Cheia de humanidade e grandes atuações, biografia inglesa encanta pela força dos protagonistas, mas desaponta ao criar um mundo de fantasias e soar como mídia de autoajuda.
O inglês James Marsh ficou conhecido ao ganhar um Oscar, com o documentário “O Equilibrista” (2008), que narrava o feito de Philippe Petit – atravessar as torres do World Trade Center, através de um cabo de aço suspenso entre os prédios, sem nenhuma proteção. Apesar de abordar o acontecimento, o filme, acima de tudo, fala sobre sonhos e humanidade. Uma lição de dedicação e coragem, empregada de maneira intimista.
Já em outro trabalho documental, chamado “Projeto Nim” (2011), Marsh também mexeu com o tema de relações humanas. Dessa vez comentava a respeito de um chimpanzé, que num experimento fora criado por um casal como um bebê normal, tendo o mesmo tratamento de seus filhos. Despertando novos instintos, o ensaio é deixado de lado e o macaco confinado numa jaula para testes. Vemos então o descaso dos cientistas e o sofrimento de ambas as partes, criando assim uma indagação sobre o que estamos fazendo.
Agora, em seu mais novo e comentado longa de ficção, James Marsh biografa a vida do brilhante cientista Stephen Hawking, e como esperado, deixa de lado seus grandes feitos para focar num sentido mais pessoal e familiar – aliás, nesse aspecto, o título deve conquistar grande parte do público por discutir com polidez os sentimentos destacados. O diretor acompanha a vida de Hawking, desde a adolescência até sua ascensão com a tese da origem do universo e o lançamento do livro “Uma Breve História do Tempo” (1998), que vendeu mais de 25 milhões de copias no mundo todo.
A linguagem mostra-se deveras formulaica e deposita suas fichas em cima da dramaticidade dos personagens, seguindo uma linha convencional ao abordar a maioria dos temas presentes. Até mesmo quando trata da doença (Esclerose Lateral Amiotrófica) do protagonista, não chega a pôr a enfermidade como um cruel e real inimigo na vida do sujeito – prefere na verdade focar na luta ou nas vitórias travadas, principalmente na superação, quando acaba se tornando um belo material de autoajuda. O que, de certa maneira, exclui a ambiguidade da trama ou não nos faz temer futuros desafios.
Todavia, a bem da verdade, o que realmente se diferencia aqui é o bom elenco. Todos parecem estar em sintonia. Começando por Eddie Redmayne, que na preparação, além de tomar aula de dança para controlar melhor seus movimentos e emagrecer cerca de 15 quilos, levou sua postura curvada tão a sério, que quase chegou a alterar o alinhamento da coluna vertebral. Redmayne de fato faz talvez a atuação mais brilhante dos indicados ao Oscar desse ano. Afora a condição física, os trejeitos e a voz embargada, a força de seu papel está mesmo no olhar. Com encaradas cinicamente desconcertantes, vemos um jovem Hawking captado em tela. Do outro lado está a linda Felicity Jones, que dá vida a Jane Hawking, um sidekick à altura, que, também contida, empresta sua delicadeza e transmite veracidade e singeleza.
Então, mesmo não sendo um dos trabalhos mais inspirados de James Marsh, soando no fim das contas como uma típica biografia-inglesa-água-com-açúcar, este “A Teoria de Tudo” está longe de ser um filme sem alma, pelo contrário, exala humanidade em sua atmosfera. Possui personagens fortes, dramaticidade latente e atuações poderosas. Como também cumpre sua função básica de contar quem é a persona Stephen Hawking.