O filme tem a seu favor uma trama curiosa, boas atuações e um meticuloso design de produção, mas quase tudo é desperdiçado pelo fato do realizador não saber unir tais elementos, de modo que a plateia tome interesse pela coisa.
Quem tem boa memória e aprecia o trabalho de Quentin Tarantino, deve lembrar dos acentuados personagens Ordell Robbie e Louis Gara, vividos respectivamente por Samuel L. Jackson e Robert De Niro, na homenagem do diretor à Blaxploitation, “Jackie Brown” (1997). Para a trama, Tarantino se inspirou no romance do saudoso Elmore Leonard, “Ponche de Rum” (1992), que por assim contava uma história policial envolvendo dois criminosos, que já haviam aparecido em “The switch” (1978), exatamente o conto que deu origem a este “Sem Direito a Resgate”, comandado pelo ainda jovem cineasta norte-americano Daniel Schechter.
Inicialmente, vemos aqui uma história digamos simplória sobre o sequestro da esposa de um ricaço, mas, com o tempo vai ganhando contornos incomuns, apresentando traços cômicos e situações peculiares que poderia facilmente se encaixar numa obra dos Coen. O marido, Frank Dawson (Tim Robbins), que está num hotel com a amante Melanie (Isla Fisher), recusa-se a pagar o resgate e, por assim, sua mulher, Mickey Dawson (Jennifer Aniston), começa a ficar irritada mais pela indiferença do companheiro, do que propriamente a situação atual que se encontra. Pior, parece estreitar relações com um dos sequestradores. O desfecho final, então, é uma maluquice só, e nos pega de surpresa pelo rumo que as coisas tomam.
Como é perceptível, o longa tinha uma proposta bastante promissora, não apenas pela imprevisibilidade da trama, mas por possuir um leque de personagens atípicos. Além disso, Daniel Schechter pôde contar com uma produção considerável e direção de arte de luxo, bem atenta a planejes de cenários e figurinos. Reparem nos detalhes de mise-en-scène como os móveis, as marcas de alimentos e carros da época, que mergulham o espectador naquele período. Entretanto, Schechter não consegue construir uma narrativa envolvente. Com uma direção automatizada, o artesão até entrega um primeiro ato orgânico, mas lá pela metade tornasse indigesto pela falta de uma pegada mais dinâmica. A carência de ritmo deixa o público impaciente, e como não vemos desenvolvimento nem nas figuras centrais, de certa maneira, pouco nos importamos com seus destinos.
Há também desserviços técnicos como a fotografia de Eric Alan Edwards, que possui paletas amareladas e tenta imprimir um aspecto envelhecido à atmosfera retratada. Mas é tão limpa e intensa que falha miseravelmente e soa artificial. Alguns efeitos visuais são muito descuidados, como em cenas internas do carro em movimento, onde é claramente visível o fundo verde usado nas janelas. O chroma key também é notado em algumas tomadas na casa do casal, quando, com o efeito, despontam o exterior da propriedade. A fraca trilha sonora dos irmãos Newton, não diz bem a que veio. Tem lá uma ou duas boas canções, mas incidentalmente mal pontua os conflitos empreendidos.
O grande destaque do filme fica a cargo de Jennifer Aniston, que vive a melhor fase de sua carreira e oferece uma personagem enigmática. Superficialmente doce por sua beleza, Mickey vai mostrando a força que tem aos poucos. Ainda que desajeitada, ela consegue dobrar todos a sua volta e tem uma conclusão bem inusitado. John Hawkes apresenta também um bom desempenho, sua persona e postura são fundamentais para passar uma imagem preocupada. Diferente do Ordell de Yasiin Bey (o rapper Mos Def), caricato e previsível. Tim Robbins, que há algum tempo não dava as caras, está bem canastrão aqui. E Isla Fisher, convenhamos, não precisou fazer esforço para ser sexy. Nada obstante, quando chegamos aos créditos finais, compreendemos o quanto insossa é a obra num todo.