Recheado de boas intenções, longa se perde em construção dramática confusa e desfecho covarde.
Basicamente, o que diferencia essas comédias românticas padronizadas que a indústria de Hollywood produz a rodo todos os anos são o carisma e química do casal principal. Afinal, a história que acompanhamos é, com pequeníssimas variações, sempre a mesma: boy meets girl, uma paixão improvável surge, há a união do casal, a briga que arranha a relação e no final fica tudo bem quando a reconciliação acontece e é coroada com belo beijo na praia, ou no aeroporto para todos aplaudirem, etc. Raramente temos algo que fuja minimamente dessa fórmula batida – e talvez por isso quando o temos valorizamos tanto. Às vezes um pouco mais de drama, às vezes um pouco mais de humor, circunstâncias eventualmente diferentes, mas de um modo geral é sempre isso.
Portanto, sob esta conjuntura, o que torna um filme “bom” e outro bastante semelhante “ruim” é a competência dos atores envolvidos e como eles conseguem transmitir esse sentimento presente na trama para o coração do espectador. Aqui, Lily Collins e Sam Claflin são bem sucedidos ao criarem personagens adoráveis e com os quais podemos nos identificar, mas a química entre os dois não é forte o suficiente para sustentar um longa irregular e construído de maneira bagunçada.
“Simplesmente Acontece”, dirigido por Christian Ditter e escrito por Juliette Towhidi a partir do romance de Cecelia Ahern, acompanha a vida de Rosie (Collins) e Alex (Claflin), dois amigos de infância que veem a amizade abalada quando um novo tipo de sentimento parece emergir dessa relação. Quando Alex recebe uma bolsa de estudos em Harvard e precisa se mudar para os Estados Unidos, Rosie acaba não podendo ir e a união dos dois será posta à prova quando condições diversas surgem como pedras no meio do caminho e afastam constantemente um do outro. Filhos, outros parceiros, a própria distância, etc.
O principal problema, aqui, entre vários, reside no fato de que os realizadores tentaram abraçar toda a história de uma vida em uma projeção supostamente leve e de apenas 100 minutos. Assim, se entramos na sessão com a sensação de que vamos assistir a apenas mais uma despretensioso romance juvenil, o que acontece é um grande impacto. E isso é ótimo – ou pelo menos deveria ser. A paixão entre os dois é colocada logo na primeira cena, o que dificulta nossa identificação com o casal. Não seria mais interessante nos colocar na mesma posição dos dois, para irmos construindo este sentimento juntos? Além do mais, o “bate e volta” do relacionamento acaba tornando a película repetitiva e enfadonha; Rosie fica grávida de um outro homem, decide entregá-lo para a adoção e depois desiste; Alex vai morar nos EUA, se relaciona com outra mulher e depois separa; o pai do bebê de Rosie aparece e volta a se relacionar com ela. Enfim, se continuasse a enumerar as idas e vindas do enredo, acabaria revelando tudo.
O fato é que o filme cobre um período superior a 12 anos, permeado por um drama absolutamente confuso e que funciona apenas pontualmente, e pula de obstáculo em obstáculo sem qualquer tipo de construção mais harmoniosa entre os períodos. O ritmo é atropelado em excesso, personagens entram e saem de cena sem qualquer tipo de cerimônia e os anos vão se passando sem que sintamos sobre nós o peso que este parece derramar sobre os ombros dos protagonistas e todos a sua volta, o que evidentemente compromete de modo crucial nosso envolvimento emocional com a história.
A impressão que passa é a de que os realizadores tentaram alçar sua obra a um patamar semelhante a uma espécie de “Boyhood” dos relacionamentos, em uma composição que começa romântica, mas que aos poucos vai cedendo às barreiras naturais da vida. A intenção é ótima, acontece que Christian Ditter não é Linklater, e o resultado passa longe de funcionar. Os personagens secundários são absolutamente caricatos e dispensáveis (o que é Bethanny?), a narrativa proposta é padronizada, não apresentando nada de novo, e o roteiro acaba se autossabotando e jogando todas as boas intenções por água abaixo ao apostar em um desfecho previsível, covarde e clichê ao extremo.
Dentre vários adjetivos, o que eu usaria para definir “Simplesmente Acontece” é exatamente esse: covarde. Se colocando inicialmente como um leve romance entre dois jovens, o filme surpreende ao, ainda que de modo difuso e pouco natural como já colocado, compor um drama que vai muito além do que aquilo que poderíamos supor no começo, o que nos tira da nossa zona de conforto. Tudo isso apenas para, após incontáveis idas e vindas pessimamente encaixadas à narrativa, fechar a história com uma conclusão medrosa e frouxa, não tendo a coragem de assumir aquilo que passou a projeção inteira insinuando. Se é pra falhar, que se falhe de maneira honrada e coerente, não assim. Uma pena.