Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 08 de janeiro de 2015

Whiplash – Em Busca da Perfeição (2015): poderoso e sufocante

Um filme poderoso, chocante e sufocante, de direção primorosa e trilha sonora matadora, que deixa o público ligado do início ao fim.

À primeira vista, esta produção norte-americana independente, que chamou atenção de plateias, ganhou prêmios e logo depois foi distribuída mundialmente, aparenta ser a biografia de um renomado músico de jazz, quando na verdade tem apenas tais influências. Originalmente idealizado como longa-metragem, concebido pelo jovem diretor e roteirista Damien Chazelle, “Whiplash – Em Busca da Perfeição” acabou se tornando um curta promocional, que tinha basicamente o intuito de levantar a invenção principal. Não demorou muito para acontecer, com um modesto orçamento, grande empenho e cerca de vinte dias de filmagens, meses depois a película já estreava em festivais.

O bom ator Miles Teller dá vida ao solitário Andrew, um garoto reprimido de olhar triste que pouco se expressa, mas também é fã de Buddy Rich, toca bateria numa banda de jazz em sua cidade e sonha se tornar um grande astro da música. Tal objetivo parece mais próximo quando o renomado e implacável maestro Terence Fletcher (J. K. Simmons) ver nele potencial e chama-o para fazer parte da orquestra principal do conservatório mais cultuado dos Estados Unidos. No entanto, pelo impiedoso e abusivo jeito de ensino do regente, o rapaz transforma sua paixão em obsessão e começa a desenvolver graves problemas neurológicos, afetando completamente sua saúde mental e até física.

Este plot poderia facilmente ser ligado a algum trabalho de Darren Aronofsky, pela personalidade obsessiva que busca constantemente a perfeição, porém o filme não se concentra somente nesse quesito – apesar de explorá-lo muito bem, obrigado. Apaixonado pelo estilo, quando em seu primeiro filme, “Guy and Madeline on a Park Bench” (2009), já falava sobre a mídia, Damien Chazelle demonstra atenção no tema e nunca deixa a música como plano de fundo. Aliás, muitos diálogos falados são substituídos por expressões e gestos extraídos dos músicos quando estão tocando. A trilha sonora assinada por Justin Hurwitz é o esqueleto de toda narrativa, pois não só embala e empolga com canções fenomenais, como também dá o tom a vários momentos do conto. Detêm de um excepcional desenho de som.

Contudo, no que se refere às ferramentas fílmicas mais técnicas, a direção de Chazelle foi o tópico que mais me chamou atenção. O cineasta consegue a façanha de emitir através de imagens a elegância necessária do jazz e possuir trucagens frenéticas que deixa o espectador sem fôlego. É hábil por filmar de maneira atípica a orquestra em execução, sempre calcado em inúmeros planos detalhes, e sabe utilizar closes para mostrar momentos mais tensos. A cena final chega a ser claustrofóbica de tão pulsante. A montagem de Tom Cross também é fundamental por tornar essa energia orgânica e criar raccords inspiradores. Sharone Meir dá o retoque final e com suas paletas de cores intensas confere tonalidades estéticas mais clássicas.

Outro ponto importantíssimo em “Whiplash – Em Busca da Perfeição” é o casting, o longa é recheado de grandes atuações. O veterano J. K. Simmons, que havia participado do curta original, entrega aqui, provavelmente, o grande papel da sua carreira, interpretando um homem duro que respira a arte, mas pouco abre espaço para sentimentalismos, expressa-os somente quando quer algo dos alunos. E ao primeiro esboço de um deslize, sua reação muda instantaneamente e um monstro surge. O ator se entrega por inteiro e deve faturar inúmeros prêmios. Miles Teller não fica atrás e aparece como a figura mais humana da trama. Seu personagem que mal articula reações, com o tempo explode e transmite uma veracidade impressionante. Sua relação com a garota Nicole, interpretada pela linda Melissa Benoist, é deveras destruidora.

Surpreendendo por estar entre os principais candidatos ao Oscar – não por sua inquestionável qualidade, mas pela pegada incomum -, este petardo de Damien Chazelle aparece como o primeiro diamante do ano e abre com maestria o circuito cinematográfico brasileiro. É um filme poderoso, chocante e sufocante, de direção primorosa e trilha sonora matadora, que deixa o público ligado do início ao fim, possuindo ainda momentos tocantes. Uma obra simplesmente imperdível.

Wilker Medeiros
@willtage

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