadas são meramente físicas, mal encaixadas e não possuem graça nenhuma. Mesmo a estrutura do script não apresenta nada de novo, com seus pontos de virada previsíveis, o amigo do protagonista servindo como “alívio cômico” (que não funciona) e a esposa meramente decorativa, sem qualquer tipo de desenvolvimento mais elaborado e sequer auxiliando a dupla principal como escada para piadas.
À exceção do terceiro ato. No meio termo entre o inovador e o previsível, o fato que é que as soluções que os realizadores encontraram para os conflitos estabelecidos é criativa e bem humorada, e, o mais importante, funciona. Sem se levar muito a sério e coerente com o que foi determinado pelo roteiro até então, a cena clímax é simplesmente hilária, provavelmente o ponto alto do filme, relevando as piadas de mal gosto que foram feitas durante os outros quase 100 minutos de projeção. Aliás, essa é uma dicotomia presente o tempo inteiro; do humor inteligente e non–sense, com o humor físico, pastelão e sem graça.
“Pai em Dose Dupla”, enfim, provavelmente não será o melhor longa de comédia que você verá no ano, mas é uma obra que, muito possivelmente, sairá melhor do que a encomenda para qualquer um que cometa o erro crasso, como eu, de entrar com qualquer tipo de expectativa dentro de uma sala de cinema.