Nem o carisma e competência de Will Smith e Margot Robbie salvam trama frágil, desorganizada e sem ritmo.
Em tese, “Golpe Duplo” era um filme que tinha tudo para dar certo. Os diretores e roteiristas Glenn Ficarra e John Requa já fizeram bons trabalhos anteriormente, como a ótima comédia romântica “Amor à Toda Prova” (2011) e “O Golpista do Ano” (2009), obras que se destacam especialmente pela excelente qualidade das atuações dos atores e atrizes envolvidos, dando um tempero extra a um enredo redondo, divertido e bem amarrado.
Aqui, temos no competente Will Smith um ator perfeito para o papel, com seu jeitão charmoso e canastrão arrancando suspiros da plateia feminina. Margot Robbie, por sua vez, despontando meteoricamente após a brilhante participação em “O Lobo de Wall-Street”, surge como uma espécie de “aspirante a femme fatale”, com sua beleza e sex-appeal também atiçando o público masculino. Juntos, ambos poderiam formar uma dupla promissora e de muito sucesso, honrando as qualidades principais dos trabalhos anteriores de Ficarra e Requa. Infelizmente, apesar da química razoável entre os dois, a trama não se sustenta minimamente para lançá-los onde o potencial sugeria que eles poderiam chegar.
O longa acompanha a trajetória de Nicky (Smith), um golpista profissional chefe de uma grande organização criminosa que começa a treinar a novata no meio, Jess (Robbie), quando esta tenta trapaceá-lo e acaba falhando de forma constrangedora. Acontece que a ligação entre os dois começa a tender para um lado mais sentimental e isso compromete algumas situações, fazendo com que Nicky tenha que dispensá-la. 3 anos depois, ambos se reencontram em circunstâncias completamente diferentes, o que confere uma nova dinâmica à relação.
Tal salto temporal é, provavelmente, o causador de todos os problemas da película. Antes dele, o enredo seguia de modo interessante, despertando a curiosidade do espectador sobre como a trama se desenvolveria e cativando sua simpatia para com o casal principal, cujo bom entrosamento saltava a tela. Depois, todavia, o cenário totalmente alterado logo chama nossa atenção para qualquer deslize dos personagens, fazendo-nos desconfiar de todos os seus movimentos. “Quem estaria aplicando o golpe em quem?”, é a dúvida que os realizadores martelam o tempo inteiro. Questionamento, aliás, que a obra incita de maneira artificial e grosseira, desperdiçando qualquer tipo de elemento surpresa que o roteiro poderia nos proporcionar mais à frente.
Roteiro este que é construído de forma absolutamente confusa e desorganizada. Após a absurda quebra de ritmo proporcionada pela divisão do longa em “antes e depois” da passagem dos 3 anos, fica difícil engolir as motivações propostas e o forçado desenvolvimento de personagens. Até que ponto o sentimento de um pelo outro continua verdadeiro após tanto tempo? Será que algum dia o foi? Junte-se a isso a introdução repentina de pretensos antagonistas, que também se provam inteiramente descartáveis e pouco ou quase nada acrescentam em termos de profundidade à narrativa, ainda mais encabeçados por uma atuação caricata e acima do tom do brasileiro Rodrigo Santoro, e o que temos é um script basicamente intragável.
Desse modo, é conveniente colocar que, como resultado, em “Golpe Duplo” não sobra muito mais do que um considerável potencial desperdiçado em uma trama frágil, sem ritmo e nada convincente, que se agarra a soluções fáceis e mal trabalhadas por Glenn e John para tentar fechá-la de maneira minimamente coesa, o que não ocorre. De realmente bom, apenas uma razoável química entre Smith e Robbie (muito mais por ela do que por ele, que atua basicamente no piloto automático), especialmente na primeira meia hora de projeção. Muito pouco para o tanto que prometia.