Tendo em mãos uma história mágica e poderosa, o diretor Robert Zemeckis aposta no simples e entrega um filme de trama agridoce e previsível.
Robert Zemeckis é daqueles cineastas que, mesmo cometendo deslizes consecutivos, sempre será encarado com um dos grandes nomes do cinema norte-americano. Isto por ter construído uma carreia brilhante e ter no currículo obras importantes como “De Volta para o Futuro” (1985), “Forrest Gump – O Contador de Histórias” (1994) e “Contato” (1997). Seu olhar para com a sétima arte é tão autentico que por muitas vezes nos soou mágico. Com um estilo arrojado, direto e também artístico conquistou as mais variadas plateias, que vão de cinéfilos fervorosos até os mais inocentes espectadores.
E foi talvez pensando nisso que tenham achado nele o profissional perfeito para comandar a versão ficcional de um dos feitos artísticos mais fascinantes e malucos de um homem. A realização do francês Philippe Petit, um sujeito que, através um cabo de aço e sem proteção, atravessou as Torres Gêmeas, em Nova York, e deixou o mundo pasmo com sua coragem e amor a arte. Esse mesmo caso foi registrado de forma magistral pelo inglês James Marsh, no documentário “O Equilibrista” (2008). Um título sublime que nos transportou para década de setenta e fez com que temêssemos cada passo dado por Petit. Tocante, mágico e poderoso, conquistou inúmeros prêmios, dentre eles o Oscar na categoria de Melhor Documentário.
Tanto o filme de Marsh quanto o de Zemeckis tiveram como fonte de inspiração o livro “To Reach the Clouds” (2002), escrito pelo próprio Philippe Petit, como também foram auxiliados por este. Desse modo, seria difícil pensar que o diretor de “Náufrago” (2000) erraria dessa vez. E é bem verdade que o longa seja eficiente como um todo e que sua narrativa funcione e caminhe de forma orgânica nos três atos. Digamos que ele fez o básico, ou apenas não quis arriscar algo mais ousado. E é nesse conformismo que reside o problema de “A Travessia”, nesta postura que vai de encontro ao que o evento nos transmite.
Um dos maiores incômodos do filme é sua estrutura cafona e preguiçosa, a chamada narração em off, que está mais para fora de campo do que fora de quadro, já que a todo momento vemos o protagonista nos contando, detalhadamente, os acontecimentos da trama. Esta que se mostra absolutamente simplória e formulaica, onde pouco sentimos os desafios abordados. Somente no final a sensação de apreensão chega, como o momento de clímax que se pronuncia desde o início da sessão. No entanto, mesmo com essas adversidades, Zemeckis é hábil por saber construir uma narrativa orgânica e também contar com a competente montagem de Jeremiah O’Driscoll, que em passo acelerado ata uma cena à outra.
Em aspectos estéticos fotográficos o longa não faz feio, Dariusz Wolski, com suas lentes cristalinas, confere um tom vivido à atmosfera aludida e que quando mesclado ao 3D funciona bem. A bola fora aqui fica por conta dos efeitos visuais que soam agressivos e artificiais, tirando muitas vezes o espectador daquele universo – uma cena que envolve uma pomba branca alcança o ápice da pieguice e se potencializa pela terrível realização gráfica. Já a trilha sonora assinada pelo experiente Alan Silvestri é um dos grandes acertos, pois mistura jazz com musica clássica e tem um sutil toque francês.
O elenco não compromete, mesmo não tendo grandes nomes, todos estão conectados com a proposta fílmica. O próprio Joseph Gordon-Levitt, que dá vida a Philippe Petit, consegue segurar o peso da barra com o carisma de sempre. Sua credibilidade não é total devido à pavorosa caracterização da equipe de maquiagem. Uma peruca avermelhada não proporcional ao ator e lentes de contato com um azul intenso fazem em alguns momentos a plateia rir involuntariamente. De modo que “A Travessia” é um filme repleto de altos e baixos e está aquém do potencial que a história oferece, devendo em breve cair no esquecimento.