Talento e química perfeita do elenco colocam o filme um patamar acima da maioria da produção de comédias nacionais.
Todos que já tentaram organizar uma festa, especialmente de Ano Novo, sabem que esse é o tipo de evento propício para que a Lei de Murphy atue com toda força: Se algo tem a mínima chance de dar errado, vai dar errado. Com isso em mente, o diretor Fábio Mendonça traz às telas a comédia “A Noite da Virada”, baseado em obra de Pedro Vicente.
O filme tem início com os preparativos de Ana (Júlia Rabello) e Duda (Paulo Tiefenthaler), que irão receber dezenas de pessoas para a festa de réveillon. Entre os convidados estão Sofia (Martha Nowill), a “irmã gordinha” e solteirona de Ana; Rica (João Vicente de Castro) e Alê (Luana Martau), um casal de amigos viciado em sexo (e que aparentemente está junto apenas por isso); Paulão (Taumaturgo Ferreira), o amigo traficante que os ajuda a “curtir” a festa; e os vizinhos ricos Rosa (Luana Piovani, linda como sempre) e Mário (Marcos Palmeira); Como ocorre em quase todas as festas de grandes proporções, começam a surgir penetras de todos os lados, como o chefe safado de Ana (Anselmo Vasconcelos, numa participação divertida), alguns jovens com gosto acentuado por entorpecentes (Juliano Enrico e Daniel Furlan) e mais gente de todo tipo.
O roteiro, escrito a seis mãos por Claudia Jouvin, Nina Crintz e Pedro Vicente é eficiente ao construir os personagens e estabelecer a (excelente) dinâmica entre eles. Apesar de ocorrerem aqui e ali, não existem diálogos expositivos em excesso, como “puxa, você é desligado mesmo. Esqueceu a torneira ligada” ou outras bobagens dessa natureza. Ao mesmo tempo, a sequência de fatos inusitados que ocorrem ao longo da trama, quase todos dentro dos banheiros da festa, apesar de absurdos, são absolutamente plausíveis, de modo que o público consegue se identificar com o que ocorre.
Infelizmente, ocorrem algumas falhas na construção da história que demonstram uma certa falta de cuidados em alguns aspectos, como: Quem vai fazer uma festa para centenas de pessoas e deixa para desentupir o único vaso sanitário disponível para a festa a poucas horas do seu início? Porque, em uma festa de réveillon, há tão poucas pessoas usando branco, incluindo aí os personagens principais (apenas Rosa usa uma roupa branca)? Como ainda consegue reclamar da vida, sendo rico, bonito, bem sucedido e casado com Luana Piovani? (ok, essa tem explicação, foi só uma ponta de inveja).
Porém, apesar de incomodar, tais falhas não prejudicam o andamento da história. O ritmo se mantém frenético do princípio ao fim, de modo que sempre está acontecendo algo interessante com algum personagem importante em algum ponto da casa. No entanto, a montagem falha em um aspecto específico: como não há nenhum momento de montagem paralela, fica a sensação de cada ação ocorre somente depois que outra termina, como se nada acontecesse simultaneamente.
Como dito anteriormente, a dinâmica entre os atores é o ponto alto da história. O talento e timing cômico de Júlia Rabello funciona perfeitamente, sem que ela precise proferir suas falas com excesso de volume para soar engraçada, e é a cola que une o restante do elenco. Paulo Tiefenthaler acerta no tom de seu “pós-adolescente” que parece não perceber o ridículo de suas ações (ou de seu “penteado”) ao passo que Marcos Palmeira está perfeito como o típico “coxinha”, que gosta de tudo organizado e não consegue dar um passo fora da curva. Martha Nowill também está hilária como a solteira desesperada em busca de um homem. Luana Piovani também está competente, escapando do papel óbvio de mulher fatal devoradora de homens. Os únicos que ficam um pouco abaixo, mais pelo roteiro que pelo seu desempenho são João Vicente de Castro e Luana Martau, cujos personagens são pouco desenvolvidos. E Rodrigo Sant`anna rouba a cena como o traficante fumaça, que passa a noite preso em um banheiro químico.
Apesar de alguns pequenos tropeços, o diretor Fábio Mendonça consegue realizar em “A Noite da Virada” uma comédia realmente divertida que escapa do lugar comum da maioria das comédias brasileiras.