Mesmo longe de ser a revolução que os dois primeiros filmes da franquia foram, esse novo capítulo (o primeiro de uma proposta trilogia) consegue divertir.
É muito difícil seguir os passos de um clássico. E se há um filme de ação que alcançou tal status foi “O Exterminador do Futuro 2 – O Julgamento Final”, fita lançada em 1991 e parece não ter envelhecido um dia. Daquela época até aqui, a franquia teve mais dois filmes e um seriado para TV, todos sem o envolvimento do criador da saga, James Cameron, e sem chegar perto da qualidade do original e de sua continuação.
Sendo bastante direto, este “O Exterminador do Futuro – Gênesis”, mesmo ignorando os dois últimos filmes e funcionando uma continuação direta da parte 1 e 2 da série, não lambe os coturnos daquelas duas obras-primas da sétima arte. O que não quer dizer que não seja um filme divertido e extremamente respeitoso para com seus irmãos mais velhos.
Com direção de Alan Taylor (do seriado “Game of Thrones” e “Thor – O Mundo Sombrio”) e com roteiro de Laeta Kalogridis (que trabalhou com James Cameron em “Avatar”) e Patrick Lussier (do trash “Fúria Sobre Rodas”), essa nova incursão no mundo das máquinas basicamente cria um novo terceiro capítulo em uma linha temporal alterada, nos moldes de “Star Trek”, funcionando como continuação e reboot ao mesmo tempo.
Na trama, após uma vitória decisiva das forças de John Connor (Jason Clarke) contra a inteligência artificial Skynet, as máquinas enviam rumo ao passado um Exterminador (Arnold Schwarzenegger) para matar a mãe de John, Sarah (Emilia Clarke). Connor então envia seu amigo – e pai – Kyle Reese (Jai Courtney) para proteger sua mãe, que seria uma jovem frágil e indefesa – tal qual visto em “O Exterminador do Futuro”, de 1984. Mas um evento no futuro altera completamente a linha temporal e agora Sarah se tornou uma guerreira, criada e protegida desde criança por um Exterminador reprogramado, carinhosamente chamado de Papi (Schwarzenegger novamente).
Caçados por um T-1000 (Byung-hun Lee) e pelo Exterminador original, o trio tenta impedir o dia do Julgamento Final e a ascensão da Skynet, mas com tantas mudanças na linha temporal, torna-se difícil saber qual caminho seguir para salvar a humanidade, com tudo se interligando ao misterioso sistema operacional Genesis.
Neste ponto, devo interromper a crítica para avisar ao público para evitar de todo jeito os trailers do filme, pois estes inexplicavelmente entregam a grande surpresa da produção, que surpreendentemente faz sentido e é muito bem trabalhada dentro do longa.
Embora os trailers do segundo filme também tenham feito isso, revelando antecipadamente que o T-800 era o mocinho da aventura, ali se tratava de algo que seria mostrado em dez minutos de projeção. Aqui, trata-se de uma revelação que basicamente ocorre no meio do segundo ato da fita e que dá inicio ao plot central do roteiro. Um verdadeiro ato de sabotagem da campanha de marketing contra o próprio filme!
Entre as produções de 1984/1991 e esta, nota-se a perda do pesado tom niilista de outrora em prol de uma censura mais branda e um público maior. Isso se reflete nas cenas de ação em si, que passam longe de ter o peso das de seus antecessores, por mais que sejam tecnicamente muito bem feitas – embora os efeitos práticos façam muita falta.
Mesmo o futuro apocalíptico mostrado no prólogo é suavizado, mostrando humanos escravizados ao invés de exterminados. Não esperem Exterminadores pisando em crânios aqui.
Neste mesmo sentido, o tenso relacionamento entre Sarah e Kyle dá lugar a uma dinâmica mais leve e menos interessante, com a química entre Emilia Clarke e Jai Courtney só funcionando graças às intervenções de Schwarzenegger, que dá alguma vitalidade a essas cenas.
Fora do subplot romântico, Jai Courtney não faz feio se comparado a Michael Biehn, o Kyle original. Sua paixonite platônica por Sarah, a lealdade a John e os traumas da guerra contra as máquinas continuam lá. Já Emilia Clarke tem um desafio maior, pois a Sarah Connor de Linda Hamilton é basicamente uma das personagens femininas mais fortes do cinema americano.
A Khalessi de “Game of Thrones” até tenta, mas não consegue replicar o carisma de Hamilton, mesmo que saibamos que as duas Sarahs, a despeito de serem a mesma mulher, são personagens diferentes. O relacionamento mais próximo que Connor tem aqui é com o Exterminador que a criou e, neste caso, as interações entre Clarke e Schwarzenegger são sempre divertidas e calorosas.
A relação Sarah/Papi é derivada daquela entre o T-800 e o John Connor de Edward Furlong em “Exterminador 2” e, apesar das cenas entre Sarah e seu guardião serem interessantes, elas não possuem o impacto daquelas entre o T-800 e John por um motivo: quando encontramos os dois, o relacionamento entre eles está completamente maduro, nos colocando no lugar de Kyle quanto ao choque de ver esses dois juntos.
Schwarzenegger basicamente carrega o filme, com o ator mostrando que é uma figura essencial dentro da franquia por entender de fato o Exterminador. Esqueçam o retrato cômico exagerado do terceiro filme ou o clone digital do quarto. Mesmo nos momentos mais ternos do Exterminador, o velho Arnold exala o perigoso carisma dos velhos tempos, além de sua presença imponente e habilidades físicas serem o que há de mais real em tela nas cenas de ação. Velho, mas não obsoleto, como o próprio Exterminador se descreve.
No entanto, colocar Schwarzenegger para lidar com os diálogos de tecnobaboseira do filme foi um grande erro. Aliás, todas as cenas que tentam explicar os meandros mais “científicos” da aventura apenas a deixam mais… boba, faltando a objetividade que caracterizava a franquia. Quanto a Jason Clarke, ele nos dá o retrato mais… diferente de John Connor até aqui. Por mais competente que o ator seja, faltou a autoridade natural que Christian Bale trouxe ao papel ou a atitude de Edward Furlong.
O diretor Alan Taylor, além de coordenar diversas setpieces (competentes e só) e tentar reviver esses personagens icônicos, teve também o interessante desafio de recriar varias cenas do primeiro filme, tendo em vista que esta produção e a de 1984 se contrapõem em vários momentos do primeiro ato. Essas regravações funcionam muito bem e, embora a jovialidade artificial de Schwarzenegger caia no “vale da estranheza”, o carinho e o respeito para com o original são palpáveis nessas cenas – bem como a competência da equipe de direção de arte.
Embora se perca na baboseira técnica no segundo ato e tenha personagens que apenas inchem a narrativa (sério, o que J.K. Simmons está fazendo ali?!), esse novo filme consegue divertir bem, mesmo sem ter o aspecto revolucionário dos dois originais. Hasta la vista, baby.
P.s.: Há uma cena pós-créditos que dá um leve gancho para um possível próximo longa, já que este foi preparado para ser o primeiro capitulo de uma trilogia.